quarta-feira, 3 de dezembro de 2014

SIMPLICIDADE E EFICÁCIA


Brian "Aussie" McLean ajudado por Henrique Rocha na aula aos treinadores portugueses.
Foto jpbessa/ iPhone
O papel de um treinador é tornar simples aquilo que é complexo. Este o conceito inicial das diversas mensagens que Brian "Aussie" McLean, treinador assistente dos All Blacks, foi deixando ao longo da semana que passou em Portugal nos contactos que teve com jogadores e treinadores portugueses. Simplicidade foi o lema - fazendo-me lembrar sempre o célebre KISS (keep it simple, stupid) que se exige a quem queira a compreensão dos outros para aquilo que quer comunicar. Porque, como avisa, o rugby não é nada simples e é, pelo contrário, bastante complexo e nem sempre, com as suas 22 Leis, de fácil compreensão.
Ver jogar os All Blacks é perceber a importância decisiva na sua eficácia do domínio simplicidade: tudo é simples, as decisões são simples, as soluções adoptadas são simples. Tudo porque por trás do visível está um trabalho profundo de simplificação que, tendo como fundamento a aplicação constante dos Princípios Fundamentais do Jogo, é de permanente aplicação, começando desde logo pelo treino. Aliás este processo, alterando e adequando um ou outro aspecto, tem longa tradição no ensino e desenvolvimento do jogo neozelandês. Quando tive a sorte de estar uma série de dias com os All Blacks, durante a sua digressão por França ao tempo do treinador Laurie Mains, aquilo que me impressionou (e mais me ensinou) foi a simplicidade das formas de treino, sempre ligadas às situações de jogo e tendo como objectivo resolver questões do jogo - conseguindo como resultado, para além do domínio técnico, um domínio do conhecimento táctico que faz a diferença. Aí pude ver o que Aussie veio repetir: joga-se de acordo com o momento que o jogo dá. E portanto treina-se de acordo com o jogo que se pretende jogar - cumprindo aliás a verdade universal do treina-se como se joga, joga-se como se treina.
A habitual trilogia - três parâmetros por acção - foi também lembrada por McLean. Cada exercício deve ter como dominantes a clareza, a precisão e a intensidade. A clareza exige que toda a gente perceba o que se pretende, a precisão é necessária porque, como lembra outro treinador australiano campeão do Mundo, Bob Dwyer, no seu "só a procura da perfeita execução permite chegar á perfeição", só assim se atinge o objectivo pretendido. Por outro lado, a intensidade é a variável que exige um controlo diferenciado de acordo com as circunstâncias e objectivos momentâneos do treino.
As decisões tomam-se de acordo com a informação disponível mas no desporto em geral e no rugby em particular a pressão que a velocidade impõe exige, desde logo e mais do que noutros espaços, a diminuição do número de opções - se as opções forem muitas, as dificuldades de decisão aumentam e o tempo justo de intervenção perde-se numa encuzilhada de interrrogações. Daí que seja necessário recorrer a uma espécie de cábulas que permitam aos jogadores focarem no essencial - nos factores críticos transformadores, nos critical few - e não se distrairem com trivialidades.
Uma trilogia, diminuindo opções e com o aviso de Aussie de que mais de três opções não serão lembradas pelo jogador no momento da acção - voltou à cena e foi de novo utilizada como ferramenta para que os treinadores possam ensinar melhor os jogadores a encarar as situações de quebra no chão (breakdown). À aproximação do ponto de quebra provocado pela defesa adversária, o primeiro apoiador terá que se decidir por uma de três opções, perguntando-se - no clique de um olhar - por esta ordem e reagindo de acordo: o portador pode passar-me a bola? a bola está disponível? existem adversários ameaçando a posse da bola? Cada resposta deverá garantir que a decisão tomada mantém a posse da bola para continuar o movimento - cumprindo assim os Princípios Fundamentais de Apoio e Continuidade para poder levar a equipa a Avançar e a ampliar a Pressão, desequilibrando o adversário - e assim, preparar-se para a melhor linha de passe para receber a bola ou para apanhar a bola e continuar com ela ou, ainda, para limpar os corpos adversários e permitir que os seus companheiros apanhem a bola. Simples e eficaz com tudo a depender do tempo de chegada do apoio, mas sem dúvidas sobre a decisão a tomar, sobre qual técnica utilizar ou sobre o porquê das coisas. 
Dir-se-á que nada do que se ouviu é novidade ou desconhecido. Claro, que não! Novidade é a forma simples como todo este conhecido manancial se transforma em método a exigir, para que o desempenho atinja os resultados pretendidos, não apenas saber o que se pretende - o objectivo - mas, essencialmente, saber que caminho percorrer para lá chegar. E Brian McLean, em cada exercício, em cada explicação, deixou claro as exigências que se colocam aos treinadores para a eficácia dos seus treinos e desenvolvimento dos jogadores. E com uma garantia fundamental - os melhores do Mundo treinam assim. 

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