domingo, 28 de fevereiro de 2021

GALES VENCE A TRIPLE CROWN


O jogo do fim-de-semana foi o Gales-Inglaterra e a vitória de Gales foi formidável: aproveitaram as oportunidades, bateram-se em cada milimetro de terreno e tiveram nos seus placadores a defesa do seu território — dos seis primeiros lugares dos placadores do Torneio até agora disputado, quatro pertencem a galeses com direito aos três primeiros lugares (Tipuric, Faletau, o capitão Wyn Jones e o pilar Tomas Francis no quinto posto) com uma média de 16 placagens por jogo. E a defesa colectiva de Gales esteve muito bem, sujeitando os ingleses a uma enorme pressão que mostraram uma enorme dificuldade para ultrapassar e que os levou a cometer 14 faltas. Algumas delas feitas nos reagrupamentos pela necessidade de atrasar a saída das bolas e conseguir tempo de reorganização dos desequilíbrios. Ganhando por 40-24 a equipa de Gales deu uma prenda inesquecível para o seu centenário George North..

Apesar da polémica que se criou em torno de duas decisões, com chamada ao TMO, do árbitro, o francês Pascal Gauzere — que se esqueceu de reparar nos quase constantes fora-de-jogo do ponta-de-lança da defesa inglesa pelas linhas atrasadas — Gales dominou a maior parte dos aspectos do jogo – basta ver as estatisticas com 55% de domínio de posse e de território que se traduziram em 4 ensaios contra os dois ingleses.

No que diz respeito à polémica sobre a arbitragem e se concordo que terá havido alguma precipitação do árbitro a declarar “time on!”, também considero que se Biggar fez o que está autorizado a fazer — jogar de imediato após a ordem do árbitro e fazendo, aliás, um pontapé de notável precisão para Adams marcar— os jogadores ingleses presumiram o pontapé aos postes galês e não verificaram os sinais do árbitro. Coisa pouco admissível neste nível competitivo onde, como o bater das asas da borboleta, o menor dos erros pode ter grandes consequências.

Quanto ao ensaio de Lian Williams e apesar das vozes que declaram — entre os quais Nigel Owen com quem não estou, de novo, de acordo — que foi um adiantado sem margem para dúvidas, eu acho que não — voltarei ao assunto em próximo post. Rees-Zammit tentou captar a bola com a mão direita, tentando, num movimento imediato, controlá-la também com a mão esquerda. A bola  caiu e bateu na perna de Rees-Zammitt e foi para trás para bater noutra perna, a de um defensor inglês, que a lançou para a frente. A partir desse momento não há nem adiantado nem hipótese de fora-de-jogo de Lian Williams. E a atenção e rápida reacção deste, permitiu o ensaio...

Com esta vitória Gales conquistou a Triple Crown e abre uma estrada que o pode levar ao Grand Slam. E fez de novo acreditar que pode ter uma equipa capaz para 2023.

No Itália-Irlanda, para além de nova demonstração das fragilidades italianas, o mais interessante — e importante — foi o árbitro, o francês Mathieu Raynal, dizer, logo no princípio de jogo e em alto e bom som, que não iria admitir que os jogadores à frente do chutador não parassem e continuassem a correr no encalço da bola. De facto tem havido uma enorme permissividade, nomeadamente em Portugal, neste aspecto do jogo, colocando o três-de-trás defensivo em pior situação do que aquele que normalmente estão. Assinalar e corrigir, libertando indevida pressão, melhora o jogo e estabelee disciplina — pena é ver-se pouco...

Acima de tudo, neste fim-de-semana, recorde-se, pelo que representam, as palavras do capitão e do treinador da Inglaterra quando lhes foi pedido comentário sobre a arbitragem. Owen Farrell, o capitão, disse, ainda dentro do campo, que a sua focagem, a focagem da sua equipa, se centra naquilo que podem controlar e por isso não discutiam as decisões do árbitro. Mais tarde, respondendo a jornalistas, disse: “Não vale a pena falar disso neste momento. Isss é para outras pessoas falarem. Talvez tivessem havido decisões duras mas nós devíamos ter sido suficientemente bons para a sultrapassar.” Por sua vez Eddie Jones, o treinador, respondeu assim aos jonalistas: “Foram grandes decisões, nós não podemos debatê-las — nós não estamos autorizados a debatê-las. Tudo o que ganharia com isso seria uma multa e isso não iria ajudar seja quem fôr”.
Derrotados, possivelmente achando-se injustiçados mas mantendo a dignidade e a compostura que dizemos enquadrar o rugby. Uma boa lição a mostrar, de facto, diferenças e a dignificar um comportamento desportivo.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2021

GALES-INGLATERRA NO 6NAÇÕES


 O jogo que levanta mais expectativas nesta 3ª jornada é, sem dúvida alguma, o Gales-Inglaterra a disputar em Cardiff — se as expectativas do França-Escócia assentava essencialmente em saber que equipa o Covid deixaria os franceses apresentarem (lembre-se que em VII já falharam o Torneio de Madrid), agora estão reduzidas a saber em que data o jogo poderá ser disputado...).

