sábado, 30 de junho de 2012

MORREU O ZÉ VARANDAS

Morreu o Zé Varandas, foi assim que recebi, num sms do amigo comum Cesár Pegado, a brutal notícia.

Jogamos um contra o outro diversas vezes. Algumas, no mesmo canal. Demo-nos sempre bem, muito bem mesmo. Apesar da vida nos manter em sítios diferentes - como quando jogávamos - mantínhamos uma boa amizade. As recordações comuns faziam do tempo um intervalo curto. Tinha sido sempre anteontem.

O Varandas era tremendo dentro da campo, era capaz de meter a cabeça onde outros tinham dificuldades em meter os pés e tinha da placagem um conceito de colisão - exigia uma atenção absoluta. E como não se importava nada de placar já fora de tempo (sem exageros mas já depois da bola ir no ar e como aviso - bom truque - para que não jogassemos demasiado em cima da linha defensiva) era preciso uma atenção constante. Redobrada mesmo para evitar colisões de cortar a respiração.

Um dia - lembro-me tão bem - num qualquer jogo para o Nacional, em Coimbra e no secundário do Universitário, eu, pelo CDUL, atacava e ele, pela Académica, defendia. Eu tentava fixar a defesa, procurando passar tão tarde quanto possível e ele, lançado, já filado, queria fazer-me pagar a ousadia numa placagem que daria gargalhadas mais tarde, à volta de uma cerveja. Soltei a bola e, naturalmente e a defender-me, deixei o cotovelo; a cabeça dele bateu-lhe em cheio. Ficou meio sentado, meio deitado, com as mãos a esfregar a cabeça. Então, menino? Que te aconteceu? perguntei-lhe quando me aproximei. ****-se, partiste-me a cabeça... respondeu a olhar-me com o sorriso traquina habitual.

Era um duro mas leal, solidário e amigo. Um jogador de Rugby. Foi sempre bom conviver com ele, foi sempre altura de boas gargalhadas. Guardá-lo-ei no lado bom da minha memória.


terça-feira, 26 de junho de 2012

A ORGANIZAÇÃO DA MUDANÇA

O rugby tem, desde 1995 – ano de introdução do profissionalismo – evoluído muito. Em termos de organização e exigência competitivas, em termos de expressão global. E nesta evolução da expressão global ressalta a cada vez maior importância dos jogos e competições internacionais com janelas, mundiais, taças de isto e daquilo e um ranking feito de regras claras e exactas que garante o posicionamento comparativo entre todos os intervenientes na competição do rugby.

Estas alterações exigiram mudanças. Mudanças que, tendo como objectivo a criação das melhores condições para a competição internacional, criaram competições que ultrapassaram as habituais fronteiras e que permitem que equipas constituídas por um alargado número de melhores jogadores de cada país possam competir a um nível superior às competições nacionais a que anteriormente estavam limitados. E assim nasceram, para além de uma maior incidência de provas internacionais para clubes, as provas de franquias que no Norte e no Sul permitem um maior equilíbrio, uma maior competitividade e um maior interesse público facilitando o retorno financeiro necessário à garantia do nível exigido. E assim se vê a internacionalização dos jogos que envolvem neozelandeses com sul-africanos e australianos, de italianos com galeses, escoceses ou irlandeses para além das diversas ligas profissionais como em França, Inglaterra ou Rússia.

Como é fácil de perceber – basta analisar os resultados dos últimos anos - o actual modelo competitivo português está completamente ultrapassado e não responde, pelo seu absoluto desequilíbrio, às necessidades que se colocam aos jogadores que representam a selecção nacional nas competições internacionais. Ora as necessidades internacionais – aquelas que motivam os apoios necessários ao desenvolvimento interno da modalidade – são cada vez maiores e de maior responsabilidade. O tempo em que uma derrota representava apenas uma contrariedade, acabou: hoje uma derrota inesperada – ou impossível – pode traduzir dificuldades ou mesmo diminuições drásticas no posicionamento financeiro e competitivo. Urge que o rugby português, porque a continuidade da queda do posicionamento internacional terá graves repercussões no desenvolvimento rugbístico interno, mude os seus modelos competitivos e de formação. E quanto antes. A mudança é essencial e deve ser organizada e  globalmente pensada.

A convite do presidente da Federação, Amado da Silva, fiz parte de um grupo externo que se reuniu com a Comissão Técnica federativa e aí pude dar conta do que penso sobre a matéria e das propostas que defendo e que aqui descreverei sucintamente.

