sexta-feira, 29 de setembro de 2023

RESPEITO E ATENÇÃO, EXIGE-SE

 Não entendo as distracções que a World Rugby tem dado mostras na organização da competição que é um campeonato do mundo.

Primeiro, vejam-se os Grupos C e D, onde se juntam equipas da mesma região — da Europa, Portugal e Geórgia e da América Latina, Argentina e Chile, num óbvio convite ao jogo de interesses. É que não basta dizer-se que nós, no rugby, somos diferentes. É preciso mostrá-lo com toda a transparência.

Como é evidente e ficando o terceiro qualificado apurado para o Mundial da Austrália em 2027, a mais fraca das duas equipas em confronto tem todo o interesse em permitir que a mais forte se qualifique porque assim é eliminado um forte adversário no futuro apuramento. E se o empate Geórgia-Portugal retira qualquer dúvida sobre uma combinação, o Argentina-Chile que se disputará no próximo sábado pode provocar desconfianças — e as entidades que fiscalizam estas coisas de fixação de resultados ou de apostas já estão atentas. E só o facto de haver desconfianças é mau, muito mau, para a integridade do Rugby em particular e do Desporto em geral. 


Todos conhecemos o conceito de que “à mulher de César não basta ser séria, deve parecer séria”. Pois ao Rugby também precisa de o parecer e não viver de frases feitas que são atiradas com alguma vaidade e pesporrência.


Por exemplo e por falta de cuidado, a França é nitidamente favorecida com um primeiro jogo 8 de Setembro e o último do seu grupo a 6 de Outubro, quase um mês depois — Portugal teve o seu primeiro jogo a 16 de Setembro e terá o último a 8 de Outubro… E sabe-se o que vale o descanso no peso de competições deste quilate.


Mas há pior: no regulamento de desempate, o 1º factor a considerar é o resultado entre as duas equipas empatadas — situação que estabelece o disparate do mesmo reultado contar para duas coisas diferentes mas cheias de importância qualificativa: conta para a classificação das equipas no grupo onde se inserem e, mais tarde e em caso de empate pontual, serve para defenir o melhor classificado entre as duas equipas. Como é óbvio existem outras formas de definir o desempate como acontece em Portugal e em outros países da primeira-linha do rugby internacional como a Inglaterra onde o desempate se faz pelo maior número de vitórias classificando assim primeiramente aquele que se mostrou mais eficaz, ou mais capaz, no conjunto do grupo. 


E este processo, principalmente em grupos com número ímpar de equipas e em que uma delas acabará a sua participação mais cedo, pode provocar desconfianças de jogos de interesse. Já se sabe que a realização dos jogos de um mesmo grupo à mesma hora é, numa competição que se espalha por um mundo de espectadores, muito difícil e provoca diminuição de receitas televisivas. Seja, mas tomem-se os cuidados necessários com outros instrumentos.


Veja-se o que se pode passar no Grupo de Portugal com Fiji a jogar no dia anterior do Austrália-Portugal. Se Fiji e a Austrália conseguirem o mesmo número de pontos de classificação — quatro ou cinco se ponto de bónus — ficarão empatadas e Fiji terá o seu último jogo contra Portugal para garantir o acesso aos quartos-de-final. Mas as coisas não são tâo interessantes assim. Porque Fiji derrotou a Austrália e assim não precisa sequer de pontuar contra os Lobos para se qualificar. E pode ainda ser menos interessante uma vez que Fiji joga no dia anterior ao jogo entre portugueses e australianos. E sabendo-se do resultado pode dar-se o caso que a Austrália, por causa do 1º factor regulmentar, não tenha qualquer interesse no resultado com Portugal. O que não é decente numa competição com o nível de um campeonato do mundo. E sendo assim, com Fiji e Austrália pontualmente empatadas, o jogo entre Fiji e Portugal pode também transformar-se numa farsa… a Fiji basta aparecer em campo e até fazendo descansar os jogadores que melhor entender. E os espectadores, que pagaram viagens e caros bilhetes, são desrespeitados e desconsiderados. E os jogadores portugueses podem perder uma importante oportunidade de ganho de experiência.


Estes erros por falta de respeito, atenção e consideração não servem ao Rugby e ao seu desenvolvimento. Cito Pep Guardiola: “O desporto não é Desporto quando não existe relação entre esforço e recompensa. Não é Desporto se o sucesso é garantido ou se a derrota não importa.”


(Texto publicado no Público a 27 de Setembro de 2023)

quinta-feira, 28 de setembro de 2023

QUARTA JORNADA




Na 4ª Jornada começam a aparecer as necessidades de recurso aos regulamentos de desempates. No jogo já realizado, o Uruguai-Namíbia com resultado favorável ao Uruguay, definiu a situação dos africanos que terminaram o seu Mundial na última posição do Grupo A. Neste mesmo grupo a Nova Zelândia para continuar na perspectiva do acesso aos quartos-de-final terá que vencer a Itália com um ponto de bónus para, por via do desempate, se colocar sem mais delongas no 2º lugar do grupo.
No Grupo da “Morte”, o Grupo B, ainda falta um Irlanda-Escócia para decidir das coisas, enquanto que no Grupo C o Fiji-Geórgia irá concerteza clarificar as posições.
Mas nestas coisas de desempates a World Rugby decidiu, esquecendo-se que cada grupo tinha um número ímpar de equipas e que, portanto, haveria sempre uma equipa que terminaria a sua participação na fase de qualificação mais cedo que as outras. E que pode acontecer? Veja-se o Grupo C onde vamos admitir como reais os resultados previstos: Fiji ganha à Geórgia sem ponto de bónus e ficará com 10 pontos; a Austrália ganha a Portugal também sem ponto de bónus e ficará com os mesmos 10 pontos — se ambos conseguirem ponto de bónus, a pontuação será de 11 pontos. E falta ainda um jogo a Fiji contra Portugal e Gales, já qualificado, jogará contra a Geórgia e não vai precisar da vitória, basta-lhe jogar. Logo aqui há uma vantagem para a Austrália que jogará conhecedora do resultado dos seus adversários directos…
Mas de acordo com o regulamento o 1º factor de desempate diz respeito ao resultado entre as duas equipas empatadas — o que estabelece o disparate do mesmo jogo contar duas vezes; uma para os pontos de classificação e outra para o desempate. Então o que sucederá é que Fiji, quando jogar contra Portugal e por já ter vencido a Austrália, só tem que se apresentar em campo, podendo até fazer descansar, sem qualquer risco, os jogadores que entender... E como australianos e portugueses já saberão o resultado de fijianos quando iniciarem o seu confronto, o jogo pode também não contar para coisa alguma — o que destrói o conceito da competição desportiva. Cito Guardiola: “O Desporto não é Desporto quando não existe relação entre o esforço e recompensa. Não é Desporto se o sucesso é garantido ou se a derrota não importa.” E um Mundial não é um encontro para acabar no bar com umas cervejas… e com estes regulamentos e com a forma como se formaram os grupos (vejam-se os Grupos C e D com equipas da mesma região a proporcionar um conflito de interesses), parece. Respeito e atenção, senhores da World Rugby, exige-se.
(Um post sobre o Austrália-Portugal será publicado quando a constituição das equipa estiver anunciada)

