quinta-feira, 31 de agosto de 2017

VITÓRIA A FERROS CONTRARIA PREPARAÇÃO

Há cerca de 25 séculos, Sun Tzu definiu no seu Arte da Guerra que “um exército vitorioso ganha antes de ter deflagrado a batalha”. Ou seja, ensinou que a boa preparação do combate é um passo decisivo para chegar à vitória.

Sendo o Rugby um desporto colectivo de combate este ensinamento aplica-se-lhe com muito maior propriedade do que num desporto de bola para a frente à espera de um acaso feliz. 

A selecção portuguesa de sub20, presente no Rugby World U20 Trophy - no que pode ser considerado um 2º grupo do Mundial, isto é, o Mundial B - defrontou e venceu a equipa da casa, o Uruguai (20-18), no primeiro jogo do seu campeonato. E conseguiu-o à custa de uma excelente atitude dos seus jogadores e da coesão colectiva conseguida - pela repetição insistente das palavras que definem os conceitos, adivinho - pelos seus treinadores, fazendo - sob chuva constante e perturbadora - das tripas coração. Portanto, prepararam bem e antecipadamente o embate? Nada disso ! Muito longe disso!

Jogadores e treinadores não tiveram o mínimo de condições de preparação desta sua presença no Mundial B. Repete-se: não tiveram o mínimo de condições de preparação que acautelasse desportivamente esta sua presença no Mundial B de Sub 20. E no entanto ganharam... Sim, mas deve perguntar-se: como teria sido o jogo se tivesse havido a adequada preparação? E como seria o próximo?

Porque houve incúria, incompetência, desleixo? Sei lá! Mas inconcebível irresponsabilidade dos responsáveis federativos, essa houve garantidamente. 

Tão garantida como a não presença de dirigentes qualificados no aeroporto a, pelo menos, desejar a uma das suas selecções representativas que tudo, apesar de todas as dificuldades, diriam, corresse pelo melhor; ou como a aceitação federativa de uma verba de 1400 euros conseguida pelos membros da Confraria do Rugby - cada um terá oferecido uma parte do quinhão - a deixarem ficar a ideia que o deslocamento ao Mundial B seria idêntico a uma deslocação de final de curso na companhia dos professores...e não uma participação desportiva de alto rendimento.

Preparação?! Para um campeonato cujos resultados marcam na imagem do rugby português ao nível internacional que, dado o péssimo final de época da principal equipa representativa, bem preciso anda de algo que lhe garanta a vida e o futuro... a preparação esteve ao nível zero.

Voltando ao jogo.

Se houvesse preparação adequada a formação-ordenada portuguesa não teria sofrido como sofreu, recuando perante o empurrão adversário - nitidamente aos portugueses faltou a coesão que só o tempo de treino e de competição garantem. E teriam conseguido uma maior capacidade de conquista nos alinhamentos. Como também, as apropriadas saídas de Nº8, poderiam ter um superior nível de êxito com desequilíbrio da defesa adversária se tivessem existido condições para que a articulação 8-9-6-7 tivesse as rotinas necessárias para garantir a continuidade da circulação da bola. Ou que a linha dos três-quartos tivesse as condições físico-mentais e tácticas - a confiança necessária de uns nos outros que só o tempo conjunto garante - para no último quarto do jogo continuar a subir defensivamente - em vez de esperar - com a rapidez  pressionante que obrigaria a erros adversários. Ou mesmo e voltamos a falar de confiança que o tempo tráz, que os ataques da linha de três-quartos se fizessem mais próximos da linha de vantagem para não dar tempo d eemenda à defesa adversária. E se houvesse a preparação adequada não haveria, muito provavelmente, a indisciplina que trouxe - essencialmente motivada pela falta de hábito a situações idênticas de luta por cada centímetro de terreno e ponto de resultado - dois cartões amarelos que fizeram 20 minutos finais de aflição cardíaca permanente.

Valeu a atitude de antes quebrar que torcer que levou a que cada confronto defensivo se transformasse na placagem da vida de cada um. Valeu a coragem, a determinação e o orgulho na camisola para ultrapassar a falta de condições.

Um já está! como me dizia o treinador principal Luís Pissarra. Foquemo-nos no próximo - contra Hong-Kong - para garantir o acesso à fase das eliminatórias. 