A primeira questão que se coloca é: para que serve uma federação de utilidade pública desportiva? Qual a sua Missão? Em minha opinião para criar condições para que os seus jogadores possam competir internacionalmente em condições da mais próxima igualdade competitiva desportiva. E, no caso do Rugby, sob uma Visão exigente: colocar Portugal nos vinte primeiros lugares do Ranking IRB. Missão e Visão que exigem da Federação uma organização técnico-desportiva de grande qualidade e extensível, para ser sustentada, a toda a pirâmide da comunidade do rugby português.

A segunda questão sobre a qual se deve ter resposta será: qual é o propósito de uma Campeonato Nacional? A primeira resposta é óbvia: atribuir o título de campeão nacional. A outra, menos óbvia mas absolutamente necessária para se atingir o grau de exigência pretendido: permitir que os atletas participantes se preparem para o nível competitivo superior com um mínimo de adaptações.

Sabendo que um campeonato desportivo deve reger-se por Princípios como o Equilíbrio – ser disputado por iguais para garantir os níveis de competitividade – como a Consistência – tenha continuidade, mantendo os parâmetros, seja coerente com o conhecimento antecipado das regras e suas consequências e seja consistente nos seus propósitos – como a Equidade – é necessário que exista igualdade de oportunidades alicerçada num projecto de crescimento qualitativo conhecido e sustentado – a questão a resolver trata de definir o modelo competitivo que responderá às questões suscitadas. No essencial: que estratégia seguir para responder aos objectivos propostos?

Uma questão a exigir decisão surge de imediato e a curtíssimo prazo: como articular a presença na Sevens World Series com as necessidades da selecção nacional de XV, existindo em ambos os casos uma exigência, por razões de continuidade, de resultados positivos? Separando absolutamente parece ser a única solução na nossa realidade: um grupo vai disputar os sevens, outro dedica-se ao XV! Duas estruturas independentes, portanto.

Penso que o ideal para o modelo competitivo nacional seria caminhar, tão breve quanto possível, para a divisão entre o domínio do Alto Rendimento e domínio do Rugby Recreativo ou de Lazer. Criando-se competições adequadas e organizadas em conformidade com os objectivos perseguidos – a responsabilidade das grandes competições e o direito ao jogo de rugby.

Como provas principais para o primeiro nível – Alto Rendimento - a criação de uma competição ibérica – duas franquias portuguesas com os 50/60 melhores jogadores nacionais elegíveis para a selecção nacional e 3 a 4 franquias espanholas com um calendário de acordo com as obrigações internacionais – um campeonato sénior - 6 equipas para 180 jogadores e com o objectivo de preparar jogadores para subirem ao nível superior e com um calendário adequado aos interesses internos – e um campeonato sub-20 ou 21 (de acordo com a qualificação etária internacional) – 10 equipas para 300 jogadores com o objectivo de alimentar as equipas do campeonato sénior interno e de formar a selecção nacional etária correspondente.      

A organização do domínio Rugby Recreativo, embora com apoio federativo, seria descentralizada para as associações regionais e poderia ser realizada sem a formalidade das competições habituais e estruturada em pequenas competições de acordo com os interesses dos diversos clubes, possibilitando uma competição de maior proximidade geográfica.

Neste domínio, quer sénior, quer nos escalões etários, as competições poderiam estender-se nas condições adequadas (durante mais de um século o rugby da Grã-Bretanha não teve campeonatos) às capacidades económicas e desportivas dos clubes.

Para o funcionamento deste modelo seria necessário a existência de um período de carência – 3 anos? - no habitual sobe-e-desce interdivisões. Este tempo permitiria que as equipas interessadas num outro nível de competição ganhassem a sustentabilidade necessária à capacidade competitiva exigível no nível do Alto Rendimento. Para que no final do período de carência houvesse uma hierarquização de clubes, seria feito um ranking tipo IRB que permitiria a organização das competições com eventuais trocas de posição e, eventualmente e então, alargamento do campeonato sénior interno.

É claro que a competição ibérica não é imediata e não depende só de nós. Mas é um caminho necessário. Como necessário e urgente é, para aumentar a competitividade interna que permita uma maior aproximação ao nível internacional, reduzir a divisão principal às seis melhores equipas.

No actual modelo – e de acordo como mesmo objectivo de aproximar do nível internacional –  o campeonato deve ser realizado antes das competições internacionais de 2013 e a fase final – porque o jogo internacional é cada vez mais um jogo sem retorno e os jogadores representativos a isso devem ser habituados – deve ser realizada em jogos únicos de meias-finais e final.