No jogo de Cardiff os galeses apresentam um meio-campo com Dan Biggar-Jonathan Davies-George North servidos pelo formação Kieran Hardy e um três-de-trás composto por Josh Adams-Louis Rees-Zammit -Liam Williams num conjunto de respeito com experiência e capacidade criativa suficientes para criar dores de cabeça à defesa inglesa. Destes experientes jogadores, George North leva a palma ao realizar a sua 100ª internacionalização, tornando-se assim o jogador mais novo a atingir a centena de jogos internacionais.

Com a terceira-linha formada pelos caçadores Josh Navidi-Justin Tiparic-Taulupe Faletau, Gales terá aqui a unidade capaz de exercer a pressão suficiente para obrigar os ingleses — como acontece sempre que sujeitos a demasiada pressão — a recuarem no tempo e a não ultrapassarem o jogo “à moda antiga” de colisão constante e chutos em alternativa.

A Inglaterra com duas alterações — Jamie George a talonador e Mark Wilson do lado-fechado — mantém a sua formação com Ford a abertura e Farrell a 1ª centro, aumentando a sua capacidade de jogo ao pé e obrigando o três-de-trás galês a jogar recuado e a não participar na 1ª linha defensiva — a não ser que o formação Hardy seja capaz de cumprir um especial papel de cobertura defensiva, permitindo a subida do ponta e o deslocamento de Lian Williams para as alas do terreno.

Mas será na velocidade de disponibilidade da bola nos reagrupamentos que o ataque galês terá a sua principal arma e onde os ingleses terão o papel de atrasar o mais possível a saída da bola. E aqui o árbitro terá um papel decisivo...

Embora os prognósticos sejam favoráveis aos ingleses por uma diferença de pontos muito curta, há todo um País de Gales à espera da vitória sobre o “velho inimigo”... num jogo a não perder e que a SportTV transmitirá em directo.

No Itália-Irlanda a vitória não deverá fugir aos irlandeses que têm em Roma a possibilidade de marcar as distâncias em relação aos italianos.  

domingo, 21 de fevereiro de 2021

A URGÊNCIA DE LEIS DO JOGO MAIS CLARAS

Joga-se como se treina!

O acrobático e espectacular ensaio em voo de Jonny May no último Inglaterra-Itália, tem marcado a polémica dos últimos dias, principalmente depois do célebre Nigel Owens ter declarado: “A lei é perfeitamente clara e diz que não se pode saltar para evitar a placagem.” Como?! Em que ponto?! e justifica-se: “como pode um defensor placar se o portador da bola está no ar?”. Infere-se, assim, que se refere à Lei 9.17 - Jogo Perigoso do Capítulo Jogo Desleal. E pode estabelecer-se uma relação causa-efeito e admitir qua lei é clara não permitindo que se salte para evitar uma placagem? Tenho muitas dúvidas.
Outros, que também defendem a ilegalidade do ensaio, reportam-se à Lei 9.11 - Jogo Perigoso: “Os jogadores não podem agir nunca de forma imprudente ou perigosa para com os outros”. Como se saltar fosse, em si, perigoso para alguém. E a verdade é que nada se diz, seja em que lado seja das Leis do Jogo de Rugby, que não se pode saltar.

Não me parece que qualquer delas permita, sequer, qualquer argumento para anulação do ensaio. Vejamos então. 


No Rugby só se pode placar o portador da bola que, por sua vez, tem diversas capacidades à sua disposição para o evitar: colisão, afastar com a mão, finta, engano e toda a sorte de astúcias de que possa servir-se. Obviamente cumprindo a Lei 9.11. E onde fica a proibição de saltar para evitar a placagem? Onde se determina a sua perigosidade só porque é um salto? Pode ser perigoso saltar se provocar uma colisão directa ao nível da parte superior do corpo, mas será perigoso se o salto for feito na direcção do espaço, do intervalo ou no salto para a zona do ombro fraco depois de um ataque ao outro ombro ou no passo-de-ganso do notável David Campese? ou saltar quando o defensor, numa tentativa de extensão desesperada tenta apanhar um pé ou mesmo as canelas do atacante? Como aliás de vê em dezenas de ensaios marcados em que o salto é a finalização, tendo por motivo ou a eficácia — atingir mais rapidamente a área-de-ensaio ou procurando atingir uma maior distância sempre com o objectivo de evitar uma placagem — ou o espectáculo — dando com o voo o sinal para o levantamento do entusiasmo das bancadas. 