Que a sorte dos deuses - já que não houve deuses para a preparação - esteja convosco...

terça-feira, 29 de agosto de 2017

SORTE É...PODER TER VISTOS ESTES DOIS JOGOS

Em dia de Nova Zelândia foi uma sorte poder ter visto os dois jogos que deram a vitória, masculina, na Beledisloe Cup e, feminina, no Mundial de 2017.

Num e noutro jogo pudemos ver o resultado da formação neozelandesa - All Blacks e Black Ferns - numa demonstração da sua qualidade e eficácia. Numa e noutra equipa a capacidade de recorrer a uma ampla panóplia de técnicas para jogar de acordo com o que o adversário apresenta como pontos fracos - dir-se-ia a capacidade de exploração - é o aspecto fundamental e demonstrativo de uma formação técnico-táctica muito bem conjugada, estudada e amplamente aplicada que fomenta a construção de avanquartos - jogadores que misturam de forma consolidada o domínio técnico-táctico que se exige a avançados e três-quartos. Situação que é, aliás, parte integrante da cultura neozelandesa como demonstra a existência do mito (não corresponde à verdade histórica) de que o nome de All Blacks teria surgido da corruptela de all backs nome com que um jornalista teria designado a equipa neozelandesa - afinal The Originals - quando da 1ª digressão, em 1905, do XV da Nova Zelândia às Ilhas Britânicas.

No jogo contra os australianos e ao contrário do primeiro jogo, os neozelandeses sofriam o primeiro ensaio aos 26” - vinte e seis segundos! - de jogo para se verem a perder por 3-0 de ensaios aos 20’. 

Num jogo de 10 ensaios (!!!) e numa 2ª parte de ora ficas tu à frente, ora fico eu com ensaios para todos os gostos - o 4º neozelandês foi precedido por 22 fases e o 5º resultou de uma penetração com passe para dentro, passe para fora para acabar no meio dos postes para um 35-29 final de um excelente jogo.

Impressionante, para além da capacidade e qualidade técnica que permite a estes jogadores jogarem num metro quadrado como se tivessem todo o campo por conta, a importância do triângulo bases-Nº8. Este triângulo do lado neozelandês fez 22 placagens, transportou a bola 55 metros e do lado australiano foram feitas 26 placagens e a bola foi transportada 38 metros. E os bases ainda tiveram que dispender energias nas suas funções primeiras: garantir a sustentabilidade da formação ordenada e a conquista da bola nos alinhamentos. Brutos que só sabem empurrar e saltar? Foi tempo...

Como também foi tempo de aberturas apenas muito habilidosos, muito estrategos e muito pensadores do jogo e afastados do calor da luta. Neste Nova Zelândia - Austrália os melhores placadores - por aqui se podem ler as preferências atacantes de ambas as equipas embora algumas das placagens feitas o tenham sido, em dobras e no limite da linha defensiva - foram os dois aberturas: o neo zelandês Barrett fez 9 placagens (10% das placagens da sua equipa) e o australiano Foley fez 15 placagens (11% das placagens da sua equipa).

E a Nova Zelândia ganhou em cima do final porque mereceu - ganhou em todos os parametros do jogo - e principalmente porque demonstrou uma absoluta confiança individual e colectiva. À minha falha adversária aí se formavam as vagas em continuidade de passes de todo o tipo. 

A principal diferença para o jogo anterior esteve no lado australiano que mostrou ter apreendido o conceito de um seu antigo treinador, Jack Gibson: quero lá saber que raio de nome dão à defesa - quero é que subam rápido e plaquem! E assim fizeram, placaram... e voltaram a colocar o rugby australiano no seu devido lugar.

Na final feminina do Mundial, as neozelandeses levaram uma parte (o resultado ao intervalo era de 17-10 favorável às inglesas) até perceberem como desarticular a equipa inglesa: na segunda-parte o ataque neozelandês, deixando de lado o seu jogo expansivo, passou a focar-se nos corredores imediatos às formações... e foram 3 ensaios da “Melhor em Campo”, a pilar Toka Natua para construir a vitória por 41-32 num jogo de muito bom 
nível técnica e tacticamente e com 11 (!!!) ensaios.