quarta-feira, 27 de setembro de 2023

TERCEIRA JORNADA

Uma diferença média entre resultados previstos e reais de 11 pontos de jogo
 
A realização da 3ª jornada do Mundial 2023 terá tido a sua maior surpresa no empate entre a Geórgia e Portugal uma vez que a diferença prevista era de 11 pontos favorável da Geórgia e tendo o resultado final tido uma diferença nula. Portanto e de acordo com a situação de partida, o resultado foi bom — apesar de poder ter sido, sem as desatenções havidas, muito melhor — para Portugal e mau para a Geórgia que acabou por descer um lugar no ranking. Portugal, não subindo teve, no entanto, um ganho em pontos que o aproxima do 15º classificado, o Tonga, que foi derrotado pela Escócia numa relação de ensaios de 7-2. 

A França — que teve na lesão de Dupont uma péssima surpresa — e a Inglaterra fizeram os melhores resultados da jornada, marcando, respectivamente, 14 e 11 ensaios sem sofrerem qualquer ponto e garantindo pontos de bónus que as colocam, praticamente e desde já, nos quartos-de-final. No Grupo A, se a França está praticamente apurada, a outra decisão diz respeito ao resultado do próximo Nova Zelândia-Itália. 

A Argentina, Grupo D, de quem se esperava uma melhor prestação, está em luta pelo 2º lugar com o Japão e Samoa e, no Grupo C — grupo de Portugal — Gales, que teve uma vitória retumbante por 40-6 sobre a Austrália (embora apenas com 3 ensaios contra nenhum australiano) e que, de novo, mostrou uma organização defensiva notável com 124 placagens (17 à conta do asa e capitão Jac Morgan) e com o substituto do lesionado Dan Biggar, Gareth Anscombe a marcar 23 (1 transformação, 6 penalidades e 1 ressalto) dos 40 pontos galeses, já garantiu a qualificação enquanto que os derrotados australianos e ao contrário do que se ou-viu em meios da comunicação social portuguesa, têm ainda matematicamente a possibilidade — difícil, muito difícil — de garantir a qualificação para os quartos-de-final.

No entanto o grande jogo do fim‑de‑semana foi entre a África do Sul, actual campeã mundial, e a Irlanda, actual primeira classificada do ranking da World Rugby. A intensidade foi tal que cansava só de ver e a África do Sul  mostrou de novo e com os seus 383 metros conquistados contra 218 dos irlandeses as maiores dificuldades atacantes, disciplinares (11 penalidades) e na incapacidade de chutar eficazmente aos postes. Mesmo obrigando a Irlanda a disponibilizar a bola nos rucks nuns mais lentos 3,09 segundos — o melhor resultado é atribuído à Itália com 2,72 segundos — a África do Sul não foi capaz de bater a muito bem organizada equipa irlandesa que mostrou bem porque é a líder do ranking e que as suas pretensões ao título mundial são perfeitamente justificadas. E o próximo Irlanda-Escócia ganha uma enorme expectativa.

Quanto ao Geórgia-Portugal de má memória, já coloquei anteriormente um post (clicar aqui) com a minha análise.


segunda-feira, 25 de setembro de 2023

VITÓRIA DEITADA FORA

Num estádio cheio — Stadium de Toulouse — os Lobos conseguiram, perante uma enorme parte do público a apoiá-los veementemente, um bom resultado com o empate de 18-18 (o 4º de 26 jogos com 18 vitórias georgianas e 4 portuguesas) quando as perspectivas davam uma diferença de 11 pontos favoráveis à Geórgia. Mas soube a pouco, a muito pouco até…porque a vitória esteve lá, à mão de semear, até ao minuto final, mas… e como os jogadores mereciam esta vitória. Pela atitude, pela determinação, pelo empenho e pela adaptação conseguida. Pena foi que…


O jogo teve duas partes distintas. Na primeira, o domínio da Geórgia foi absoluto — 67% de posse, 78% de território com um ensaio marcado aos 3 minutos (e mais 2 anulados por muito pouco) — com os portugueses a jogarem muito mal ao pé e a cometerem vários erros mas a conseguirem aguentar-se em defesa e impedindo o descalabro que, face ao que se via, se começou a temer. Mas marcando também um ensaio aos 35’ a aumentar a confiança nas suas possibilidades, a 1ª parte terminou com 13-5 favorável à Geórgia sempre com o incansável público a puxar pelos Lobos num belo espectáculo das bancadas — houve holás!

Na 2ª parte tudo mudou e Portugal conseguiu inverter os dados (62% de posse e 52% de território) marcando, depois de transformar 2 penalidades por Samuel Marques, um ensaio aos 57’ de novo por Rafaelle Storti e os Lobos passavam, com 13-18, para a frente do marcador. E assim se mantiveram, numa permanente incerteza de acelerar o coração, até aos 78’, altura em que um fucking-rucking-maul georgiano, depois de uma falta estúpida, despropositada e escusada que permitiu colocar o alinhamento a 5 metros da linha de ensaio portuguesa, conseguiu o ensaio para chegar ao empate de 18-18. Um verdadeiro pontapé no peito!

Pontapé no peito que seria desnecessário porque com a vantagem de 5 pontos a partir dos 57’, a vitória, desde que houvesse a estratégia adequada, estava ali. Ali mesmo à mão!