Como em todos os gestos do jogo, o salto pode ou não colocar em perigo a integridade física do adversário. Depende portanto e sendo cada caso um caso, exige-se a análise dos árbitros. Certo, certo, é o facto de não estar expresso em parte alguma das Leis do Jogo a proibição de saltar.

Saltamos porque queremos chegar mais longe, porque nos dá gozo,
porque queremos evitar a placagem.

O problema destas análises e afirmações é o de se basearem na tradicional cultura britânica de validade do costume, do hábito, sobre o definido pelo conjunto de regras. E, por isso, como nos apercebemos durante a recente tradução das Leis de Jogo 2021, o livro está cheio de incoerências, contradições e, mesmo erros. Principalmente quando da redução do texto — tornado cerca de 42% mais curto — em 2018. E disso estamos a dar conta à World Rugby com sugestões de clarificação e alteração.


Em 2017, no célebre Nova Zelândia-British Lions, um pontapé-de-penalidade no final do jogo (77’) e que definiu a vitória dos europeus por 24-21, foi assinalado pelo árbitro francês, Jerôme Garcés, que considerou faltosa uma placagem neozelandesa de Charlie Faumuina sobre o Lion Kyle Sinclair que, portador da bola, se encontrava no ar e que, portanto, não poderia ser placado. De imediato o capitão AllBlack, Kieran Read, comentou com algo como:"Então, quando fôr com a bola, salto para o placador e ganho uma penalidade...". É um facto que a penalidade foi aplicada de acordo com a letra das Leis do Jogo. Demonstrando o tremendo erro da sua redacção! Pela simples razão de que o portador da bola em corrida de velocidade tem, de voo, 50% do tempo da sua corrida e não tem, praticamente nunca — correr não é Marcha — os dois pés em contacto simultâneo com o chão. Ou seja e de acordo com a letra da lei, não tendo os pés em contacto com o solo, o portador da bola não pode ser placado — e acaba-se a placagem no rugby excepto para quem esteja parado ou a andar a passo. Isto é, a redacção da Lei 9.17: Um jogador não pode placar, entrar em carga, puxar, empurrar ou agarrar um adversário cujos pés não estão em contacto com o chão.” é um erro enorme e demonstrador de total ignorância da biomecânica da corrida — são coisas destas que me trazem sempre à memória o conceito de John Le Carré de que: “a secretária é um sítio muito perigoso para analisar o mundo” — e como tal não deveria estar descrita nas Leis do Jogo. E como se chegou até aqui? 


Em 1995, no livro da IRFB, The Laws in Plain English — nos livros de Leis do Jogo mais antigos, para não falar do histórico “The Original Rules Of Rugby”, que tenho em casa, datado de 1981 ou na tradução portuguesa de 1990, nada é referido sobre o assunto — na Lei 26 - Jogo Desleal, (D) Jogo Perigoso, estabelecia-se assim:”6Não placar o saltador no ar. Num alinhamento, qualquer jogador que toque ou puxe um pé ou pés de um adversário que salta para a bola, é culpado de jogo perigoso. No jogo-em-geral, qualquer jogador que plaque um adversário cujos pés não estejam em contacto com o chão porque está a saltar para apanhar a bola, é culpado de jogo perigoso.” Estavam lançados os dados: não é permitido placar um jogador que esteja a saltar para apanhar a bola! Nos alinhamentos e no jogo-em-geral. Em 2000 e em 2004, estabelecia-se — com uma redacção mais precisa — no mesmo sentido: jogador que estava no ar, na tentativa de apanhar a bola, não podia ser placado. Mas nada era dito sobre a proibição de saltar, nem tão-pouco, que o portador da bola não poderia ser placado mesmo se em salto.


A partir de 2011, com a passagem da lei de Jogo-Desleal de Lei 26 para Lei 10, dá-se uma revisão na escrita. Com duas alíneas a Lei 10 — Jogo Desleal, 10.4 Jogo Perigoso e Conduta Desadequada, passou a ter a seguinte redacção: "e) um jogador não pode placar um adversário cujos pés não se encontrem no chão; i) Placar o saltador no ar. Um jogador não pode placar ou tocar, empurrar ou puxar o pé ou pés de um adversário que salta para a bola num alinhamento ou no jogo-em-geral."


E aqui começou a confusão com o erro da introdução da alínea e) que, como já se viu, é inaplicável. Mas criou-se uma correcta redacção — alínea i) — que limita tudo ao que estamos, de facto, habituados: não se pode placar nenhum jogador que salta para apanhar a bola, seja em que circunstância fôr. 


