segunda-feira, 21 de julho de 2014

O QUE O FUTEBOL NUNCA PERCEBEU DO RUGBY

Acabou o campeonato do mundo de futebol acertado com o conhecido presságio do único futebolista que nunca recebeu um cartão amarelo ou vermelho, Gary Lineker: onze de cada lado e no fim ganha a Alemanha. Mas desta vez não pelo poder físico mas pela transformação de uma escola que levou anos de trabalho e onde a "habilidade motora" prevaleceu sobre os outros factores de escolha e trabalho.
Foi um bom campeonato, com excelentes jogos e com emoção quanto baste. Factor de desilusão apenas o desastre português com uma equipa mal preparada - dizendo o mínimo - para o nível exigível.     
De mau no campeonato, o habitual no futebol: faltas intencionais e simulações sem vergonha.
A estória vem de trás. Na passagem do futebol a profissional veio de Inglaterra um conceito que, embora classista, salta à evidência: "the professional foul". Como parece óbvio este conceito resultou do facto da separação de classes que transformaram o futebol - e o rugby, também, mas neste caso surgiu uma nova modalidade, o Rugby de XIII -  quando passou a profissional. Não passando, como estabelece a tradição, pela cabeça da aristocracia britânica  - com os seus sportsmen plenos de fairplay - cometer atentados à ética desportiva, a sua desconfiança pela classe trabalhadora fazia-os acompanhar com desconfiança a ética do desporto profissional.
Professional foul, falta premeditada ou intencional foi o resultado, diziam, do jogo onde o dinheiro prevalece.
E neste Mundial vimos muitas - demasiadas! - faltas intencionais. Pior, com comentadores a valorizá-las, numa absoluta falta de respeito pelo trabalho do adversário e pelos interesses do espectáculo, como necessárias e inteligentes! As exigências do desporto, permitindo a falta enquanto erro involuntário, não devem permitir o prejuízo premeditado. 
Qualquer código de ética desportiva - mesmo o nosso que não somos nenhuma potência de cultura desportiva - considera a falta intencional como uma violação grave das normas do desportivismo que deve estar presente numa competição desportiva.    
À falta intencional, o futebol responde com livre e cartão amarelo - um faz de conta que, depois de somado tantas vezes, retira o jogador de um jogo contra outro adversário. Quer dizer, o ofendido não retira qualquer vantagem e a falta intencional - aquela que propositadamente destrói em falta a hipótese de ataque do adversário - castiga-se fora do espaço e do tempo do prejuízo. Faz isto sentido?
O rugby resolveu este problema de forma inteligente: falta intencional, cartão amarelo e dez minutos de suspensão. Ou seja o prejuízo intencionalmente provocado é castigado no próprio jogo com vantagem evidente: durante dez minutos o não infractor tem direito a superioridade numérica.
Também a interpretação que se faz no futebol da lei da vantagem não me parece que seja um primor de ética desportiva: falta, jogador pelo chão e sem poder contar como elemento da sua equipa; a bola por artes de qualquer coisa vai ter a um companheiro de equipa do derrubado, o jogo continua, a bola perde-se os faltosos ficam com a posse da bola em óbvia vantagem do infractor. No rugby é diferente: a aplicação da lei da vantagem pressupõe que a equipa prejudicada tem uma vantagem táctica que lhe pode trazer benefícios - e caso isso não aconteça, o árbitro volta ao local da falta inicial. 
Ou seja: a falta no rugby e ao contrário do futebol, não compensa!      
Para juntar a esta concepção ética do jogo, o rugby usa ainda - como acontece também noutros desportos para tentar evitar tanto quanto é possível os erros de julgamento - o recurso à televisão. Teimosamente o futebol não quer saber e o fora-de-jogo - que a ciência afirma da dificuldade humana de controlo absoluto - continua na dependência da interpretação do trio de arbitragem. Como vimos neste Mundial de futebol, erros não faltaram - e os resultados nem sempre foram o que deveriam ter sido.
O rugby, sendo de grande complexidade de análise, procura meios que o mantenham nos limites da ética desportiva, fazendo jus ao dito de ser um jogo de insurretos jogado por cavalheiros. Não quererá o futebol aprender e juntar-se? Os que gostam do jogo, agradecem.   