Na 2ª parte os georgianos não foram capazes, por erro conceptual, de se mostrarem perigosos. Isto é, os georgianos procuraram de novo impôr a sua força como tinham feito na 1ª parte. Mas com um erro monumental: nunca conquistando território suficiente para se posicionarem na área-de-22 portuguesa. Ou seja e com medo — questão táctica trazida do balneário — do nosso três-de-trás, esqueceram-se de chutar e permitiram que os Lobos tivessem, nas suas costas, terreno suficiente para poderem adaptar e desmultiplicar a sua defesa. E os georgianos continuavam obcecadamente a tentar romper a defesa portuguesa no 1º canal nem tendo reparado que Jerónimo Portela estava a defender na posição de 2º centro. E sem sentir o perigo de ter que defender na proximidade da própria linha-de-ensaio, os portugueses seguravam o jogo e procuravam uma oportunidade de recuperação para o lançamento dos ataques desorganizados de que tanto gostam e onde são bem eficazes.

Mas o jogo pedia mais inteligência táctica. Coisa a que o banco se manteve alheio.

Primeiro substituindo Samuel Marques aos 73’ num erro  — não se percebeu que tivesse sido por lesão — brutal ao lançar nos últimos minutos de jogo um novo jogador que estava fora do conhecimento dos pormenores que o jogo havia já determinado e que, portanto, seria, como foi, o primeiro passo para o desastre. Falta e penalidade por desatenção, por desfoque e jogo empatado com vitória a fugir e o empate a chegar.

Em segundo lugar, não houve ordens ou chamadas de atenção — e dentro do campo ninguém se lembrou provavelmente porque não foram treinadas situações para o fazer (o que depois do que se viu com o inglês Ford é um erro, no mínimo, de concepção) — para a realização de pontapés-de-ressalto que colocassem o resultado com a diferença vitoriosa de 8 pontos. Atrás de um português, antigo jogador e que jogou em França, estava Didier Camberabero — o notável abertura internacional francês — e que, contou-me, lhe perguntava: pourquoi pas un drop? Il faut essayer le drop. Que grau de risco haveria? Praticamente nenhum: ressalto falhado, pontapés-de-22 do adversário com entrega de bola — a que podia seguir-se nova e nova tentativa…

E, no caso da penalidade da última — ponteiro nos 80 minutos — oportunidade, que estava localizada no lado direito do campo e próximo da lateral, não devia ter sido escolhido o excelente Nuno Sousa Guedes, pelo facto de que áquela distância e naquela localização, ser preferível um canhoto para que a curva da trajectória fosse favorável — e o canhoto com hábitos de chutador, estava dentro do campo: era o Jerónimo Portela. A responsabilidade do último pontapé deveria ter-lhe sido entregue.

O empate, sendo um bom resultado e permitindo os dois primeiros  pontos na classificação de um Mundial, deixou aos espectadores e principalmente aos jogadores — com um Madeira com 18 placagens, um Pedro Bettencourt e Nicolas Martins seleccionados pelo Midi Olympique para o XV de la Semaine, Jerónimo Portela considerado o Homem do Jogo e um Raffelle Storti que marcou — notável proeza — dois ensaios com 123 metros conquistados, um enorme amârgo de boca. Foi um resultado curto que tinha todas as possibilidades de o não ser. A vitória estava à porta e foi deitada fora —  tenho pena de o ter que escrever — por diversas negligências e desatenções táctico-estratégicas… 

Ou seja: perdeu-se um jogo que estava ganho por falta de inteligência táctica que não permitiu evitar os erros que deitaram fora a vitória. E em vez da satisfação, fica-nos a decepção. Os jogadores não mereciam!

sábado, 23 de setembro de 2023

UMA OPORTUNIDADE?

O segundo jogo de Os Lobos no mundial é contra um adversário bem seu conhecido, do mesmo tiers 2 e com o qual já jogámos muitas vezes. É, portanto e dado o posicionamento próximo das duas equipas, um jogo em que Portugal pode vencer. Mas, não tenhámos ilusões, nunca será uma vitória fácil sem derrame de sangue, suor e lágrimas embora, como se pode ver no quadro “Comparação de Capacidades”, os resultados anteriores permitam pensar em possíveis equilíbrios — mesmo se devemos ter em conta que estas comparações se fazem sobre adversários diferentes e com pesos desiguais sobre os valores, mas, para comparar, é o que temos. Do quadro sobressai inequivocamente — mesmo sendo os pesos dos blocos muito aproximados (891 para a Geórgia e 875 para Portugal) — a maior vulnerabilidade dos Lobos: a formação-ordenada. E essas debilidades são tão reconhecidas que Portugal constituiu o seu banco na combinação 6-2, isto é seis avançados para poder substituir um cinco-da-frente quando o ar começar a faltar.

Uma média superior mas um problema grave salta das formações-ordenadas

Mas este factor — desgastando a nossa terceira-linha obrigada a manter-se na formação e depois a ter que deslocar-se mais depressa quer no apoio defensivo quer no atacante — não será o único que define as diferenças competitivas dos dois quinzes. 


Há mais factores a caracterizar as diferenças das equipas. Veja-se a coesão colectiva, esse elemento determinante a enfrentar e que é factor decisivo no sucesso de uma equipa. E nesse domínio os dados são muito favoráveis à Geórgia que tem uma predominância quase total de jogadores nascidos e iniciados na Geórgia e que somam aos 16 membros da franquia Black Lions que ganhou a Super Cup europeia,10 jogadores que jogam em França em equipas do Top14, um no Exeter de Inglaterra, 6 na PRO D2, não tendo ninguém a jogar nas divisões mais baixas. Pelo contrário, Portugal tem no seu grupo de 33 jogadores e para além de 16 membros de 6 clubes nacionais, 10 jogadores que nasceram e foram formados em França numa outra cultura de aprendizagem e com apenas 2 a terem experiência do TOP14 a que se juntam outros 2 da PRO D2 com os restantes 4 a jogarem em divisões inferiores. Ora esta composição dificulta em muito o factor coesão da equipa: não falam a mesma língua e não têm os mesmos hábitos culturais ou sociais e, normalmente, uma diferente filosofia de jogo. Fazer que ajam da mesma maneira, que tomem as mesmas decisões, leiam uniformemente os momentos do jogo é um enorme trabalho que exije muito jogo para além de muito treino até que tudo entre no mesmo carril de eficácia.