Com a redução do texto das Leis em 2018, o problema ampliou-se uma vez que, embora deixando clara a situação no alinhamento com a descrição da Lei 18, 29, e), foi retirada a parte final da alínea e) da anterior Lei 10 que passou a ter, agora na Lei 9.17, a redacção actual de proibição de placagem a quem não tenha os pés em contacto com o chão. Ou seja, resolveu-se generalizar — vá lá saber-se porquê — a anterior limitação de não placar apenas quem salta para a bola, passando a não permitir placar quem salta. Este alargamento descuidado mostra-se um disparate de bradar aos céus uma vez que ignora as propriedades da corrida e o objectivo do salto — atingir maior distância pela combinação da velocidade com a altura do salto — criando-se uma situação ambígua que faz depender do entendimento do árbitro a sua aceitação. 


Em vez da clareza de deixar o defensor placar o portador da bola, no ar ou não, e, como é adequado, protegendo-o ao considerar jogo perigoso se o atacante atingir a sua cabeça, saiu a confusão.


Portanto as dúvidas sobre a validade do ensaio de Jonny May surgem apenas da mistura confusa — e que nada autoriza — de conceitos aplicáveis a outras situações. O facto de não se poder placar um jogador no ar, não significa necessariamente que não se possa saltar. Se assim fosse a pergunta de Kieran Read só podia ter uma resposta: sim! E o jogo transformava-se num outro jogo.


Solução? Alterar a Lei e voltar a escrever com o sentido anterior a 2004: “Um jogador não pode placar, carregar, empurrar, puxar ou agarrar um adversário cujos pés não se encontrem no chão durante o tempo de execução de um salto para agarrar a bola.” Deixando claro, então sim, que o transportador da bola — como sempre aconteceu — pode sempre ser placado, esteja ou não em voo e garantindo que o resultado final ficaria definido mais pelas acções dos jogadores do que pelas interpretações da arbitragem.


Este é só um exemplo do muito que deveria ser feito — simplificando e clarificando — nas Leis do Jogo como contributo para que a globalização da modalidade seja uma realidade mais competitiva e mais equilibrada.

terça-feira, 16 de fevereiro de 2021

LER, ADAPTAR E COESÃO NA ACÇÃO COMO BASE DAS VITÓRIAS


A Inglaterra venceu a Itália com a facilidade esperada mas sem conseguir tirar as dúvidas sobre as suas capacidades. Aliás os italianos mostraram que não se levam muito a sério ao aparecerem com equipamentos que o prestígio do 6 Nações não merece: primeiro uma camisola sem número; depois, uma camisola número 24 e outra número 26. Com este mau exemplo a Itália mostrou, mais do que a incapacidade de resultados, que é também incapaz em termos de organização e de estrutura cultural - uns noviços no fundo e com a Geórgia à espreita...

De interessante e para ficar na memória o ensaio do ponta Jonny May que voando — meio dentro, meio fora do campo — conseguiu o equilíbrio necessário para, derrubando a bandeira (legal hoje em dia), conseguir fazer o toque no chão necessário à marcação do ensaio. Ensaio que levantou alguma polémica (de que falarei em próximo post) a partir de um óbvio engano do famosíssimo centenário Nigel Owen.

Obviamente que o melhor resultado do fim-de-semana —  era suposto perderem por 10 pontos de diferença —   pertenceu aos galeses que, com uma vitoria tangencial de 1 ponto em Murrayfield e jogando de novo contra 14 adversários — desta vez durante 27 minutos — conseguiram com uma posse de apenas 38% marcar 4 ensaios que, para além da vitória, lhes possibilitou um ponto de bónus ofensivo e o acesso ao 2ª lugar, empatados em pontos com a França que ocupa o 1º lugar.

No Irlanda-França venceu também a equipa — a França por 2 pontos de diferença — com menos posse (41%) de bola e que marcou 2 ensaios contra 1 dos irlandeses, sendo um deles de enorme mestria com uma série de passes heterodoxos só possíveis pelas empenhadas linhas-de-corrida dos receptores que souberam muito bem convergir antes de passarem à exploração da largura do campo.

Parece assim poder dizer-se — como muitos gostam — que foram as defesas que ganharam o jogo — Gales com  uma eficácia de 85% de 179 placagens e a França com 86% de 177 placagens realizadas. E é um facto que as defesas dos vencedores foram muito eficazes — os princípios defensivos de Shaun Edwards estão nas duas equipas — mas não chega defender bem para ganhar o jogo, é preciso marcar mais pontos do que o adversário.
Vejamos alguns valores estatísticos. A França conquistou 374 metros em transportes de bola, realizou 110 passes (12 em offloads), foi responsável por 74 reagrupamentos dos quais conquistou 93%, e conseguiu 11 quebras da linha defensiva— a Irlanda conquistou 365 metros, realizou 192 passes (3 em offloads), foi responsável por 115 reagrupamentos e por 4 quebras defensivas. Ou seja a França atacou melhor porque ultrapassou mais vezes a defesa irlandesa, foi ao chão menos vezes e defendeu o suficiente para garantir as vantagens conquistadas. O País de Gales, por sua vez e para marcar os seus quatro ensaios, conquistou 188 metros, fazendo 118 passes (4 offloads), tendo ido ao chão em 66 reagrupamentos e 7 quebras defensivas enquanto que a Escócia, ficando por 3 ensaios, conquistou 508 metros, fazendo 168 passes (5 offloads), com a responsabilidade de 120 reagrupamentos que lhe atrasaram a continuidade dos movimentos e 11 quebras defensivas.