O Rugby pode jogar-se de duas maneiras: ou cumprindo um cardápio pré-elaborado a fazer valer as estruturas que procuram o melhor dos dias para que o adversário não leia o suficiente e cometa os erros - nem sempre forçados - que permitam construir o melhor resultado ou então, alicerçando o seu jogo na utilização dos seus pontos fortes que se lançam, sempre com uma ou duas alternativas em suporte, sobre a descoberta - pela permanente leitura - do fraco adversário explorando-o em continuidade até à ruptura que leva á àrea de ensaio. Nos dois jogos, os neozelandeses - que à sua capacidade técnico-táctica juntam uma confiança sem limites que lhes permite correr os riscos adequados à perturbação do adversário -  mostraram preferir a segunda e mostraram-na como vitoriosa. E assim continuam a somar títulos e a manterem-se no 1º lugar do respectivo ranking.

quinta-feira, 24 de agosto de 2017

UM JOGO DE SENHORAS MAS COM 338 PLACAGENS

No jogo das meias-finais do Campeonato do Mundo Feminino que se disputa na Irlanda entre os “quinze” da Inglaterra e da França - com um resultado de 20-3 favorável às inglesas - as jogadoras fizeram 338 tentativas de placagens (141 para a Inglaterra e 197 para a França) com uma taxa de sucesso de 86% - as inglesas fizeram 111 placagens efectivas e as francesas conseguiram 174. 
Este valor de 338 placagens é uma brutalidade, correspondendo a uma notável atitude competitiva e exigiu das jogadoras um enorme dispêndio de energias. Como comparação veja-se que no jogo entre os mesmos países mas em equipas masculinas e referente ao Seis Nações 2017 (19-16 favorável aos ingleses), os jogadores realizaram 260 tentativas de placagem com uma taxa de sucesso de 85%. Ou seja, menos 78 placagens correspondendo a quase uma placagem a menos por minuto. 

Notável a forma como as duas equipas se bateram e jogarem - cada uma no seu estilo - pela final do Mundial. Aliás a atribuição do prémio de "Melhor em Campo" à pilar inglesa, Sarah Bern - 17 placagens e um ensaio - demonstra à evidência o combate que o jogo foi.

No fundo, ganhou a equipa com mais experiência - a Inglaterra é ainda a campeã mundial e estava, no início da prova no 1º lugar do ranking da World Rugby. Com um jogo muito pragmático e apostado na conquista de terreno pelo poder físico das suas jogadoras a Inglaterra teve, no entanto, dificuldades que a diferença do resultado não demonstra. Com um 64% de domínio territorial e 59% de posse da bola e apesar das suas 98 ultrapassagens da Linha de Vantagem - a França só fez 74 - a Inglaterra só conseguiu 487 metros de transporte com 5 rupturas conseguidas contra 508 metros e 8 rupturas das francesas conseguidas com 10 off-loads. Como demonstração das dificuldades, uma série, já da 2ª parte, de 20 fases, bem próximo da linha de ensaio francesa, que apenas se traduziu nos 3 pontos de um pontapé de penalidade. A diferença de resultado fez-se no último segundo da partida com um erro monumental francês - na tentativa de jogar tudo por tudo - já dentro da sua área de ensaio.

Pesou às francesas a pressão de uma meia-final principalmente tratando-se de uma situação de repetição - é a sétima vez que ficam pelas meias-finais - que foi sempre negativa . De tal forma que cometeram uma parafernália de erros não forçados - foram simplesmente desastradas nos alinhamentos, houve inúmeros passes para o chão, imensas bolas não recepcionadas ou pontapés com pouco nexo - que lhes retiraram a possibilidade - e se as ocasiões foram criadas... - de chegar ao ensaio. Se no primeiro quarto dispuseram de 84% da posse e obrigaram as inglesas a realizar 51 placagens (as francesas apenas fizeram 5) viram-se, a partir daí, muitas vezes acantonadas na sua área e tiveram que lançar os seus ataques de muito longe aumentando assim os riscos e a defesa de cobertura inglesa, mostrando momentos de excelência, mostrou-se suficiente para as encomendas. Mas deixaram ver que têm um estilo - o clássico french-flair - capaz de atrair e que se mostrou suficientemente eficaz. Faltou-lhes traquejo...

No sábado, na final, um grande Inglaterra-Nova Zelândia num confronto de duas máquinas de jogar que vão obrigar a um final do dia agarrado à televisão. Depois de, claro!, logo pela manhã ver o Nova Zelândia-Austrália para o Rugby Championship 2017.

segunda-feira, 21 de agosto de 2017

O USO DA BOLA: DOS ALL-BLACKS ÀS FRANCESAS

A primeira parte do recente Austrália-Nova Zelândia foi de se lhe tirar o chapéu - um dos melhores dos últimos cinco anos, afirmou um dos comentadores. De facto um 40-6 ao intervalo favorável aos neozelandeses para terminar num 54-34 com 12 ensaios para ver, é obra.