Esta experiência de mais elevado nível traduzida em 818 internacionalizações contra 437 dos jogadores portugueses, exigirá uma maior capacidade — superior à habitual — dos jogadores portugueses que, para poderem desenvolver o seu jogo ao largo, terão que garantir boas bolas e suficientemente rápidas e que a terceira-linha seja um apoio seguritário permanente. O que significa que têm que se libertar das formações-ordenadas em tempo útil — veja-se o esforço que se exige ao cinco-da-frente. Por outro lado a libertação da bola em tempo mínimo no jogo-no-chão é essencial para surpreender a defesa adversária — o que exige uma enorme ligação e compreensão por parte dos apoiantes. Por outro lado e para que o ataque funcione quando parte em igualdade numérica é preciso que a bola seja captada em movimento e com a linha tão próxima quanto posível da linha-de-vantagem.


O algoritmo do XV contra XV estabelece para o jogo uma diferença de 11 pontos favorável à Geórgia. O que significa que, sendo favorita, a Geórgia não é, no entanto, uma vencedora antecipada e Portugal pode ter a sua oportunidade se conseguir jogar a um nível muito elevado e suportar a intensidade. A questão-chave estará portanto na capacidade de adaptação que os jogadores portugueses mostrem.


Mas a exigência não pode estar na obrigatoriedade da vitória. Aparentemente idênticas as duas equipas têm no entanto um enorme modelo de organização competitiva a separá-las. São equipas que se formam e traduzem mundos conceptuais diferentes. E a vantagem pertence à Geórgia.             



sexta-feira, 22 de setembro de 2023

INCERTA MAS POSSÍVEL


O jogo de Portugal da 3ª jornada do Mundial é do nosso campeonato não havendo, para além dos problemas que o jogo impõe, a diferença do embate com o superior Tiers 1. É um jogo entre equipas que estão próximas (13º e 16º lugares do ranking WR), que se conhecem há muitos anos e que estão classificativamente empatadas.


O que se pede então ao quinze de Os Lobos? O de sempre a quem inverga a camisola de Portugal: atitude, desportivismo, vontade do melhor resultado possível nunca desistindo de o conseguir. Podemos ganhar? Podemos. Mas não é uma obrigação.


Para já o algoritmo que uso para a previsão do resultado, estabelece uma vitória da Geórgia por 11 pontos de diferença. O que é natural dados os resultados que temos conseguido depois do retorno ao Rugby Europe Championship: 4 derrotas e 1 empate. 


Mas se vencer pode ser uma possibilidade, não é uma exigência. E não pode ser uma exigência porque os jogadores portugueses para garantir uma prestação que os e nos orgulhe terão de estar no máximo das suas capacidades físicas, técnicas e mentais durante os oitenta minutos. O que não é fácil, sendo a igualdade competitiva entre as duas equipas, passe a expressão, desigual. 


Porque mesmo estando habituados a este adversário, os portugueses enfrentarão enormes dificuldades por melhor que possam usar o seu jogo ao largo e que haja uma melhoria — haverá porque o nível é mais próximo dos nossos hábitos — na eficácia do apoio e que o ataque se inicie com os jogadores lançados e próximos da linha-de-vantagem para não dar espaço/tempo organizativo à defesa, 


Mas as dificuldades — é bom tê-lo presente e não ter expectativas que ultrapassem a realidade — serão muitas, começando logo no bloco de avançados onde o grupo georgiano tem um forte poder já muitas vezes testado e as formações-ordenadas serão a dificuldade acrescida. Pelo contrário, os alinhamentos e pelo que se viu contra Gales, poderão ser uma boa base de lançamento. Mas para o movimento e manobras pretendidos a boa utilização do jogo no chão com rapidez e organização será o factor-chave. 


Provavelmente e embora já se mostrem mais capazes de dar continuidade ao jogo de movimento, os georgianos voltarão à velha escola — que por acaso está a ser utilizada pelas 4 equipas favoritas — com formação-ordenada de grande pressão e desgaste a limitar as capacidades defensivas da 3ª-linha — e aqui espera-se que o árbitro controle o início do empurrão georgiano… — jogo-ao-pé alto sufocante e defesa muito rápida a não dar espaço de expressão ao potencial das linhas atrasadas portuguesas.


E se assim fôr, a maior experiência no nível elevado do jogo dos georgianos pode dar-lhes a vantagem definitiva. Porque na composição dos 33 membros da equipa existem, para além de 16 jogadores da franquia Black Lions vencedora da Super Cup europeia, 10 jogadores de 7 clubes do TOP 14, 1 do Exeter inglês e 6 a jogar em 4 clubes da PRO D2. E os representantes portugueses de 20 clubes, sendo 10 não nascidos em Portugal, têm, naturalmente e embora os últimos três meses tenham podido melhorá-la, um menor grau de coesão colectiva.


E estas diferenças — de experiência e de coesão — contam nos momentos decisivos e na eficácia ds acções que fazem a diferença no resultado.


No entanto e embora partindo de bases e condições distintas e inferiores, Os Lobos podem — desta vez sim! — surpreender e conseguir a vitória que premiará a atitude guerreira de defesa da camisola que orgulhosamente envergam. Sem vos exigir nada, estaremos presentes no apoio e aplauso que merecem. Bom jogo!


quinta-feira, 21 de setembro de 2023

QUATRO FINAIS


 A 3ª jornada do Mundial apresenta, para além do jogo que nos importa, o Geórgia-Portugal, mais outros dois jogos de grande equilíbrio e interesse como o África do Sul-Irlanda e o Gales-Austrália. Podendo ainda chamar-se a atenção para o Argentina-Samoa — vitória de Samoa e a Argentina pode não conseguir nenhum dos 3 lugares com que sonhou.

Do Portugal-Geórgia — jogo que Os Lobos podem, sem lhes dever ser exigido, vencer — terei post publicado sexta-feira. Mas não será um jogo nada fácil com o poderio físico habitual dos georgianos e que terão na formação-ordenada o ponto fulcral para desenvolver o seu jogo.

No África do Sul-Irlanda os sul-africanos tentararão na fisicalidade com colisões sucessivas a partir de picks-and-goes retirar todas as capacidades criativas irlandesas. E para isso vão utilizar o sistema 7-1 nos suplentes do banco — 6 avançados (com um 5-da-frente substituto) e 1 médio-de-formação. Kwagga Smith, o asa e jogador de sevens da selecção Springbok, será o suplente que, em caso de necessidade, será chamado a substituir um linha-atrasadas. Quanto à Irlanda usará a sua capacidade de movimento para desgastar o bloco de avançados adversário — esta deve ser a razão principal do risco do 7-1 sul-africano, poder substituir os desgastados avançados e manter o pretendido jogo pressionante — a que juntará um jogo-ao-pé profundo que obrigue a equipa springbok a  recuar e, porque não vão tentar o ataque em jogo-de-passes — recorrerão ao jogo-ao-pé que, no ping-pong que costuma seguir-se, pode permitir contra-ataques que apanhem a defesa desorganizada no seu posicionamento no tereno.

