segunda-feira, 30 de agosto de 2010

TRINTA PONTOS

Em 2000 – após o Mundial de 99 – no livro – Le Tournant du Jeu -  Rugby, ma vie - em que conta as suas experiências de rugby e de comando da selecção francesa, Jean-Claude Skrella - jogador internacional e treinador francês - escrevia que para a certeza, durante o jogo, de garantia de vitória era preciso, pelo menos e principalmente ao nível internacional, atingir a marca de 30 pontos. Um objectivo, portanto.

Os tempos terão mudado e os parâmetros serão já outros: a Austrália, sábado passado, marcou trinta e um pontos e perdeu… a África do Sul marcou 44. Trinta pontos já não serão suficientes para garantir uma cobertura eficaz sobre o retorno adversário - é necessário marcar mais.

O próximo Mundial promete. E o aperitivo do sul rugbístico no Outono europeu, também.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

SEXTA EVIDÊNCIA

Perdida no canto de um jornal e no meio das notas do jogo ficou uma outra evidência que o África do Sul - Nova Zelândia proporcionou. A sexta e assim:

Sexta evidência: o jogo-ao-pé - a este nível (porque em níveis inferiores o jogo-ao-pé, mesmo em recurso, pode ser um instrumento de perturbação e portanto uma boa arma de ataque) - é pura entrega da bola ao adversário. Com enormes riscos.
Se houver um bom número de jogadores adiantados em relação ao chutador - situação típica dos pontapés pingue-pongue - o lançamento do contra-ataque (porque a lei obriga aos companheiros que estão à frente do chutador a recuar) pode fazer-se através dos diversos intervalos que a situação criou e será asssim possível conquistar terreno. Mais: a organização da equipa contra-atacante é mais simples do que a organização da agora defensora. A primeira porque sabe para onde vai; a segunda porque, tendo que organizar-se de acordo com o ataque, vê-se obrigada a ceder terreno. Haja confiança.
Se a maior parte dos jogadores estiver atrás do chutador, a necessidade de uma subida lenta - eventualmente com dois ou três caçadores - para garantir a formação de uma linha e não permitir a criação de intervalos defensivamente incontroláveis, vai proporcionar ao atacante o tempo de organização necessário para provocar pontos de concentração da defesa nas zonas mais favoráveis.

Viu-se neste jogo que, se o jogo-ao-pé para fora serve para aliviar uma pressão de risco elevado e permitir conquistar terreno nas costas da defesa para ampliar a sua margem de segurança, o pontapé para dentro do terreno-de-jogo fica - pelas iniciativas de contra-ataque cada vez mais visíveis - com uma exploração diminuta e pode - a este nível, entenda-se - estar com os dias contados. A um ano do Campeonato do Mundo, esperam-se os desenvolvimentos. Aliciante.

domingo, 22 de agosto de 2010

EVIDÊNCIAS

Excelente jogo este África do Sul – Nova Zelândia a possibilitar a expressão de diversas evidências:

Primeira evidência: o rugby é um desporto colectivo de combate organizado para a conquista de terreno e que, para se chegar ao nível dos all-blacks, exige um patamar de capacidade física tal que, não cedendo no centímetro, se possa ser eficiente com a técnica;

Segunda evidência: o jogo do movimento da bola exige permanente tomada de decisões. Passo ou furo? é a pergunta permanente cuja resposta dependerá da proximidade do apoio. Esta forma de jogar impõe o respeito por uma regra: se não encontrares o intervalo, vais recuar.

Terceira evidência: a boa defesa é decisiva para manter aspirações de vitória – do primeiro ao último minuto. Cada erro - a este nível em particular, mas ao nível internacional em geral – transforma-se numa pesada factura que pode ditar o resultado final (os adiantados, por desconcentração na captação da bola no ar, dos all-blacks quase impediam a vitória neozelandesa);

Quarta evidência: o jogo no chão só fixa defensores e só explora o desequilíbrio defensivo se a defesa for obrigada a recuar e a reutilização da bola se fizer num ápice – o que só se consegue atacando os intervalos e, não sendo possível o passe, indo ao chão em situação favorável de colocação da bola;

Quinta evidência: os turnovers ditam o jogo. Parece tudo feito mas um turnover reverte de imediato a situação – o que era ganho torna-se perdido. Ao mínimo descuido, à mínima hesitação do portador, o adversário recupera a bola, terminando, no melhor dos casos, o movimento atacante; criando, no pior, um espaço de contra-ataque de difícil defesa ou recuperação.