A entrada dos neozelandeses é formidável e recorrendo a todos os processos do jogo de movimento - adaptação ao posicionamento dos defensores, passes em off-load (14) adequados ao transporte da bola e linha de corrida do companheiro - criando sempre mais do que uma solução - num apoio constante e em tempo e com linhas de corrida adequadas a ataques ao ombro mais fraco, rodopios a libertar braços e a avançar sempre e a fazer parecer os australianos como defensores medíocres - 61% de placagens falhadas na 1ª parte. E quando não eram passes curtos eram longos a uma ou duas mãos, por cima ou por baixo, rápidos para libertar companheiris ou lentos para fixar defensores, demonstrando uma panóplia técnica (como fazer?) de excelência que torna letais as decisões tácticas (o que fazer? quando fazer?) nascidas da adaptação à movimentação defensiva.

Com um resultado destes - 20 pontos de diferença - e marcando 8 ensaios, os All-Blacks tiveram 42% de posse de bola e 43% de vantagem territorial. O que demonstra mais uma vez que a importância não está no tempo de posse mas sim na eficácia do uso que se faz da bola. E é por isso que existem leituras estatísticas que demonstram a vantagem de uma equipa sobre a outra: desde logo a relação “ultrapassagens da linha de vantagem” com o número de “rupturas” conseguidas. Neste campo os neozelandese conseguiram, com 182 passes e percorrendo 652 metros  - bastante superior à sua média que se aproxima dos 500 metros - ultrapassar 49 vezes a linha de vantagem para criar 27 rupturas (55%) - o triplo da sua média de 9 - e marcar 8 ensaios.No campo desta relação, os australianos conseguiram ultrapassar a linha de vantagem por 57 vezes mas apenas conseguiram 13 rupturas (23%) de onde resultaram os seus 4 ensaios para compensar a conquista de 556 metros com 215 passes efectuados. Ou seja e mais uma vez, os australianos mostraram-se como os reis das fases, levando o jogo de um lado para o outro do campo mas só garantindo eficácia quando o vencedor já se encontrava definido.

Esta vantagem demonstrada no uso da bola alicerçou-se, pela imposição da conquista de terreno, no facto de os australianos terem que ocorrer às áreas laterais do defensor em cunha - o que demonstra conhecimento antecipado do seu tipo de defesa por parte dos neozelandeses (o treinador da defesa, Nathan Grey, treina também os Waratahs) - e se virem obrigados a desproteger os corredores laterais do campo onde a superioridade numérica neozelandesa criava as rupturas necessárias.

De um ponto de vista defensivo os neozelandeses fizeram, com a pressão criada pela rapidez de subida, 162 placagens para um falhanço de 23 (86% de sucesso) contra 69% de sucesso dos australianos que fizeram 98 placagens, falhando 30. Para melhor se perceber a construção dos números da vitória valerá a pena comparar a capacidade defensiva dos Bases e 3ª Linhas de cada equipa: 58 placagens para os neozelandeses contra 35 dos australianos. Se analisarmos o papel dos mesmos jogadores enquanto “transportadores” teremos a vantagem de 270 metros para os neozelandeses contra 64 metros dos australianos numa demonstração de quatro vezes maior capacidade de perfuração. O que demonstra claramente a superior capacidade dos neozelandeses para descobrir e atacar o fraco do adversário

No fundo pode resumir-se que a vitória dos All-Blacks se configurou numa maior capacidade táctica individual que melhor decidiu para cada momento do jogo a solução técnica a utilizar para garantir o cumprimento dos Princípios Fundamentais do Jogo - avançar sempre, apoio, continuidade e pressão.