No Grupo C —  o grupo de Portugal — e no Gales-Austrália joga-se, depois da vitória de Fiji sobre a Austrália — a possibilidade de acesso australiano aos quartos-de-final do Mundial. Ganhando Gales, a Austrália ficará afastada dos quartos-de-final e, na melhor das hipóteses, conseguirá o lugar que lhe garantirá aquilo que já tem: presença no Mundial de 2027 na Austrália… Perdendo Gales, entrará na zona da dependência e tudo se jogará nna combinação final dos pontos — de bónus e de jogo. Portanto o jogo será uma disputa sem prisioneiros — nenhuma das equipas quererá perder…

…que fim-de-semana

terça-feira, 19 de setembro de 2023

UMA VITÓRIA DESPERDIÇADA?

 UMA VITÓRIA DESPERDIÇADA?

Na abertura do seu Mundial, Portugal fez um bom resultado — derrota por diferença menor (20 pontos) do que o então posicionamento de ambas as equipas no ranking mundial propõe (24 pontos) — contra a equipa de Gales que apesar de uns últimos resultados pouco de acordo com o seu historial de pertença, desde sempre, ao melhor cinco europeu, continua a ser formada por jogadores habituados a um nível competitivo onde a intensidade faz regra e a adaptação à rapidez de movimentos obriga ao desenvolvimento de gestos técnicos eficazes. E estes jogadores galeses, apesar de se mostrarem, como é natural porque, como equipa, não se conhecem fora dos treinos, um colectivo falho de boas soluções, possuem no entanto uma experiência muito superior à dos jogadores que formam a equipa portuguesa — enquanto todos os jogadores galeses jogam nas divisões mais elevadas, os jogadores que jogam na equipa portuguesa são limitados a um campeonato nacional português sem nível competitivo capaz (16 jogadores) e os que jogam em França — tirando Madjer e Samuel Marques que já jogaram no Top14 —  jogam na 2ª(11), 3ª(2), 4ª(1) e até na 5ª (1) divisões francesas. O que significa que não são peças do mesmo mundo.


O resultado, a atitude e a exibição dos Lobos terá assim — essa estória de que iríamos ganhar aos galeses não tinha, como não tem, qualquer sustentação e não passa de uma fabulação sobre uma realidade inexistente — que ser positivamente considerada: mostramos, apesar das diversas inconsistências, saber jogar— o ensaio de Nicolas Martins depois de uma captação olímpica e um passe magistral a uma mão com desvio enganoso do olhar de Rafael Simões, é de enorme categoria numa manobra muito bem combinada (vai ser “roubada” por outras equipas…). Mas não nos podemos colocar em patamares que estão muito longe da nossa realidade. Porque o nosso mundo —o que torna a prestação dos jogadores portugueses ainda mais valiosa — está noutro lugar. E para o perceber basta ver onde jogam, domingo a domingo.


Tudo correu bem?! Fora do faz-de-conta das aparências, não! Muita coisa está ainda longe de estar afinada e no seu devido lugar, faltando ainda muita construção e alterações conceptuais. Mas há melhorias: menos colisão e mais manobra mas ainda sem a capacidade de penetração desejável — apenas 53 ultrapassagens da linha-de-vantagem contra 90 dos adversários e, por isso a diferença entre os 373 metros de transporte da bola contra os 636 dos galeses — porque falta à equipa a coesão do apoio. E se melhorámos muito nos alinhamentos com 12 conquistas em 13 lançamentos e 2 “roubos”, já a formação-ordenada, pese a entrega e esforço dos nossos Francisco Fernandes, Mike Tadjer e Anthony Alves, tem ainda muito que melhorar e o Força 8 que anda por aí ao dependuro tem que ser retomado — preparando os necessários substitutos. Naturalmente que fizemos mais placagens (156) do que os galeses (112) mas fomos menos eficazes: 76% contra 78%. 


E tudo isto justifica o resultado final que espelha a realidade da diferença das duas equipas: 4 ensaios a 1.


Para podermos competir a este nível ainda nos falta muito. A começar por um campeonato interno suficientemente competitivo que possa habituar os jogadores a um nível elevado que lhes proporcione experiência em equipas estrangeiras de primeira categoria. Então sim, estaremos em pé de igualdade e poderemos exigir resultados contra as grandes equipas. Até lá… 

(publicado no Público on-line de 19 de Setembro de 2023) 

segunda-feira, 18 de setembro de 2023

BOM RESULTADO E BOA ATITUDE

Os Lobos fizeram contra o País de Gales e na sua estreia mundial um bom resultado. Perder contra uma das grandes é um resultado normal e se o normal estaria em perder, de acordo com o algoritmo utilizado pelo XVContraXV, por uma diferença de 24 pontos (veja aqui), terminar com uma diferença de 20 pontos, é bom. Significa atitude, combate, determinação. Mas não autoriza a tomar a nuvem por Juno.


Que estivemos em cima deles e que se não falhássemos as penalidades e até um ensaio, o resultado poderia ser outro. Sim, se tudo fosse assim com essa facilidade e se tudo fosse linear e não houvesse reacções. Veja-se o gráfico acima e perceba-se que se nos alinhamentos estivemos muito bem (92,3% de conquista), já nas formações-ordenadas o desgaste foi grande para além dos livres sofridos, nas placagens sofremos o desgaste do volume de 183 para acertar 156 numa taxa de sucesso de 76% contra o menor esforço galês (126 placagens) mas com o maior sucesso de 78%, veremos que nos domínios decisivos fomos inferiores — 373 metros de transporte da bola contra 636 dos galeses, 53 ultrapassagens da linha-de-vantagem contra 90 do adversário. Por isso — e não por azares que, aliás, sempre acontecem quando a pressão aumenta e ultrapassa os nossos hábitos competitivos —terminámos o jogo a perder por 4-1 em ensaios

Em alguns momentos a equipa não esteve mal produziu acções interessantes e não foi um qualquer entusiasmo levado longe demais que fez somar erros mas sim a falta de hábito competitivo deste nível que nos impôs a dificuldade de ultrapassar a linha-de-vantagem e assim não foi possível encadear para colocar dificuldades a um adversário  que, embora se conheça colectivamente apenas de treinos, é constituído por jogadores habituados a níveis de intensidade e pressão muito superiores aos dos nossos jogadores, incluindo aqueles que jogam em França onde só Tadjer jogou na época passada no TOP14. Por essa realidade ainda é só aparente a possibilidade de um resultado inverso. E não vale a pena chover no molhado mas sim reagir, percebendo as adaptações necessárias para o elevado nível em que nos encontramos. Até porque a atitude combativa dos Lobos, devendo ser salientada, foi exemplar.