O rugby só não é um collision game (sendo que, de acordo com um velho dito, contact game é dança) porque existem equipas e jogadores que, como hoje, procuram sistematicamente os intervalos entre defensores, tornando assim o jogo mais fluído, mais rápido, mais interessante. E a África do Sul fez, neste domínio, bastantes progressos: obrigada a reconhecer que o jogo no chão exige velocidade de libertação, percebeu que só atacando intervalos isso é possível. E embora ainda lhe falte a capacidade de criação do apoio em tempo útil, o seu jogo parece já ter ultrapassado o ataque ao muro que o caracterizava.

Não deixou de ser interessante ver que o ataque neozelandês em duas linhas, fixando, pelas linhas de corrida dos primeiros, a maior parte de defesa sul-africana, permitiu uma constante superioridade numérica no último corredor a que a alternância de tipo de defesa dos springboks – rush para tentar cortar a sequência ou atraso no final para tentar, deixando penetrar, isolar os atacantes – não conseguiu pôr cobro. E por onde andaram os pilares e terceiras-linhas que se encontravam junto à linha lateral para marcarem dois ensaios?

Como nota final deve acentuar-se a determinação, vontade de vencer e capacidade de nunca desistir demonstrada pelos all-blacks que, derrotados a cinco minutos do fim, souberam ir buscar uma excelente vitória. Melhor ainda quando demonstra que é possível, com o rugby de movimento, ganhar e entusiasmar espectadores.

sexta-feira, 20 de agosto de 2010

ESTE JOGO VALE A PENA

O jogo deste sábado da TriNations, África do Sul-Nova Zelândia, tem pontos de interesse suficientes para não deixar de ser visto.

Como é que os sul-africanos vão responder ao “banho” dos dois jogos anteriores?
Aí, os neo-zelandeses, deixaram claro para os springboks que:
a) não valia a pena jogar ao pé porque estavam preparados – não para o habitual pingue-pongue – mas para contra-atacar. Pior: gostam de o fazer e estão moralizados para o fazer;
b) não valia a pena qualquer tentativa de ultrapassagem em força da linha defensiva: a defesa all-black está muito bem organizada e, como especialistas no jogo no chão, apresentam o cartão vermelho de poderem sempre recuperar bolas que, num repente, rendem a sua transformação em ouro;
c) o recurso sul-africano à defesa invertida (rush defense) de pouco serviria para atrapalhar os ataques neo-zelandeses porque os seus centros são capazes no jogo penetrante – encontrando intervalos por sistema – e são muito bem acompanhados por uma terceira-linha que, antecipando as leituras das linhas de corrida eficazes, podem criar brechas irrecuperáveis.
Como responderão os sul-africanos? A posse da bola, sabe-se, não chega. A vantagem na capacidade de conquista nos alinhamentos também não será suficiente. Como o farão? Defensivamente atrasando a sua linha, abrindo o exterior e tentando empurrar o ataque neozelandês para a linha de fora para o separar do apoio dos avançados? Usando o pontapé-rasteiro para conquistar terreno e lançando apenas um, dois caçadores enquanto se organizam em linhas defensivas para contrariar o contra-ataque?

Ou, fugindo à tradicional cultura de combate territorial, vão surpreender-nos com algo de novo?

Este jogo vai valer a pena.

NOVAS ESCOLHAS

A propósito das novas escolhas, da procura de novas pessoas – dirigentes ou técnicos – de que se ouve falar e que costumam caracterizar a passagem de épocas, tomo emprestado uma citação de Arrigo Sacchi, renomado treinador de futebol – introdutor da gaiola (conhecida com o seu nome) no processo de treino – que disse: Não é preciso ter sido cavalo para ser bom cavaleiro!