E se ver o jogo neozelandês é um prazer enorme, ver a equipa francesa a jogar no actual Mundial Feminino constitui um prazer do mesmo nível. De facto as francesas - vejam-se as duas primeiras partes contra a Austrália (48-0) e contra a Irlanda (21-5) - deram duas lições de rugby de movimento mostrando as vantagens do jogo que durante anos marcou a diferença do rugby francês - o french-flair - para as restantes formas de jogar. Se os jogadores neozelandeses têm capacidades de passe que os aproximam de basquetebolistas, as jogadores francesas não lhes ficam atrás na demonstração técnica. E sabem também e muito bem dar as costas antes do contacto para soltar a bola para a companheira melhor lançada e com a linha de corrida mais adequada como são capazes de executar passes-em-carga (off-loads) - 14 contra a Austrália e 18 contra a Irlanda - a uma mão com passes de pulso que lembram o andebol numa procura incessante do jogo ao largo para explorar a superioridade numérica construída. Ultrapassando a “linha de vantagem” contra a Austrália por 66 vezes e contra a Irlanda por 57 vezes, as francesas criaram, respectivamente, 18 e 13 “rupturas” de linha defensiva. Curiosamente as francesas dividiram o tempo de posse de bola com as australianas e tiveram apenas 29% de domínio territorial e 39% de posse de bola contra as irlandesas. Mas venceram sem problemas de maior os dois jogos.

Na próxima terça-feira a equipa feminina francesa jogará as meias-finais do Mundial contra a Inglaterra, numero 1 do ranking da World Rugby e a curiosidade sobre o seu comportamento competitivo é muito grande. Serão elas capazes de demonstrar aos jogadores e responsáveis da selecção masculina que este tipo de rugby, esta forma de jogar em movimento de acordo com a movimentação da bola e do adversário, representa a marca francesa de encarar o jogo e com uma maior possibilidade de garantir resultados? Veremos...

domingo, 13 de agosto de 2017

RETORNO BÊBADO CAMINHO RUA

Depois de Stuart Lancaster já ter chamado a atenção para a importância que Manu Tuilagi tinha para o XV da Inglaterra foi agora a vez de Eddie Jones vir dizer, apesar de, por diversas lesões, só ter jogado 20 minutos em jogos-testes da sua equipa, que o centro era o único jogador inglês capaz de "dar cabo" dos neozelandeses. E se assim o pensou, melhor o fez: convocou-o, apesar de uma condição sofrível, para o primeiro estágio da época da selecção inglesa.
E lá foi treinar aquele que Jones pensa que tem "potencial para vir a ser o melhor jogador do mundo".
Não terá durado muito este enlevo.
Numa licença de saída do estágio fez-se de volta com outro colega de equipa, Denny Solomona, madrugada de segunda-feira fora em notório estado de embiaguês - bêbados, como se diz no corrente. O que deixou, muito naturalmente, o treinador principal da Inglaterra possesso. E vai daí, foram os dois expulsos do estágio!
Havendo agora até quem diga que só muito dificilmente voltarão a ser chamados por Jones aos trabalhos da selecção. Causa e consequência, dir-se-á.
Pelo que se pode ver a condescedência não faz - e bem - parte do vocabulário do desporto de alto rendimento do responsável da selecção inglesa. Porque quem quer construir uma equipa ganhadora e capaz de derrotar, como afirma, os All Blacks, exige também elevado espírito de equipa - a tal coesão de que tenho falado - e rigor comportamental dentro e fora do campo, não podendo admitir abusos que violam os princípios elementares dos deveres de atletas e demonstram um sentido de irresponsabilidade que, tarde ou cedo, desmantelará a atitude competitiva no campo. Resolveu-se o problema limpando o mal pela raiz. Muito bem.
Infelizmente dentro das nossas portas não é este o espírito que impera! ... e depois, esquecendo-se que o Desporto de Rendimento não é uma prática de brincar ou entretém social, admiram-se com os resultados!

terça-feira, 8 de agosto de 2017

CRUSADERS: OITAVO TÍTULO

Belo jogo para uma excelente final. Ao ponto de Spiro Zavos, jornalista australiano, escrever que esta final, pela qualidade e intensidade do seu jogo, tinha salvo o Super Rugby que tem andado perdido entre séries, números de equipa, problemas australianos, etc. Mas o jogo da final foi um bom intervalo nesses jogos de bastidores e de administradores.
Os Crusaders perderam para os Lions em quase todos os índices excepto no que é fundamental, no resultado. E mostraram a realidade das estatísticas: ganha o jogo quem marca mais ensaios. E os neozelandeses marcaram 3 ensaios contra 2 dos sul-africanos…
Placaram que se fartaram os neozelandeses (195 placagens) mas também falharam mais (39) do que os sul-africanos. Mas estes falhanços não tiveram consequências de maior porque resultaram de subidas defensivas muito rápidas (rush) que deixaram algumas vezes passar adversários. Mas essas entradas - veja-se que o número de rupturas conseguidas pelos Lions é de apenas 13, número muito inferior ao valor das placagens falhadas - eram imediatamente tapadas pela rapidez adaptativa - recurso ao conceito scramble defence - de outro companheiro defensor. 