São normais os erros cometidos. Porque os mundos de vivência e hábitos são diferentes. 
Mas gostei de Nicolas Martins e Rafael Simões e considero formidável o ensaio do alinhamento — a captação de Rafael Simões é de uma limpidez olímpica e, feito no ar, o passe a uma mão com torsão do pulso e ainda o disfarce de não olhar para o receptor para entregar, num offload aéreo, a bola a Nicolas Martins, foi excepcional. De verdadeira categoria. Ali ou em qualquer outro estádio do mundo. E Nicolas com as suas 18 placagens e os 47 metros de transporte de bola mereceu, pelo que tem demonstrado também noutros jogos, o primeiro ensaio lobo deste Mundial.

Mas tudo terminou da pior maneira com a expulsão de Vicent Pinto que, negligentemente, acertou com um pé na cara de Josh Adams — e não vale a pena introduzir qualquer estória sobre o caso. Intencionalmente ou não, não é isso que está em causa no julgamento mas sim a consequência da acção. E a consequência foi um pontapé na cabeça do adversário que está lá e não caiu do céu e a preocupação evidente da salvaguarda da integridade física dos jogadores não encontra, na forma como a acção se desenrolou, qualquer mitigação e tem o cartão vermelho como resultado lógico. 

Do jogo, lições suficientes se podem tirar para que a evolução da equipa seja uma realidade. Sem procurar que os azares sirvam de desculpa para os erros cometidos que são reais e têm reais causas. Avancemos, portanto.


Esta segunda jornada mundial foi quase totalmente de resultados previsíveis, tendo alguns aumentado ainda o desequilíbrio já previsto. A excepção foi dada por Fiji que nos ofereceu a surpresa de uma vitória sobre os australianos e criando assim no Grupo C — grupo ao qual Portugal pertence —  um aumento de intensidade e de dificuldades em que, para além da vitória, os pontos de bónus vão ser essenciais para a classificação final, formando, juntamente com o Grupo B, um novo “grupo da morte” onde os próximos jogos não permitirão descansos. Estamos num Mundial…





sábado, 16 de setembro de 2023

GALES-PORTUGAL: O QUÊ E COMO?

 

A compacticidade — distribuição do peso pela altura — comparativa entre os dois quinzes mostra uma proximidade grande — uma diferença distribuída de 3 pontos. Ou seja, aparentemente não haverá um domínio físico directo da equipa galesa sobre os Lobos, embora se deva chamar a atenção para a diferença favorável a Gales do núcleo bases/terceira-linha. O que pode ser significativo na realização das manobras atacantes ou defensivas.

Quer no peso global do Bloco de Avançados, quer na Média de Idades, os valores são próximos e não parecem estabelecer diferenças substanciais. No entanto se olharmos para o somatório das Internacionalizações — factor que indicará experiência, o tal domínio que Duarte Pacheco Pereira, já no século XVI, avisava que, “sendo a madre das cousas, nos desengana e de todas as dúvidas nos tira” — e embora os números apenas estabeleçam uma diferença média próxima de 10, a diferença no “desengano” é gritante, porque são conseguidas em níveis muito diferentes de participação. Ou seja cada internacionalização de um galês produz hábitos de jogo que as internacionalizações portuguesas não conseguem atingir. Daí que haja uma diferenciação de hábitos competitivos que tenderão a fazer a diferença nos momentos decisivos. E aí a vantagem galesa, na capacidade de encarar, decidir e executar nos momentos críticos com que são confrontados durante um jogo, é evidente. Ou seja, a equipa galesa, mesmo com a mudança de 13 jogadores, tem um nível de experiência que a coloca num plano responsavelmente favorito para o jogo de hoje. 


O mesmo problema de níveis diferentes se coloca na comparação de capacidades entre as duas equipas. Aparentemente só nas formações-ordenadas haverá diferença favorável a Gales mas, lembre-se, que os valores utilizados são retirados de jogos com adversários muito diferentes no seu nível competitivo, falhando assim o rigor da comparação — mas não deixa de ser avisado levar em conta as dificuldades que surgirão na realização das formações-ordenadas.

A este problema das capacidades directas entre as duas equipas há ainda a juntar o nível das idades das primeiras-linhas em confronto. E a pergunta surge: conseguirá a primeira-linha portuguesa com os seus 37-34-34 anos ser capaz de garantir o nível competitivo exígivel neste domínio de intensidade mundialista. E durante quanto tempo? Há solução para o problema? Nesta altura, depois de tomadas as decisões de treino e de escolha, as soluções não ultrapassam, por um lado, o factor da substituição em tempo estrategicamente adequado — o que exige uma leitura e visão do jogo muito objectiva e atenta aos sinais reveladores de dificuldades (e os combatentes da 1ª linha, disfarçam muito bem as suas dificuldades)  — e, por outro, com a diminuição do número total de formações-ordenadas, aumentando a atenção técnica — mas que nada nos permite de intervenção no caso da responsabilidade do adversário. Veremos qual o grau que o problema poderá atingir e que consequências daí resultarão para os Lobos e para o resultado final.

De acordo com o algoritmo que tem base no historial de resultados de cada equipa, o resultado normal entre estas duas equipas estabelece uma diferença de 24 pontos favorável a Gales (ver aqui). O que significa que qualquer resultado de Portugal que estabeleça uma diferença menor do que a referida, significará um resultado classificado de bom a óptimo consoante a menor diferença. 

sexta-feira, 15 de setembro de 2023

ENTRADA DOS LOBOS EM CAMPO

Esta segunda jornada da fase de grupos do Mundial — embora não seja a designação correcta é fácil e compreensível — define-se na sua maioria por jogos de vencedor antecipado mas tem dois momentos especiais: a estreia dos Lobos e, noutro jogo do nosso grupo C, um Austrália-Fiji que terá muita importância na definição dos dois apurados para a fase seguinte.