Claro que não – e disso não faltarão exemplos – mas, acrescento eu, é preciso saber de cavalos.

sábado, 14 de agosto de 2010

PILAR MEDE-SE NA FORMAÇÃO

Os dois pilares internacionais portugueses – Jorge Segurado e João Júnior – decidiram ir tentar a sua sorte no estrangeiro. Estão ambos no norte de Inglaterra e no mesmo clube: Luctonians Sports Club da II divisão regional.

Embora saiba que, pelo menos por agora, nenhum dos dois teria lugar em qualquer equipa, francesa ou britânica, de topo e mesmo duvidando da sua capacidade para, de imediato, entrarem em equipas do nível da ProD2 francesa, o facto de irem jogar para uma equipa que disputa um campeonato inglês de 4º nível não me terá parecido uma boa solução.

Falei com Murray Henderson, antigo treinador do pack da selecção e responsável pela ida de ambos, e pedi-lhe para explicar o seu ponto de vista sobre as vantagens da transferência. A resposta foi directa e elucidativa: “naquele nível de campeonato as formações ordenadas são uma constante; cada um deles fará por jogo um enorme número e no final do ano isso representará uma experiência impossível de igualar ou conseguir em Portugal.”

Não é má perspectiva para quem tem já, como eles, capacidades de movimentação que os colocam, nesse campo, como jogadores interessantes, mas a quem faltará – imperdoável num primeira-linha – a componente principal da posição que se traduz no traquejo e domínio da formação-ordenada. Ao que sei, jogarão este fim-de-semana. Pode ser o início de uma interessante experiência com boas vantagens para o rugby português internacional.

segunda-feira, 9 de agosto de 2010

TREINAR EM AGOSTO

sexta-feira, 6 de agosto de 2010

O RUGBY COMO UM BANDO DE ESTORNINHOS

O rugby é um jogo simples mas não é fácil.
Basta ver os jogos dos actuais All-Blacks para se perceber o conceito. A sua forma de jogar – dentro da tradição vanguardista que os caracteriza – é de uma simplicidade desconcertante: pura aplicação dos PRINCÍPIOS FUNDAMENTAIS do Jogo. Mas não é nada fácil atingir o seu nível – aliás, nota-se pelos últimos resultados conseguidos…
Como qualquer outra grande equipa de desportos colectivos – aquelas verdadeiramente grandes que não permitem que uma mera e única alteração táctica seja impeditiva do desenvolvimento do seu jogo – a Nova Zelândia cumpre regras de eficiência colectiva.
A primeira das quais diz respeito, desde logo, à aceitação das lideranças momentâneas. Ou seja, cada jogador tem o conhecimento táctico e a capacidade técnica necessários à tomada das decisões adequadas às situações com que se confrontam – e isso é tacitamente aceite por todos os companheiros que de imediato aderem à proposta, lendo a situação na relação companheiros/adversários e posicionando-se de acordo com a melhor solução.
Esta aceitação da liderança passa pela confiança no portador da bola que, enquanto líder, tem o direito – face à situação que enfrenta – a tomar decisões. Que são possíveis porque também ele confia no apoio, solidariedade e capacidade de resposta dos companheiros. E porque, todos eles, têm clara noção dos objectivos a que se propõem.
A RFU coloca o Espírito de Equipa como o primeiro dos Valores Fundamentais que propõe para o seu rugby. Este Espírito de Equipa que, personificando a transformação de um grupo num conjunto coeso, capaz e solidário, assenta na comum definição de propósitos, alinhamento de perspectivas e sincronização de movimentos. Os jogadores da Nova Zelândia têm esse conceito desenvolvido –se não vier já da conversa em casa durante as refeições… - desde o primeiro dia em que entram em campo para tocar a bola oval. E, estou certo, toda a sua metodologia de treino se desenvolve com o foco no colectivo e na capacidade de entrega em nome da equipa.
Sempre que vejo equipas a jogar deste modo – movimento dos jogadores de acordo com o movimento da bola e o posicionamento adversário – lembro-me do voo de um bando de estorninhos. Também eles aderem – em voltas de perfeita sincronização colectiva e plasticidade exuberante – a lideranças momentâneas, cumprindo escrupulosamente as propostas que recebem. Sem estados de alma ou vedetismos, mantendo-se apenas focados nos seus objectivos.

a partir de imagens de Dylan Winter

terça-feira, 3 de agosto de 2010

A CAMINHO DE FRANÇA

O Adérito - Adérito Esteves, internacional português e que tem jogado ultimamente em Direito - já está em França e prepara-se para jogar pelo CASE Rugby (Club Athlétique de Saint Etienne Rugby) na ProD2.