Que ensinamentos se podem tirar destes resultados estatísticos para justificar a vitória das equipas com menos posse, menos passes mas menos paragens em reagrupamentos? 

O primeiro e mais importante é que não basta a posse da bola ou a superioridade na sua conquista mas, essencialmente, o que conta é a eficácia da sua utilização. Pode ter-se muitas vezes a bola mas se não for possível desequilibrar a defesa, mantendo a continuidade sem passar pelo chão, o melhor que se consegue é uma ligeira conquista de terreno ou um jogo-ao-pé para entregar a iniciativa ao adversário

Com estes resultados estatísticos as vitórias das equipas com menos posse de bola nos jogos entre equipas competitivamente próximas tornam evidente uma propriedade fundamental: entre equipas equilibradas ganha aquela que consiga transformar as oportunidades em realidades mantendo a continuidade dos movimentos, o que significa capacidade de leitura conjunta e simultânea de jogo e demonstra uma verdadeira coesão colectiva: ler o mesmo, adaptação imediata à stuação e agir colectivamente de acordo com a solução mais objectiva. Determinado um apoio com linhas de corrida adequadas para garantir a continuidade do movimento — o que exige que a posição do número das camisolas deixe de definir a ocupação espacial.


sábado, 13 de fevereiro de 2021

PREVISÕES PARA A 2ª JORNADA DO 6NAÇÕES 2021

2ª JORNADA

Neste fim‑de‑semana dois jogos — Escócia x Gales às 16h45 de sábado e Irlanda x França às 15h00 de domingo e que serão transmitidos na Sport TV5 — chamam a especial atenção dos adeptos. O outro jogo, Inglaterra x Itália, 14h15 de sábado no mesmo canal, servirá para a conciliação — fácil, diria — do XV da Rosa com o seu público. Permitindo, nomeadamente, que o contestadíssimo  Owen Farrell volte ao lugar de 1º centro. E que Jones continue com os seus mind-games... A única curiosidade deste jogo é a de saber se os ingleses mostram que são capazes de jogar um jogo interessante e não o habitual e repetitivo colide-colide-chuta e colide e colide... Como novidade apenas — e segundo o próprio Ford — o retorno do pontapé-em-rotação que o, de novo, abertura, acredita ser de bastante mais difícil controlo por parte dos defensores. Quanto aos italianos, a Rugby Vision atribui-lhe 97,9% de probabilidades de ficarem— mais uma vez — no último lugar. Portanto deles... ninguém espera nada de especial.

A vantagem da casa nos jogos é evidente nas previsões quer do XVcontraXV, quer do Rugby Vision do neozelandês e economista no Massachusetts Institute of Technology, Niven Winchester que simpaticamente me autoriza a reproduzir as suas previsões e probabilidades. A Escócia, com a belíssima defesa que mostrou contra a Inglaterra, é muito capaz de reduzir a vontade galesa à sua expressão mais simples. Até porque Gales, apesar da moralização que vitória sobre os irlandeses provoca, viu o azar bater-lhe à porta na incapacidade de George North que, no último fim‑de‑semana, se mostrou como o mais eficaz penetrante dos jogadores galeses. Como irão os galeses resolver a falta, é uma das curiosidades do jogo.

No Irlanda-França teremos o prazer de voltar a ver a dupla Dupont-Jalibert que, embora não tenha como adversários directos a também notável dupla Murray-Saxon — o que seria um mais nas enormes expectativas que rodeiam o jogo — irão com certeza encher o campo de momentos espectaculares. O resultado final vai estar muito dependente da velocidade de disponibilização das bolas nos reagrupamentos no chão — os irlandeses para utilizarem a sua melhor qualidade que consiste na capacidade de multiplicar fases com recurso a um passe até à quebra defensiva adversária; os franceses porque, nos seus melhores dias em que perdem o medo ao risco, gostam de aproveitar todas as oportunidades de jogo aparentemente desorganizado. Para se ter uma ideia da diferença de modelos de jogo entre as duas equipas, vejam-se as seguintes estatísticas: contra Gales a Irlanda fez 262 passes (!!!) para percorrer 536 metros (2 m/passe) realizando 168 rucks; contra a Itália, a França fez 104 passes — menos de metade do realizado pelos irlandeses — para percorrer 484 metros (4,6 m/passe), realizando 58 rucks, quase um terço do produzido pelos irlandeses. O que traduz duas tendências distintas: do lado dos irlandeses um tanto vai até que fura, do lado francês a preferência pela manobra antes da colisão. Veremos o resultado deste confronto num óptimo pretexto para garantir o necessário “fique em casa”

Nota: em relação ao texto primeiramente publicado foram acrescentadas algumas estatísticas.