O aumento da competitividade do campeonato pode ainda ser afinado com a regulação dos pontos de bónus – ofensivo para a equipa que marque 4 ou mais ensaios e mantenha para o adversário uma diferença de 3 ensaios e defensivo apenas para a equipa que seja derrotada por menos de oito pontos.

domingo, 24 de junho de 2012

JOGAR ASSIM É UMA BELEZA

Uma lição de rugby! de eficácia no uso da bola, de eficácia no cumprimento dos princípios do jogo, de eficácia na sintonização dos objectivos comuns.

A Irlanda, que no sábado anterior tinha mostrado uma aproximação a este nível superior que a Nova Zelândia representa, viu-se completamente ultrapassada pela fluidez, velocidade e movimento que os neozelandeses colocaram neste último jogo da digressão irlandesa.

Era previsível. O aperto sofrido pelos All-Blacks no último jogo - traduzido numa vitória sofrida e conseguida no último momento - teria resposta. E o interesse do jogo estava precisamente aí: saber como iriam reagir os neozelandeses, que armas iriam usar, como iriam lançar o jogo e impedir os irlandeses de responder ao mesmo nível?

A diferença entre a Nova Zelândia e a Irlanda - 1º e 8º lugares no ranking IRB - indicia uma diferença entre 23 a 30 pontos no resultado - o que significa, para que o resultado seja aproximado, que a Irlanda teria que estar no seu melhor, com tudo a correr bem, com a sorte do jogo pelo seu lado e o fighting spirit no seu máximo expoente. Foi o que aconteceu anteriormente e que não teve sequência neste último jogo. Porque os All-Blacks não deixaram. Mas sessenta pontos a zero?! É uma diferença brutal...

Os All-Blacks, para além da inovação - veremos o que o futuro dirá desta experiência - de recorrer a dois asas para as posições 7 e 8, apresentaram a estratégia de que mais gostam: tomar iniciativas. Nada parece planeado, tudo parece resultar da inspiração momentânea, mas surge porque houve horas e horas de trabalho treinando a adaptação à defesa e a tomada de decisão de cada um de acordo com o movimento de todos. A estes princípios juntam ainda uma notável capacidade de jogar no contacto e no chão - "é aí que se perdem ou ganham os jogos", concordam os irlandeses Brian O'Driscoll, capitão, e Declan Kidney, treinador - sem comprometer jogadores para além do necessário e utilizando qualquer jogador, não necessariamente o 9, para garantir a rapidez da continuidade do movimento e impedir assim que a vantagem seja da defesa. A que acrescentam uma impressionante fluidez e velocidade, atacando a linha-de-vantagem e alterando ângulos de corrida para atacar o ombro fraco defensivo e servir o apoio efectivo que aparece - quase como no Barcelona ou Espanha futebolística - a abrir, em alternativa, mais do que uma linha de passe, demonstrando uma notável capacidade interpretativa do movimento por parte dos jogadores sem bola - todos sabem para onde se dirigir, todos conhecem, em cada momento, a sua função, todos são capazes de se adaptar às exigências momentâneas do jogo e todos se mostram capazes de juntar mais-valia à equipa. E quando as coisas começam a correr bem, aumentando os níveis de auto-confiança, não há resistência que aguente.


Nota de factos: Marcando nove ensaios os All-Blacks não fizeram, praticamente, faltas e apenas tiveram 36% de posse da bola. Ganharam 60-0.  

terça-feira, 19 de junho de 2012

ESTRATÉGIAS

Vale a pena (re)ver os recentes jogos entre a Nova Zelândia e a Irlanda. O mais interessante desses dois jogos - e por isso os treinadores devem analisá-los - é tentar perceber como foi possível a Irlanda ter passado da situação de completamente dominada, da quase figura de corpo presente do primeiro jogo, para a posição de igualdade competitiva conseguida no segundo jogo.

Verdadeiramente interessante nesse visionamento é procurar descobrir como foi possível aos treinadores irlandeses alterarem a relação de forças e conseguir, no mínimo, equilibrar o confronto. Que meios usaram para anular os pontos fortes neo-zelandeses? Como fizeram para superar as suas próprias fraquezas? Um caso de estudo onde a cultura táctica dos jogadores irlandeses permitiu suportar um conceito estratégico adaptado ás circunstâncias.

Depois disto, o terceiro jogo será, pelo menos neste domínio, de grande interesse: ver até onde a equipa técnica All-Black conseguirá encontrar soluções para, de novo, impor superioridade… e que respostas, neste jogo do gato e do rato que é a competição desportiva, os irlandeses terão preparado.

Um dos maiores gozos, pelo menos para mim, da competição desportiva é poder perceber as razões estratégicas e os movimentos tácticos de que se servem os treinadores para tirar o máximo partido das capacidades técnico-tácticas dos seus jogadores e potenciar o valor da sua equipa - aquilo que muitas vezes se designa por criar um todo superior à soma das suas partes. Como o fazem? Como o pensaram?