Que a sorte o acompanhe e que seja capaz da adaptação necessária para fazer carreira no mundo profissional. E também que alguém - finalmente - lhe ensine algumas técnicas que o tornarão num jogador mais eficaz: aprender os gestos técnicos do in-out - que os franceses designam por cadrage-débordement - sem perder velocidade ou aprender - enquanto jogador não marcado como são os pontas - a intercalar-se na linha de três-quartos quer vindo do lado fechado - o mais fácil e acessível - quer vindo do lado aberto - situação bastante mais exigente do ponto de vista  táctico - contribuirá para transformar a sua excelente planta física num jogador de rugby capaz de traduzir em eficácia o potencial que transporta.

Se a coragem que mostra ao aderir a esta aventura tiver sequência na assertividade com que encare treinos e jogos, ouviremos falar dele. 

segunda-feira, 2 de agosto de 2010

RUGBY DE MOVIMENTO

Austrália-Nova Zelândia: um jogão. Com dez ensaios, duas regras e uma consequência.

A primeira regra: duas equipas que querem ganhar e não têm medo de perder. É esta atitude que permite que os jogadores corram riscos, tentem coisas e procurem soluções colectivas. Que utilizem todo o campo, circulando a bola mais vezes do que se desfazem dela.

A segunda regra: a bola é para ser usada até ao limite das nossas possibilidades. Melhor do que todos os outros, os neozelandeses seguem esta regra – procurando o espaço livre, garantindo a superioridade numérica pelo apoio, movimentando a bola, mantendo a continuidade do movimento e criando problemas à defesa até chegar ao ensaio.

A consequência: para os australianos o corolário da Lei de Murphy – quando a pressão aumenta, shit happens! - começou a fazer das suas, obrigou a erros e a disparates que resultaram em cartões amarelos e na incapacidade de fazer frente ao poderio all-black.

Os all-blacks deram, como têm dado sempre esta época, uma lição de jogo no chão: a bola é para estar rapidamente à disposição do médio – é ele que decide da velocidade de saída mas, para isso tem que a ter disponível – e se o portador da bola tem a preocupação de garantir a colocação da bola em situação de uso, os jogadores em apoio não se limitam a cobrir o placado – cumprem o primeiro princípio fundamental do jogo e avançam no terreno, empurrando e expondo a bola. Colocando-a, visível, na vitrina.

A arbitragem foi excelente. Cumpriu as Leis do Jogo e as suas interpretações foram sempre
correctas: não de pode entrar em contacto com o adversário sem utilizar os braços – pontapé de penalidade e amarelo, ponto final; não se pode atrasar o direito de jogar do adversário (chico-espertice óbvia) – pontapé de penalidade e amarelo, ponto final. Não deixar passar esta formas de jogo perigoso ou desleal é decisivo para a limpeza do jogo e para a sua beleza e desportivismo. É como garantir o processo de sequência do jogo no chão: 1. verificar se o placador solta o placado; 2. verificar se o placado larga a bola; 3. verificar se os “limpadores” entram pela porta e se se agarram uns aos outros. Se assim não for, pontapé de penalidade; se assim for, existe a garantia de que a bola sai rápida e permite a continuidade do jogo. Ganha o jogo e a sua beleza.

O rugby jogado como neste Austrália-Nova Zelândia é um espectáculo para o qual não há arrependimento por pagar bilhete. Chama-se rugby de movimento e é o que vale a pena ver e jogar.

Arquivo do blogue

Quem sou

Seguidores