Cientes do perigo do último quarto do jogo - os Lions têm marcado muitos ensaios nesse final - em que a altitude dos 1750 metros pesa muito na capacidade física dos jogadores de fora, os Crusaders prepararam muito bem o jogo. Nomeadamente no que diz respeito aos pontos-de-quebra onde tiveram sempre o cuidado de empenhar poucos jogadores para libertar os defensores necessários para responder às vagas do jogo de passes muito verticalizado dos sul-africanos. E foram ainda brilhantes na forma como contrariaram a poderosa arma adversária do maul nos alinhamentos. Ver como o fizeram sem cometerem faltas é uma boa lição e bom motivo de cópia.
Curiosamente os dois primeiros ensaios neozelandeses resultaram de bolas conquistadas nos pontos-de-quebra. O terceiro resultou de uma velha formula que os Crusaders já muito utilizaram (até perceberem que os adversários já o defendiam com toda a facilidade) - bola para cá, bola para lá a provocar intervalos mais largos - e Kieran Read a não se fazer rogado para marcar no meio dos postes logo nos primeiros momentos da 2ª parte.
Contra 14 jogadores e 22-3 no resultado ao início da segunda parte tudo parecia facilitado. Mas os Lions não desistiram - a sua imagem de marca como demonstraram oito dias antes contra os Hurricanes - e com a entrada de um novo médio-de-formação, Faf de Klerk, iniciaram um período de grande intensidade que colocou - já atrapalhados pelo falta de oxigénio provocada pela altitude - os Crusaders numa situação muito difícil. Mas não é fácil jogar com aquela intensidade durante muito tempo e contra uma defesa que pressiona muito e se houve um ensaio imediato, o seguinte levou tempo de mais para se tornar na reviravolta do jogo.

Nesse final difícil aos Crusaders competiu segurar a bola tanto quanto possível e fazer valer a sua maior capacidade nos alinhamentos e nas formações-ordenadas.
Para além das qualidades neozelandesas, os Lions cometeram dois terríveis erros: a preferência por escolher um alinhamento em vez de chutar aos postes e o motivo da expulsão que os reduziu a 14 jogadores.
Com o resultado desfavorável em 12-3, ainda na primeira-parte e também ainda com a equipa completa, a uma penalidade dos Crusaders resolveram, em vez de chutar aos postes e garantir 3 pontos, chutar para fora para tentar um maul após alinhamento. O erro é grosseiro, quer pelo resultado e dado o tempo de jogo, quer porque - e para isso servem as estatísticas - o local da falta garante uma enorme probabilidade ao chutador e o maul pós-alinhamento tem, entre equipas do mesmo nível elevado, uma fraquíssima percentagem de sucesso. E foi o que aconteceu: lançada a bola, viram um neozelandês conquistá-la.  
O outro erro terminou com a expulsão de Kwagga Smith por ter "virado de pernas para o ar" e provocado uma queda perigosa ao defesa neozelandês que se encontrava no ar a captar a bola. Bem pode agora vir o treinador sul-africano, Johann Ackerman, chorar por leite derramado e dizer que a expulsão virou o jogo - claro que virou! - e que não deveria haver expulsão porque numa final deveria ser amarelo porque os espectadores pagaram bilhete e não foi para verem jogar 14 contra 15 e porque...
A expulsão não foi mais do que o resultado de uma boa interpretação das leis pelo árbitro sul-africano, Jaco Peyper. O asa Kwagga Smith provocou uma perigosíssima queda ao defesa David Havili e não existe outra interpretação possível: trata-se de jogo muito perigoso a colocar a integridade física de um adversário em perigo. Portanto, penalidade e expulsão. 
A queda de David Havili provocada por Kwagga Smith
O cartão vermelho é a única resposta a um incidente daquela natureza  e só o treinador da casa - ou um ou outro fanático - levantou a voz contra a decisão. Ficou o jogo mais fácil para os Crusaders, ficou! mas a culpa disso é do jogador sul-africano que não teve a mínima necessidade de, sem fazer tenções de agarrar qualquer bola, dar uma enorme "passa" no jogador que se encontrava no ar violando de forma grosseira a Lei 10.4 i) - Placar um jogador no ar. Um jogador não deve placar, tocar, empurrar ou puxar o pé ou pés de um adversário que está a saltar para a bola quer num alinhamento quer no jogo em geral. A sanção é um pontapé de penalidade a que se pode seguir a aplicação da Lei 10.5 - Sanções a). Qualquer jogador que infrinja qualquer parte da Lei de Jogo Perigoso deve ser avisado ou advertido e suspenso temporariamente por um período de dez minutos de tempo de jogo efectivo ou ser expulso definitivamente. E o árbitro não vai preocupar-se com o interesse dos espectadores em verem um jogo de 15 contra 15 - a sua obrigação é a de aplicar as Leis do Jogo independentemente da envolvente ou contexto. O jogo deve ser seguro para os jogadores e, isso sim, deve demonstrar aos espectadores que o é. Para que não haja pais e mães que receiem deixar os seus filhos jogar rugby.
Os Crusaders cometeram uma notável proeza: conquistaram o título pela 8ª vez em doze presenças nas finais e são a única das equipas que conquistou o título jogando - pela segunda vez porque já o havia feito em 2000 em Camberra, vencendo os Brumbies - no campo do adversário. 