Hoje mesmo e no Euro de futebol, a Croácia fez uma notável demonstração de inteligência estratégia pela forma como tácticamente foi desenvolvendo o seu jogo frente à Espanha. E se tivesse ganho - num jogo em que não poderia ser considerada favorita - não escandalizaria ninguém. Percebê-lo foi um gozo suplementar de noventa minutos bem passados.

Ver os jogos, procurando perceber a estratégia que uma equipa procura impôr, perceber-lhe as adaptações e compreender os domínios tácticos que a suportam é, para além de ampliar a dimensão do jogo, um positivo e vantajoso vício de treinador.

segunda-feira, 18 de junho de 2012

A MUDANÇA NECESSÁRIA É AGORA!

Perdido assim, perdemos mais um lugar - somos agora 26º do ranking IRB e fomos ultrapassados pela Coreia- e ficámos mais longe da Espanha e da Bélgica. O que significa que nos afastamos da zona de segurança competitiva dos escalões (Tiers) que contam. E que o acesso à vida competitiva internacional que conta nos vai ser mais difícil.

O resultado com o Uruguai foi pesado e demonstrou muito do que se teme sobre a situação e evolução do rugby português. E não vale a pena ignorar ou disfarçar a realidade dos factos.

É claro que, se quisermos, podemos ter a visão da avestruz e dizer que faltaram imensos jogadores, que esta não é a melhor equipa, que temos imensos jogadores portugueses espalhados pelo mundo, etc. e tal; mas se quisermos ser realistas devemos lembrar-nos que a enorme maioria dos jogadores presentes em Bucarest eram internacionais, não estreantes, e que o resultado e a consequente descida no Ranking IRB deve obrigar, antes que o remédio não possa fazer efeito, a parar para pensar a estratégia de desenvolvimento interno do rugby português. Porque se há alguma vantagem neste resultado - e nas prestações que o acompanharam - é o alerta que constitui.

Não serve, não ajuda, não vale a pena tentar explicar que os outros - os nossos adversários - são profissionais, meio-profissionais ou lá o que sejam. Se pretendemos continuar a falar em Mundiais, 6 Nações B, janelas, escalões, rankings, academias, competições com os grandes - estes são os adversários e não se vencem com a armadilha das desculpas. Ou nos adaptámos para sobreviver, como ensina Darwin, ou desaparecemos do mundo da competição internacional - daquel mundo que conta, que garante patrocínios, que permite sonhos, que arrasta heranças, que deixa marcas. Que garante respeito.

A altura da mudança é agora! adiá-la comprometerá o futuro próximo e não permitirá qualquer presença no Mundial de 2015 ou qualquer possibilidade de luta pela presença no Sevens dos Jogos Olímpicos de 2016. Adiar a mudança é colocar-nos alegremente a caminho da zona de entretém do rugby internacional - aquela que só existe para compor estatísticas.

Precisámos de proporcionar níveis competitivos mais elevados aos jogadores que podem representar a selecção nacional; precisamos de proporcionar as experiências necessárias à compreensão táctica do jogo de alto nível; precisamos de proporcionar os hábitos de utilização dos gestos técnicos no tempo e espaço de eficácia internacional. Precisamos de mudar hábitos, de elevar níveis e de produzir consequências.

Julgar que nada disto é necessário porque podemos contar com o selo português que existirá em jogadores espalhados pelo mundo fora será um erro fatal. Porque nada vive muito tempo sem um suporte adequado.

A mudança é absolutamente necessária. Agora!

domingo, 17 de junho de 2012

SUL MELHOR QUE NORTE

O Sul venceu o Norte. Com excepção da surpreendente vitória da Escócia sobre a Austrália - quem, para além de um orgulhoso escocês de antes quebrar que torcer, apostaria nesse resultado? - as equipas das Seis Nações perderam, algumas pela segunda vez consecutiva, os jogos com as Four Nations. Os Pumas da Argentina derrotaram a Itália e a França, os All-Blacks a Irlanda, a Austrália o País de Gales, a África do Sul a Inglaterra. Uma demonstração.

Desta vez as derrotas foram résvés havendo até momentos que a vitória parecia pender para os do Norte mas, nos momentos decisivos - e isto é uma qualidade - o Sul fazia prevalecer os seus argumentos: cultura táctica, organização colectiva, experiência, maior capacidade de adaptação. Apesar da notável demonstração de atitude competitiva dos nortistas.