 

segunda-feira, 8 de fevereiro de 2021

SURPRESAS NO 6NAÇÕES 2021


Se o resultado de Gales, nesta primeira jornada do Seis Nações 2021, foi uma surpresa ditada pelos deuses da fortuna que determinaram um cartão vermelho ao irlandês, Peter O'Mahony — ainda nos 13' da primeira-parte mas mais do que merecido — e um erro enorme no crucial pontapé final do então abertura irlandês, Billy Burns, provocado pela desconcentração de uma desnecessária gula que terminou um absoluto disparate do galês Gareth Davies que, com a vitória na mão, entregou, com um pontapé rasteiro despropositado, uma enorme oportunidade à Irlanda — o grande resultado deste fim‑de‑semana pertenceu à Escócia que foi a Twickenham levar de vencida os arrogantes ingleses. Ingleses que e mais uma vez, voltaram a mostrar, como nos tempos antigos e sempre que a pressão — seja exterior, seja do próprio jogo —aumenta, o retorno a um jogo de mero desafio físico e sem manobras de solução. De facto não conseguiram criar um problema sério a uma equipa que esteve sempre muito bem organizada defensivamente e com um defesa, Stuart Hogg, que, só por si, tomou completamente conta da última linha defensiva eliminando qualquer veleidade inglesa de chuto-para-frente. 

O Itália-França, embora jogo muito desequilibrado —7 ensaios franceses — como o resultado indica, tem na delícia da possibilidade de se ver o superior Antoine Dupont o melhor convite para rever o jogo.  É um médio-de-formação de enorme categoria: passa bem e rápido, lê bem o jogo, defende muito bem quer directa, quer tacticamente, sabe usar os pés — é um tratado que vale a pena ver e rever... e copiar. E que será uma arma fundamental da equipa da França que Gualthié está a preparar com vista ao Mundial 2023.

No próximo fim‑de‑semana, os jogos continuam com um Escócia-Gales e um Irlanda-França e a clausura da pandemia será melhor suportada.

 

domingo, 7 de fevereiro de 2021

APRENDER COM A DERROTA O CAMINHO DO MUNDIAL 2023


O posicionamento no ranking da World Rugby das duas equipas prognosticava uma derrota para Portugal por uma diferença de 16 pontos — foi de 14...

Nos momentos iniciais do jogo parecia que os Lobos, com um bloco de avançados de peso equivalente, iria discutir, palmo-a-palmo, o resultado, mantendo viva a hipótese do segundo lugar na tabela classificativa final — foi 4ª...

Estas ilusões são uma constante quando não se analisa convenientemente a realidade. Os dois jogos contra uma equipa do Brasil demasiado fraca, não mostraram nem grande qualidade ou capacidade da equipa nacional nem se realizaram a um nível de intensidade tal que demonstrasse uma boa preparação dos nossos jogadores. Foram duas obrigatórias vitórias por números que iludiram...porque as incapacidades estavam lá...

Apesar do bloco de avançados constituído por jogadores habituados a ritmos mais elevados poder fazer pensar — eu pensei... — que iria haver equilíbrio com os hábitos competitivos mais desenvolvidos — que tem como causa um campeonato interno mais constante e com mais jornadas competitivas — dos jogadores espanhóis que jogam em Espanha.

De novo a ilusão... o jogo português mostrou as debilidades que vemos domingo a domingo no nosso campeonato interno. E daí que dos 63% de posse de bola da 1ª parte não resultassem mais do que um ensaio a dar razão ao conceito: não é a posse da bola que garante a eficácia mas sim a sua boa utilização. E os jogadores portugueses habituaram-se a dois terríveis defeitos tácticos: ignorar a manobra antes da colisão e, ao mínimo contacto, procurar o chão — e hoje sabe-se que a ruptura da linha defensiva se faz por jogar de pé e com recurso aos passes-em-carga (off-loads) que permitem o jogo de ruptura entre linhas e que a ida ao chão, se permite a manutenção da posse, dá também todas as vantagens à defesa —tanto maiores quanto maior fôr o tempo de disponibilização da bola — que tem tempo para colmatar eventuais desequilíbrios. E assim a superioridade de posse da bola conseguida, não se traduziu em vantagens e a ultrapassagem da linha-de-vantagem que cria as superioridades numéricas que permitam a utilização eficaz, quase nunca existiu. A permanente procura do chão tende também a atrasar a continuidade do movimento e levar que a construção atacante tenha que ser recomeçada de novo. 