sábado, 5 de julho de 2014

DESEMPATES

Em Moscovo, na 2ª etapa do Sevens Grand Prix 2014, foi necessário, para classificar as equipas para a fase a eliminar, utilizar as regras de desempate. De acordo com os regulamentos do torneio as regras de desempate impõem que, caso sejam duas as equipas empatadas em pontos de classificação, ficará à frente a equipa que tenha vencido o jogo entre ambas. Para o caso de existirem três ou mais equipas empatadas o critério de desempate coloca-se na melhor diferença de pontos de jogo marcados e sofridos.
Para os dois lugares de "melhores terceiros" havia seis equipas, todas elas com 5 pontos de classificação: a França, no Grupo A e com 21pontos negativos de jogo; no Grupo B, Portugal com o mesmo número de pontos de jogo marcados e sofridos, a Bélgica com 8 pontos negativos de jogo e a Alemanha com 22 pontos negativos de jogo; no Grupo C, a Espanha com 5 pontos negativos de jogo e a Itália com 31 pontos negativos de jogo.
Enquanto a França esperava pela classificação dos outros grupos para saber da sua sequência competitiva, no Grupo B, o critério da diferença de pontos marcados e sofridos determinava a ordem decrescente de Portugal em 2º, Bélgica em 3º e Alemanha em 4º - mesmo que Portugal tenha sido derrotado (14-7) pela Bélgica que, por sua vez, foi derrotada (19-7) pela Alemanha. No Grupo C, como estavam apenas empatadas duas equipas, verificou-se o resultado do jogo entre as equipas empatadas e como a Itália tinha vencido (14-7) a Espanha, ficou classificada em terceiro lugar enquanto que a melhor diferença espanhola de marcados e sofridos não lhes valeu mais do que um último lugar. O fecho do agrupamento para os quartos-de-final, de acordo com as regras estabelecidas, decidiu-se pela França e Bélgica, juntando-se a Itália à Espanha na disputa da taça dos últimos.
Justo?!
Na aparência, parece. Mas é ilusão. Não me parece justo nem tão pouco desportivamente interessante. Vejamos.
A Espanha com os mesmos pontos dos terceiros mas com a melhor diferença de pontos de jogo marcados e sofridos de todos eles, teria, com as regras aplicadas ao grupo de Portugal, sido qualificada em detrimento da França que ficaria limitada a lutar pela Bowl. Argumentar-se-á que, tratando-se de duas equipas, o mais justo será classificar primeiro a equipa que venceu o jogo entre as empatadas. Será?!
Em grupos reduzidos como se verifica quer nos sevens quer nos campeonatos mundiais ou internacionais para que haja um empate entre duas equipas é preciso que a derrotada ganhe jogos, muito provavelmente a equipas que derrotaram a que a venceu. Foi o que aconteceu no Grupo C de Moscovo: se a Itália venceu a Espanha, a Espanha venceu (19-14) Gales que venceu largamente a Itália com um contundente 26-0. Ou seja a vitória ou derrota no jogo entre espanhóis e italianos não define nenhuma qualidade especial. Aliás este critério pode até, em grupos com maior número de equipas concorrentes, levar ao absurdo de reduzir a luta pelo último lugar aos dois jogos entre os últimos classificados de um campeonato para saber quem descerá de divisão.
O mesmo não se passa com a diferença entre pontos marcados e sofridos que fornece uma ideia da capacidade global de cada equipa, tornando-se assim num sistema mais justo de desempate - jogando contra as mesmas equipas uma diferença positiva de pontos marcados e sofridos terá de significar qualquer coisa de mais positivo do que uma diferença negativa, classificando um mérito mais alargado como se pretende para a classificação de grupos. Até porque, se as derrotas ou vitórias apenas estabelecem uma pontuação que é indiferente aos valores do resultado, a diferença marcados/sofridos diz qualquer coisa sobre o jogo e a valia das equipas (por isso perguntámos: perdeu? por quantos?). Até porque o sistema que privilegia o resultado do jogo entre os empatados cria um problema de competitividade: equipa da zona da luta pelo apuramento que seja derrotada não tem hipóteses de se continuar a bater pela melhor posição - em caso de empate fica sempre atrás.
Pelo contrário, utilizando a diferença de pontos marcados e sofridos qualquer equipa, em caso de derrota e se conseguir os mesmos pontos de classificação, tem hipóteses de conseguir ultrapassar a adversária desde que consiga marcar muito e sofrer pouco. Ou seja a utilização deste critério, para além de mostrar a consistência de uma equipa, aumenta o interesse competitivo.
Para além destes argumentos há ainda, ao garantir o mesmo critério prioritário de desempate para todas as situações, a facilidade de percepção do sistema pelos adeptos. O que não é despiciendo. 
Se assim é, se as vantagens parecem evidentes, porque não é utilizado para qualquer situação a diferença de pontos marcados e sofridos como critério prioritário de desempate? Por mera habituação?      




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