Se a Inglaterra só acordou depois de ter dado a folga necessária - e entregue os pontos - à vitória sul-africana, já a Irlanda - depois da corrida atrás das sombras da semana passada - apareceu modificada e muito mais próxima das capacidades que os seus jogadores mostram nas competições europeias de clube: fizeram um excelente jogo mas a pressão imposta pelos neozelandeses mostrou-se problema ainda difícil de ultrapassar.

O que mais me custou - julguei que era desta… - foi a derrota de Gales: por um milésimo perderam por dois pontos; por um demonstração de total inexperiência - do seu próprio capitão e do seu jovem formação - jogando quando deviam guardar a bola, deixaram fugir uma vitória já dada com garantida.

Destes jogos, uma realidade: o rugby é um desporto colectivo de combate. Pela posse da bola, pelo terreno, pelos pontos. E esse combate exige jogar nos limites do risco, cara-a-cara, sem tempo que permita espaços de execução ou de análise prolongados, com soluções de continuidade de movimento cada vez mais heterodoxas - numa espécie de prego-a-fundo quando a oportunidade se mostra - em constante adaptação ao momento e ao adversário. O que exige preparação longa e adequada.

Destes jogos uma preocupação: os resultados estão a depender demasiado da discricionariedade das arbitragens, nomeadamente nas interpretações das faltas entre as primeiras-linhas e na placagem e momentos consequentes. O que pode tornar-se num problema grave de descrédito do jogo - pese a actual aceitação desportiva com que jogadores, treinadores ou espectadores, ainda o encaram em cada jogo.

sexta-feira, 15 de junho de 2012

TOMADA DE DECISÕES

In contrast to the North, players in the South are encouraged to be spontaneous and use intuitive decision making during spring internationals, Super Rugby competitions, national provincial and winter club competitions, especially in New Zealand and Australia. Peter Russell, assistant coach, Newcastle Falcons. Sublinhados meus.

Há anos, quando andei por França a aprender sobre organização e métodos de treino aplicáveis em digressão com os All-Blacks de Laurie Mains, encontrei um grupo de treinadores argentinos que andavam também em digressão por diversos clubes franceses a apreender novas realidades e a preparar novos programas de desenvolvimento do seu rugby interno. Perguntei ao treinador argentino responsável qual era o ponto-chave das acções técnico-tácticas que estavam a adoptar na formação dos jogadores argentinos. A resposta foi rápida e directa: a tomada de decisões!


Hoje a Argentina, que se encontra no 7º lugar do Ranking IRB e que conta com o treinador Graham Henry, recente campeão mundial, como Assessor Técnico para a Área de Alto Rendimento, tem, simultaneamente, uma equipa sub-20, os Pumitas, nas meias-finais do Mundial Junior, uma outra, Jaguares, em Bucareste, no Nations Cup, outra, os Pumas, que já jogou - e venceu - contra a Itália e se prepara para jogar contra a França e que participarão, pela primeira vez e dentro de pouco tempo, no Four Nations com a Nova Zelândia, Austrália e África do Sul.

Se pensarmos no número de jogadores de alto nível necessários para a constituição destas equipas, só podemos pensar no acerto da aposta e nas vantagens do sistema que suporta o objectivo central: encontrar e aplicar as formas de treino que, ampliando a capacidade de ler a envolvente e permitindo a melhor escolha da panóplia de meios técnicos disponíveis, possibilitem também a adequação eficaz e em tempo útil das decisões individuais e colectivas tomadas. E numa altura que se ouve, no nosso rugby interno, falar demasiado em pesos, alturas e ginásios talvez não fosse pior reflectir mais demoradamente sobre este tema: como melhorar a tomada de decisões dos jogadores portugueses?

O bom resultado está à vista nos argentinos

quinta-feira, 14 de junho de 2012

MELHORES MAS NÃO O SUFICIENTE

No segundo jogo da Nations Cup, na Roménia, o XV de Portugal jogou melhor. Embora os Emergenti não sejam os Jaguares e não consigam um tipo de jogo próximo - houve alturas de tal ingenuidade que apetecia perguntar: em que clubes jogam? - e portanto colocam problemas de menor qualidade, Portugal apresentou-se melhor. Mas não conseguiu - apesar de dois ensaios retirados (e bem!) das circunstâncias do jogo - ultrapassar os problemas que tem habitualmente demonstrado. O que faz recear sobre o verdadeiro carácter da melhoria: por nós ou por eles?

Os Emergenti, porque não são tão rápidos, tão móveis ou detentores de cultura táctica como os Jaguares, fazem menos pressão e dão mais tempo e espaço ao ataque. O que permitiu que os jogadores portugueses tivessem momentos para expressar a sua forma de jogar - no entanto faltou sempre a eficácia e fluidez do movimento. Mesmo se a colocação de Pedro Leal a médio-de-formação melhorou substancialmente a dinâmica e velocidade do jogo estas viram as suas potencialidades reduzidas pela distância à linha-de-vantagem - que se facilita os passes do meio-campo, facilita o reposicionamento defensivo - com que o abertura Yannick Ricardo pretendeu servir a linha.