A estreia de Portugal será um grande momento para todos nós, esperando que os Lobos consigam — num jogo muito difícil — mostrar as qualidades das suas capacidades e o conhecimento que têm do jogo. Qualquer resultado, mesmo derrota, com uma diferença inferior a 24 pontos — resultado normal qualifica a a presença portuguesa de boa a óptima de acordo com a diferença real. 


Ranking da World Rugby - Grupo C, Mundial 2023

Fonte: Pierre Breteau, 6/Set/2023, Le Monde (adaptado)

O quinze do País de Gales que andou malzote com 8 derrotas nos últimos dez jogos, mostrou — apesar de um nítido favorecimento do árbitro que, perdendo o critério, não puniu as faltas feitas por galeses na proximidade da sua linha de ensaio — uma capacidade defensiva notável com 253 placagem realizadas — não me lembro de ter visto a execução de um tão elevado número — e tendo no seu base, Will Rowlands, com 27 placagens, no seu talonador Gareth Thomas com 23 e no seu asa e capitão, Jack Morgan, os melhores placadores do Mundial até ao momento. Por aqui se poderá perceber que e para além da necessidade de adaptação a uma intensidade a que não estão habituados, o avanço português não pode ser realizado pelo conhecido pick-and-go (agarra-e-avança) nos corredores próximos dos reagrupamentos mas pela tentativa de quebra da linha defensiva mais ao largo e para o qual temos jogadores com o talento necessário para o fazer. Desde que a equipa seja capaz de realizar a táctica de manobrar antes de colidir como mandava, já no sec. XV o nosso Nun’Álvares Pereira. Fundamental será também um jogo-ao-pé que nos coloque o jogo no meio-campo adversário porque, com a capacidade de penetração do meio-campo galês, a última coisa que podemos pretender é jogar próximo da nossa linha. 


E não contemos com “favores” galeses, mesmo se as 13 substituições realizadas possam mostrar uma aparência de desinteresse e levar este jogo com menos rigor por se tratar de um embate entre duas equipas separadas por 8 lugares do ranking correspondentes a uma diferença de 12,05 pontos e que, por isso, não dará pontos pela vitória galesa mas dará 4 ou 5 pontos para a classificação do grupo… E Gales quer marcar quatro ensaios para garantir o ponto de bónus que lhe facilitará o acesso aos quartos. E para perceber o empenho basta lembrar o raspanete que Dan Biggar deu a George North por este ter corrido um risco negligente e inutil junto à sua área de ensaio. Os galeses vieram para o Mundial focados num óbvio objectivo: classificar-se, no mínimo, para os quartos-de-final. E depois da muito suada vitória sobre Fiji, não vão deixar ir água abaixo um jogo em que são nitidamente favoritos. Para além da disciplina táctica que um jogo altamente escrutinado exige, dos Lobos espera-se o habitual: honrar a camisola que envergam na representação que fazem de todos nós, deixando-a sempre em melhor posição do que a receberam.


No outro jogo do grupo C, se os fijianos jogam as suas esperanças de acesso aos quartos-de-final, os australianos precisam da vitória para encarar o jogo contra o País de Gales sem peso excessivo nos ombros. Porque nisto de jogos mundialistas — não havendo jogos que se considerem sem importância — o mental é decisivo para construir a coesão colectiva que abre as hipóteses de vitória. Portanto, num jogo que pode ser muito interessante — como o foi já o anterior da participação figiana os australianos têm que encontrar as soluções necessárias para garantir a vitória. E lembre-se que a Austrália já foi campeão mundial e já deu grandes contributos para o desenvolvimento do jogo. E o Austrália-Fiji, deste próximo domingo, vai ser um jogo muito interessante que terá como maior motivo de interesse a verificação das adaptações necessárias que cada equipa fará para explorar detectados pontos fracos do adversário.


quinta-feira, 14 de setembro de 2023

O BUNKER E O VERMELHO

 A World Rugby com a introdução do designado bunker deu um importante passo nas garantias securitárias, no controlo comportamental, na diminuição do tempo de paragem e na justeza da observação do real comportamento do jogador. Portanto com este recurso ganha o jogo, ganham os jogadores, ganha o árbitro e ganham os espectadores, ficando tudo mais claro sobre, na maior parte das vezes, uma sempre difícil situação.

Este novo conceito consiste em proporcionar um assistente — FPRO, Foul Play Match Official —  junto do já existente TMO — Television Match Official — que tem a função de analisar as imagens sobre jogo perigoso ou desleal a pedido do árbitro, não sendo autorizado a intervir em quaisquer outras situações. Assim cabe ao FPRO comunicar, ao árbitro, árbitros assistentes e TMO a sua decisão sobre a qualificação do cartão amarelo apresentado pelo árbitro — se mantém a qualidade de amarelo com a respectiva penalidade e saída por um período de 10 minutos ou se é elevado a cartão vermelho com saída definitiva do mesmo jogador faltoso. Portanto, no caso do bunker a decisão, por pedido do árbitro, sobre a qualidade do cartão, pertence, na prática, ao FPRO. No entanto a decisão sobre o cartão inicial — que pode ter sido tomada imediatamente pelo árbitro ou após ter sido chamado à atençao pelo TMO  — pertence ao árbitro que pode ou não aceitar a proposta do TMO. 


Fundamentalmente o bunker serve para decidir sobre a existência ou não de mitigação para o acto de jogo perigoso ou desleal a que acabámos de assistir. Para esse efeito o FPRO disporá de oito minutos dos dez que vale a punição do cartão amarelo para tomar a decisão auxiliado pelas imagens que entretanto analisará. Estas imagens não serão mostradas nos ecrãs dos estádios e tão pouco serão vistas pelos telespectadores, uma vez que o jogo continua a decorrer. Não há, portanto, interrupção do jogo e mantèm-se a sua continuidade que só será interrompida para o árbitro informar que existe decisão para aplicação do cartão vermelho.