A juntar a estes erros tácticos acrescenta-se um jogo-ao-pé inofensivo, pouco eficaz e que entrega a iniciativa do jogo ao adversário. Com a forma como as defesas actuam hoje em dia — e a defesa espanhola subia rápida e, mais do que uma vez, com os exteriores adiantados — um bom jogo ao pé, pelo menos a dois — abertura e 1º centro — é decisivo para que se possam explorar os corredores laterais do campo. Não havendo receio do jogo-ao-pé adversário as defesas sobem mais e, ocupando a largura do terreno, levam os atacantes a cairem na armadilha da colisão directa ao não lhes darem intervalos de penetração. É assim, o receio de um jogo-ao-pé incisivo que procura obrigar a deslocações do três-de-trás defensivo que vai permitir, pelo cuidado de ocupação de terreno que exige aos defensores, o desenvolvimento do ataque e a opção pelas duas outras formas, do largo aos intervalos. Lembrando sempre que — como já tinha sido demonstrado na Taça Ibérica — o jogo das linhas atrasadas é muito mais do que um mero jogo de 3/4...

Para além destes erros tácticos, um vício de comodidade no jogar longe da linha-da-vantagem —para além da incapacidade de explorar o lado-fechado — dá também todas as vantagens à linha defensiva que pouco mais tem que deslizar para anular eventuais desequilíbrios. Até porque este jogo distante se mostra demasiado previsível e sem manobras alternativas e, por conseguinte, com enorme dificuldade de quebrar a linha defensiva.

Que lições tirar deste jogo de Madrid para manter reais as possibilidades de apuramento para o Mundial?

Antes de mais reconhecer que a base de uma boa equipa se alicerça no nível de hábitos competitivos e isso exige uma organização das competições internas que garantam o mais elevado nível, um nível tão próximo quanto possível das exigências internacionais — e isto é responsabilidade da comunidade rugbística portuguesa uma vez que todos teremos a ganhar com a melhoria competitiva do nosso melhor rugby. 

E ressalta também à evidência a necessidade de criação de condições que permitam ultrapassar as debilidades tácticas e técnicas dos jogadores com particular incidência nas exigências técnico-tácticas do jogo-ao-pé e do passe rápido. O que passa por rever processos e métodos de treino — e mesmo de formação — desenvolvendo uma forma de jogo que melhor se adapte às características dos jogadores portugueses.

O caminho para o Mundial 2023 é um caminho colectivo que começa no próximo mês. Alteremos desde já o que deve ser alterado.

sábado, 6 de fevereiro de 2021

LOBOS: DIFÍCIL MAS NÃO IMPOSSÍVEL

Com o ponto de bónus administrativo recebido pela Roménia — ganhou 28-0 por falta da Bélgica — este jogo entre os Leones e os Lobos passou a contar mais do que o prestígio ibérico ou a possibilidade de ver o estado competitivo de cada equipa. Os três qualificados deste European Rugby Championship 2020 garantem para o próxima etapa de qualificação para o Mundial 2023 que, no torneio de 2021 terão dois jogos em casa e três fora, beneficiando da situação contrária no torneio de 2022. E como a qualificação do Mundial é determinada pelo somatório dos resultados dos dois torneios... percebe-se a importância futura do jogo e do seu resultado. 

Para Portugal o jogo não será fácil e é isso mesmo que o actual posicionamento do ranking da World Rugby mostra. Em teoria, 16 pontos farão a diferença final do resultado favorável à Espanha. E existe um histórico — 36 jogos com 10 vitórias e 2 empates para Portugal — que ajuda à perspectiva de favoritismo espanhol. Mas Portugal, os Lobos, que não defrontam a Espanha desde 2016, podem contrariar os prognósticos e vencer? Podem!

É pelo menos essa a confiança de Patrice Lagisquet, o selecionador nacional: "...não somos favoritos mas podemos vencer." Com um bloco de avançados essencialmente formado por jogadores — sete — que jogam o campeonato francês, o XV de Portugal consegue, desde logo, equilibrar a diferença de competitividade que os jogadores internos de ambos os países apresentam: em Espanha o campeonato principal vai na sua 9ª jornada para um português, na sua fase mais competitiva, de apenas 3 jornadas cumpridas.

A questão que envolve o jogo é esta: com o resultado atribuído à Roménia, só o vencedor deste Espanha-Portugal garantirá um lugar nos três primeiros da classificação e terá, por isso, acesso à teórica vantagem de ter mais jogos em casa na recta final do apuramento para o Mundial de 2023.