E continuámos sem conseguir surpreender a defesa por incapacidade de aparecer com diferentes ângulos e linhas de corrida, para além das dificuldades de jogar dentro da defesa. Somos muito previsíveis. O que facilita, naturalmente, a defesa. E ainda não melhoramos o suficiente em defesa, deslizámos demasiado sem a preparação e organização suficientes para impôr o contra e recuperar a bola; continuamos a não subir no terreno, limitámo-nos a ir ocupando, lateralmente, os canais na esperança de que o ataque se entregue. E como se viu num dos ensaios italianos, deixámos, num erro organizativo de palmatória, dois defensores da primeira-linha a ver passar três-quartos italianos.

Apesar de grande alteração de jogadores nos Jaguares, fui surpreendido pelos romenos. Mostrando o de sempre: bloco avançado poderoso e desgastador; jogo ao pé consistente e capaz de conquistar terreno quando necessário - surpreenderam-me no movimento das suas linhas atrasadas. Nos últimos anos as linhas atrasadas da Roménia eram previsíveis e quase inofensivas - quase valia a pena entregar-lhes a bola para que tentassem jogar e não lançassem os avançados… No jogo contra os Jaguares fiquei agradavelmente surpreendido - o que é mau para Portugal no próximo 6 Nações B - com a movimentação dos seus jogadores, procurando intervalos, mantendo a bola viva, procurando ultrapassar a defesa circulando a bola de forma inteligente e mantendo a continuidade do movimento. Terá voltado o espírito latino? Veremos se haverá continuidade contra os italianos…

No domingo jogaremos contra o Uruguai e precisamos da vitória. Ganhando e se não erro nas minhas contas, ultrapassá-los-emos no ranking da IRB. O que é importante na actual previsão de mudanças e para que, em anos em que os resultados contarão para o apuramento do Mundial de 2015, não percámos a possibilidade de, nas janelas de Novembro e Junho, jogar com adversários adequados às nossas exigências competitivas.

Embora o Uruguai seja uma das equipas menos interessante desta Nations Cup - também eles são previsíveis e têm um modelo de jogo ultrapassado - continuam com um pack poderoso e capaz de provocar desgaste em demasia (neste aspecto continuo a recear o constante erro da posição arqueada das costas dos nossos pilares na altura da entrada em contacto na formação ordenada). Mas são a equipa que se dará pior com a equipa portuguesa que poderá, na recuperação de alguns pontapés, lançar uma enorme confusão nas suas linhas defensivas. Mas para que isso resulte em vitória, será necessário que o nosso cinco-da-frente esteja ao melhor nível e que a nossa defesa seja suficientemente agressiva para provocar erros e faltas (a transformar pelo Pedro Leal...) ao ataque sul-americano.

segunda-feira, 11 de junho de 2012

DIRECÇÕES, ÂNGULOS E LINHAS DE CORRIDA

Gostei dos Jaguares argentinos. O modelo de jogo que apresentarem deveria ser anotado pelos portugueses - porque é aquele que melhor serve as capacidades e características dos rugbistas portugueses. Daniel Hourcade, sabe da poda - já o tinha mostrado quando esteve em Portugal.

Os Jaguares argentinos - não sendo robots de ginásio (bem pelo contrário à vista televisiva) - previlegiam a inteligência do jogo de movimento, movimentando-se os jogadores de acordo com o movimento da bola e com a reacção da defesa adversária, num turbilhão de circulação de bola e de ângulos e linhas de corrida de diferentes direcções com os jogadores a aparecerem num mesmo canal de penetração em condições de receber o passe. Assim conseguem o que melhor desarticula e desestabiliza uma defesa: a surpresa da variedade. E sabem também como pressionar, cortando o tempo e o espaço, aos movimentos atacantes adversários. E esta fórmula permitiu-lhes bons resultados na África do Sul...

Aliás esta forma de jogar, movimento da bola, aparecimento de jogadores com linhas de corrida e ângulos com diferentes direcções foi a constante dos jogos do outro lado do mundo neste fim-de-semana - o jogo dos All-Blacks é uma boa lição e o último ensaio australiano contra os galeses mostra o que são linhas e ângulos de corrida eficazes para quebrar uma linha defensiva. Brian O'Discroll, depois do 1º teste contra os neozelandeses, disse da sensação da sua equipa : We were chasing shadows - o que, traduzido, significa que se sentiram à caça de gambozinhos... que é o que pode acontecer sempre a quem tem que defrontar o movimento da bola e dos jogadores num turbilhão de direcções, ângulos e velocidades diversas. E Portugal, cujos jogadores não serão os maiores matulões do mundo, devia jogar assim, aprender a jogar assim - fazendo uma aposta estratégica na formação adequada.