Hoje em dia a World Rugby está bastante mais atenta às questões que dizem respeito àquilo que consideram como um factor-chave: a integridade física dos jogadores. Preocupando-se fundamentalmente com os choques de cabeça e com as concussões que daí podem resultar. Por isso os contactos de braços, ombros ou cabeça com a cabeça do adversário defensor ou portador da bola são coniderados momentos perigosos e qualificados como jogo desleal (foul play).


No recente Inglaterra-Argentina e logo aos 4 minutos de jogo houve um contacto — uma colisão! — de cabeça com cabeça entre um defensor inglês e um portador da bola argentino. O avanço nessa colisão foi atribuído — e bem — ao terceira-linha inglês, Tom Curry, que recebeu um cartão amarelo, vendo o árbitro indicar que pretendia uma análise mais cuidada da situação. Minutos depois o TMO comunicou ao árbitro que considerava o caso com a gravidade suficiente para exigir a ampliação com atribuição do cartão vermelho. E assim foi, o árbitro comunicou ao capitão de equipa que o jogador tinha sido expulso e que não poderia voltar ao jogo. Uns tempos depois numa placagem do jogador argentino, Santiago Carreras, uma mesma situação por parte do árbitro: cartão amarelo e sinal para o bunker da pretensão de mais cuidada análise. Feita a análise o FPRO comunicou que não seria caso para ampliar a amostragem do cartão inicial. E o jogador argentino, cumpridos os dez minutos do seu castigo, voltou ao jogo.


Este sistema liberta o árbitro da decisão emocional em situações que podem parecer ou ser mesmo piores do que aparentam. Recorrendo ao bunker, ao FPRO, que calmamente — porque não tem outra função procura as imagens que melhor demonstrem e  provem a realidade da situação em causa e então e sem que o jogo tenha sido interrompido e liberto de qualquer tipo de pressão, comunica a sua decisão que o árbitro — que nesta situação delegou a sua autoridade — fará cumprir.


Muito simples e efectivo.

quarta-feira, 13 de setembro de 2023

COMEÇOU A FESTA


A França, embora sem que o jogo fosse muito interessante, embandeirou em arco com a vitória do seu quinze que impôs, em fases de grupo, a primeira derrota aos AllBlacks. Iniciou-se assim a grande festa que se pretende que seja este Mundial. Mas… levando a ideia longe de mais com pós escusados de criatividade, os franceses, ignorando e desrespeitando os momentos únicos que representam para os jogadores internacionais o cantar do seu hino, resolveram inventar e torná-los irreconhecíveis. Uma tristeza!


E esqueceram-se também das lições que já receberam das entradas de multidões nos seus estádios — filas que não andavam a tal ponto que houve milhares de espectadores que não chegaram a ver a expulsão do inglês Tom Curry aos 4 minutos do Inglaterra-Argentina. Felizmente não se pegaram…E os realizadores televisivos esqueceram-se também de mostrar repetições dos lances capazes para além não repararem em erros do marcador. a esperança é que os jogadores não tenham preocupações marketinguditas e nos presenteiem com as suas melhores qualidades rugbisticas e que, verdadeiramente, haja festa até ao fim.


Os jogos tiveram, neste primeiro fim‑de‑semana mundialista, os resultados finais esperados — a vitória, se exceptuarmos a da França, dos mais fortes ao longo dos anos. Alguns dos jogos até com resultados que mostram o desequilíbrio ainda existente entre as oito/dez melhores equipas e as restantes — sobre essa matéria os 82-8 da Irlanda sobre a Roménia ou os 52-8 da Itália sobre a Namíbia, são eloquentes.


O jogo Blues-AllBlacks jogado sob uma terrível temperatura de mais de 30ºC que provocou enorme desgaste nos jogadores, teve dois excelentes ensaios, um para cada equipa, e com o modelo de jogo francês a determinar a sua vitória — 61% de domínio territorial graças ao seu já habitual desapossamento mas onde a incapacidade neozelandesa, com quase o dobro de ultrapassagens da linha-de-vantagem, foi notória. Serve-lhes, para manter a esperança, o facto de o Mundial não se ganhar em Setembro, mas apenas em Outubro — não deixo de recordar o último ensaio francês em que o desgaste de Richie Mo’unga era tal que nem conseguiu saltar para captar a bola, deixando-a ao alcance de Jaminet.


No Austrália-Geórgia equipas adversárias de Portugal no Grupo C nada se deixou antever que não soubessemos já. No entanto faça-se notar que a Geórgia fez 158 placagens com uma percentagem de sucessi de 87%


Com o recurso ao bunker, o Inglaterra-Argentina viu os ingleses a ficarem em inferioridade numérica desde os 4 minutos por cartão vermelho — expulsão — ao asa Tom Curry. E a partir daí viu-se um tratado de competência táctica individual — o que diz bem da sua formação — dos jogadores ingleses. Com menos um jogador durante 66 minutos, tiveram também menor domínio territorial e menor posse da bola, mas ganharam! Fazendo 151 placagens  das quais 51 (é obra!) do seu cinco-da-frente! E George Ford, o seu médio-de-abertura, foi o herói do dia com 3 pontapés de ressalto e 6 penalidades conseguidas, marcando o total dos 27 pontos da sua equipa. Como seria de esperar a Argentina não resistiu à pressão e sofreu 13 penalidades para além de ter visto esbater-se a qualidade da bajadita da sua formação-ordenada, arma que imporia no jogo mas que, na realidade e das 13 realizadas, apenas ganhou quatro…


Com um África do Sul-Escócia de enorme importância para o apuramento neste “grupo da morte”, mas sem grande interesse enquanto jogo jogado, chegámos ao último jogo e do grupo dos Lobos, o País de Gales - Fiji que foi o melhor de todos eles. Um espectáculo! Com oito ensaios — quatro para cada lado —, uma enorme intensidade mas também uma enorme determinação defensiva galesa — 253 placagens!!! — o jogo não deixa grande sossego para a equipa portuguesa. — Fiji transportou a bola 655 metros e ultrapassou 89 vezes a linha-de-vantagem e conseguiu — proeza notável — 2 pontos de bónus; Gales com 39% de posse de bola, marcou 4 ensaios… Note-se que Gales conseguiu, com o talonador Gareth Thomas, o segunda-linha Will Rowlnds, e o asa e capitão Jac Morgan, o número impressionante de 70 placagens. E Fiji, com Viliame Nata e Ilaisa Droasese, 25 corridas. Para os Lobos vai ser um duro e difícil desafio demonstrar que existe qualidade no rugby português.




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