Mas, como se pode retirar dos quadros que seguidamente se apresentam, Portugal não tem, nos resultados obtidos nas anteriores jornadas do Rugby Europe Championship — embora haja uma boa diferença entre o Uruguai (fora) e o Brasil (casa) que constituíram os últimos adversários de ambas as equipas — uma visível inferioridade em relação à Espanha. E como não haverá público para ajudar os Leones... tudo é possível.  

 
As duas equipas equivalem-se na sua capacidade competitiva onde a diferença favorável à Espanha se faz apenas no facto de o seu somatório de pontos marcados ser essencialmente constituído por ensaios. O que demonstra uma boa capacidade atacante — mas o próprio seleccionador espanhol, Santi Santos, reconhece as qualidades defensivas portuguesas.


Em termos quer de compacticidade física — relação peso/altura — quer de experiência definida pelo número de internacionalizações, as duas equipas são muito equivalentes. No campo da experiência e a partir da meia-dúzia de internacionalizações já ninguém se deixa dominar pela pressão... E o cinco-da-frente português apresenta-se formado por jogadores muito capazes e com bom nome nos campeonatos franceses.

Aparentemente o resultado final irá depender da capacidade portuguesa de disponibilização rápida da bola (menos de 3s é o tempo óptimo) nos reagrupamentos — papel crucial do cinco-de-trás do bloco de avançados —  e de um jogo-ao-pé acutilante que coloque problemas — que os "meta em respeito", diz-se — ao três-de-trás espanhol. Porque, se assim fôr, as linhas atrasadas portuguesas terão o espaço e o tempo necessários para impôr pressão à defensiva adversária e mostrar as suas qualidades e eficácia atacantes. 

Portanto, difícil mas não impossível a procura da vitória que os nossos Lobos, com a sua habitual resiliência, nos garantirão neste jogo que abre uma época internacional muito importante no conjunto de jogos que tem um objectivo final: presença no Mundial 2023.

Força, Lobos!

sexta-feira, 5 de fevereiro de 2021

COMEÇA O 6 NAÇÕES 2021


Depois da Autumn Cup, o rugby de mais alto nível volta à Europa com o início do tradicional Torneio das 6 Nações 2021.

Nesta 1ª jornada, um jogo singular — o Inglaterra-Escócia — que se disputou pela primeira vez em 1871, a 1 de março mais precisamente, e que, a partir de 1879, passou a ter a disputa da Calcutta Cup que, nascida no dia de Natal de 1872 em Calcutta, na Índia, passou a integrar a cultura do Seis Nações, embora então, 1883,  designado por Home Nations. De 1879 para cá, a taça foi jogada 126 vezes com 71 vitórias da Inglaterra e 40 da Escócia.

Amanhã, desta vez em Twickenham, a taça será posta de novo em jogo pela Inglaterra que a mantém desde Fevereiro do ano passado depois da vitória por 13-6 em Murrayfield. Neste jogo dea manhã, o favoritismo vai para a Inglaterra que tem vindo a mostrar-se superior às suas congéneres britânicas. E é também isso que diz o ranking da World Rugby que, colocando-a no 2ª lugar, lhe perspectiva uma vitória por uma diferença de 23 pontos.

A França, de visita a Roma, não deverá deixar os seus créditos por mãos alheias e não deverá ter grandes dificuldades para vencer. Tal como no jogo entre ingleses e escoceses o ranking da World Rugby permite vaticinar uma vitória francesa por 23 pontos de diferença, muito próxima da diferença do último jogo entre as mesmas equipas que, em Novembro e disputado em Paris, deu uma vitória à França por 36-5.

No último jogo desta primeira jornada, um Gales-Irlanda que se mostra como o de prognóstico mais equilibrado — 5 pontos de diferença favoráveis à equipa irlandesa. Para Gales, cujas melhores equipas não têm demonstrado grande capacidade no PRO14 — ao contrário das equipas irlandesas que ocupam os dois primeiros lugares de cada série — haverá enormes dificuldades para reverter a recente derrota por 32-9 em Novembro passado e no Aviva Stadium de Dublin. O maior problema de Wayne Pivac, o neozelandês que treinava os Scarlets, estará na capacidade dos seus mais experientes e veteranos jogadores do bloco de avançados garantirem as vantagens — demonstradas no tempo de Warren Gatland — nos reagrupamentos e alinhamentos. E a falta de público e dos seus cânticos — capazes d transportar uma equipa até aos pináculos da vitória, vai custar muito aos galeses — e aos habituais telespectadores, também. De qualquer maneira um jogo a não perder na tarde de domingo. 

Seja como for e em tempo de pandemia, um bom entretenimento com três jogos com transmissão directa, via SportTV, para Portugal. 

Arquivo do blogue

Quem sou

Seguidores