Mas o XV de Portugal mostrou outra faceta, muito longe da pretendida.

Neste jogo contra os Jaguares a selecção nacional esteve francamente mal. Com uma defesa de espera, sem pressão efectiva, dando demasiado espaço e tempo, aumentou a eficácia atacante argentina; sem atacar a linha de vantagem com a velocidade necessária, os seus movimentos, lateralizados e previsíveis, tornaram-se presa fácil para a defesa argentina que pouco mais teve que fazer do que deslizar para garantir a sua superioridade numérica.

A posição do rugby português não está fácil: a subida de outros países tornou a concorrência mais forte e colocou a fasquia internacional num elevado grau de exigência. O mundo rugbístico está em mudança, os resultados internacionais contam cada vez mais para garantir o acesso a competições competitivas e a IRB não vai preocupar-se com mais do que as vinte, vinte-e-oito, primeiras federações do ranking; as outras terão que tratar da vida no seu mundo particular. E para que não haja arrependimentos fora de tempo, para que haja resultados em tempo útil, convém estabelecer desde já a estratégia mais adequada. Com objectivos competitivos claros e que se mostrem eficazes.

O combóio está em movimento e já não tem estações de paragem.

terça-feira, 5 de junho de 2012

FOTOGRAFIAS DO ANTÓNIO SANTOS




É, pode dizer-se, um album de memórias fotográficas - e hoje só de boas memórias porque o tempo já retirou o dramatismo das derrotas - o livro que o António Simões Santos editou e de que é o autor fotográfico - excelentes fotografias, diga-se - e que intitulou Vintage Rugby, Selecções.

Pessoalmente, este livro é a melhor oportunidade - pela sua imensa cobertura - que tenho de relembrar os tempos, os colaboradores e os notáveis jogadores que fizerem parte das Selecções Nacionais de que fui responsável. E rememoriar, mesmo se por relação, as estórias, os momentos, os jogos. E o grande Amigo e Companheiro que foi o Albano Rodrigues na sua dedicada acção organizativa junto da selecção.

Para quem gostar de fotografia desportiva - tem momentos decisivos excelentes - ou para quem tenha sido internacional na altura da objectiva do António Santos, o livro é um bem necessário.

Em minha casa tem lugar de fácil acesso. Parabéns, António!

segunda-feira, 4 de junho de 2012

CONFIANÇA

Eu sei que era um jogo entre equipas que pertencem ao mesmo círculo competitivo. Eu sei que era uma final onde não há garantias de coisa alguma - é por isso que pode haver apostas, não é? Mas eu tinha uma enorme confiança na equipa do CDUL - tanta que desenhei o boneco do título na sexta à noite, como se fosse uma certeza.

Conheço bastante bem o XV do CDUL - por o ver jogar muitas vezes - e razoavelmente a equipa de Agronomia, sei assim dos fortes e fracos de um e outro lado, sei pesá-los e compará-los. E a comparação pendia decididamente para o azul-escuro - os fortes do CDUL iriam ultrapassar as capacidades de Agronomia. Bastava auto-confiança e atitude conquistadora dentro de campo ... e o resultado surgiria naturalmente.

E se necessário, a garantia que a superior condição física do CDUL iria buscar o que fosse preciso nos vinte minutos finais. Tinha essa confiança.

Não quer dizer que o CDUL seja já uma super-equipa e que se encontra num patamar muito superior a todas as outras. Nada disso. Sei bem do défice que ainda tem entre o volume de jogo que produz e a sua eficácia; que às vezes se atrapalha com coisas bem feitas; que nem sempre o mesmo raciocínio se espalha pelo colectivo, desperdiçando-se oportunidades que não são colectivamente reconhecidas; que há jogadores que ainda têm que desenvolver as suas habilidades e a sua cultura táctica; que há lugares que precisam de maior maturidade ou outros, pela lei da vida, que vão precisar de preenchimento. Sei isto tudo.

Mas sei também que o CDUL é, neste momento, a melhor equipa portuguesa e a mais capaz de produzir um rugby interessante e que se aproxima do rugby de movimento - afinal a nossa escola de sempre.

Por tudo isto a confiança podia ser, como foi, muito grande. Por tudo isto, a vitória e o retorno ao mundo competitivo que nos pertence.

E a confiança num futuro sustentado, com as provas dadas pelo XV dos Sub-21, é também, naturalmente, grande. Voltámos!

sábado, 2 de junho de 2012

CDUL CAMPEÃO!







Ao Lourenço Fernandes Thomaz, presidente do CDUL:
Parabéns! A memória do teu Avô sorriu sobre o Estádio de Honra do Jamor.

Podes bem estar satisfeito com os resultados do teu notável trabalho como Presidente do CDUL. Com a tua dedicação, determinação, excelência de decisões, escolhas e descobertas atempadas de recursos, colocaste de novo o nosso CDUL no lugar dos melhores que lhe pertence. Tenho também a certeza, sinto-o, que o nosso Bernardo, o grande ausente desta festa, nos está, contente da vida, a dar um enorme abraço.

Obrigado a todos, aos treinadores - Luis Cassiano Neves e Manuel Sommer Ribeiro - e sua equipa - João Gonçalves (excelente trabalho na condição física) e José Maria Caupers - aos jogadores, os principais actores e que honraram sobremaneira a camisola azul escura, pelas brilhantes memórias que nos fizeram reviver neste inesquecível dia. Parabéns!

Destes dezoitos campeonatos
participei na conquista de seis
e, se não erro, fui capitão em
cinco.






sexta-feira, 1 de junho de 2012

CUMPRIR O FORA-DE-JOGO

A lei sobre o fora-de-jogo é das primeiras regras (ainda no tempo do Colégio de Rugby) a integrar o conceito do jogo de rugby. E é graças a ela que se mantém, impondo a existência de uma "linha da frente" que permite a permanência da divisão do campo pelas duas equipas, a histórica tradição do rugby como o jogo da batalha, como desporto colectivo de combate.

Nascida com a preocupação de proteger a integridade física dos jogadores - criando, pela divisão de campos, um espaço de segurança onde não haveria possibilidade de ser emboscado, a lei do fora-de-jogo é muito responsável pela caracterização do jogo como o conhecemos hoje.

Da lei do fora-de-jogo - porque deixou de fazer sentido placar um jogador que esteja à frente da linha de fora-de-jogo por já não representar qualquer ameaça - resulta o facto de só ser possível placar o homem da bola e não, como até então, fazê-lo a qualquer outros dos jogadores. E desta regra, na dupla faceta das linhas que cria - a linha-da-frente e a linha-da-bola - surgiram, como consequências, a linha de ensaio, a colocação da bola no solo para ser considerado ensaio, a linha de 22m, a formação-ordenada a 5 metros, o passe ou toque para diante (cf. Pierre Conquet/Jean Devaluez).

Sem a lei de fora-de-jogo o rugby nunca seria o jogo que conhecemos. Sem o cumprimento da lei de fora-de-jogo não é possível jogar Rugby!

O não cumprimento da lei de fora-de-jogo retira de forma artificial - dando uma vantagem aos defensores exterior ao combate desportivo - o tempo e o espaço necessários ao portador da bola para proceder às adaptações que lhe impõe o objectivo de garantir a continuidade do movimento da sua equipa. Daqui a necessidade da sua eficaz vigilância.

Nem sempre nos campos portugueses existe a devida arbitragem sobre este ponto fulcral do jogo. As razões são várias mas, provavelmente, a principal será a demasiada focalização no momento de contacto junto ao chão que, fixando o olhar e a preocupação, não permite ver a envolvente e, portanto, o movimento de ultrapassagem faltosa das linhas de fora-de-jogo. Do que resulta, inúmeras vezes, que as bolas rápidas dos reagrupamentos - as que permitem ataques eficazes - são inexistentes ou de impossível utilização.

O segredo, a solução arbitral, estará no facto de os árbitros terem que saber analisar a situação de contacto entre jogadores e solo de acordo com a posição do corpo de cada um dos intervenientes e intuir da possibilidade ou não da saída rápida da bola - se o contacto se faz com o corpo do portador entre o placador e a bola, os olhos do árbitro devem logo analisar as situações de possível fora-de-jogo; se a bola fica entre os jogadores, não sendo tão premente a vigilância ao posicionamento exterior do reagrupamento, a atenção ao jogo faltoso no chão e às entradas dos apoiantes será mais aconselhável.

Amanhã será disputada a final do principal Campeonato Nacional. Para que o jogo tenha o interesse que deve e que os jogadores protagonistas merecem, espero que, seja quem for o árbitro responsável pela sua condução, que a atenção ao fora-de-jogo seja tal que haja sempre o necessário tempo e espaço correspondente ao combate desportivo para permitir o rugby na sua melhor expressão.

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