quinta-feira, 3 de agosto de 2017

DO QUADRO AO CAMPO

Sir Graham Henry explica os objectivos do ataque
Assim explica Sir Graham: O objectivo principal do ataque é marcar ensaios e o sub-objectivo é ultrapassar a linha de vantagem porque ficaremos em superioridade numérica e teremos maior facilidade no 2º tempo. São três os espaços onde a defesa tem maiores dificuldades - no corredor entre a fase ordenada de onde a bola parte e o abertura adversário; para lá do 2º centro e, ainda, atrás da defesa
O essencial para que o ataque seja eficaz depende da tomada de decisão dos jogadores envolvidos e que se baseia quer no conhecimento dos companheiros - factor coesão da equipa - quer na leitura que fazem da situação que enfrentam, recorrendo a uma das opções possíveis de acordo com o movimento dos defensores.
Os factores-chave para que haja eficácia no movimento do 1º tempo, são:
  1. Todos devem representar uma ameaça e assim ser levados em conta pelos defensores;
  2. Todos devem estar preparados e disponíveis para que sejam opção através da boa linha de corrida e da disponibilidade para receber a bola através de um passe que não se mostrará o mais académico; 
  3. O passe do formação deve ser "na linha" - não deixando que ninguém tenha tempo e espaço para deslizar;
  4. Os atacantes devem correr a direito - ombros paralelos às linhas de ensaio - e "fixar", pelo menos, os adversários directos;
  5. A linha de corrida do 2º centro atacante deve ser convergente, atacando o espaço entre os centros defensores para os obrigar a aproximarem-se um do outro;
  6. A tomada de decisão do 1º centro atacante é decisiva para o sucesso: se o 2º centro defensor não fecha o intervalo, passe curto para o 2º centro seu companheiro; se 2º centro defensor fecha o intervalo, passe para o abertura atacante com bola pelas costas do companheiro 2º centro; se desmultiplicação de defensores, exploração do canal do abertura defensor jogando para o interior com o seu companheiro, ponta do lado fechado  
  7.  A linha de corrida do abertura atacante - tem que ser sincronizada e deve permitir o "endireitar" para atacar o intervalo, optando por uma das duas opções possíveis - penetrar ou passar.
Nas imagens seguintes pode ver-se a passagem do esquema de quadro ao ensaio dos Hurricanes  contra os Lions no jogo da meia-final do Super Rugby 2017 (e já referido como um dos grandes momentos do jogo aqui.) A única variante em relação ao esquema apresentado foi a de utilizar o ponta-do-lado fechado - e que fez toda a diferença e provocou um 3x1 final - como primeiro receptor.
1. Linha de corrida do 2ºC atacante, Vince Aso, a fixar o 2º C
defensor depois de Ngani Laumape ter transportado a bola
até ao limite possível e, face à leitura da organização defensiva,
 ter decidido passar a bola ao nº10, Beauden Barrett.
2. Recepção de Beauden Barrett que percebe a existência de um
intervalo e o posicionamento  em "meias-águas" do ponta
defensor , tendo dois companheiros do lado de fora, tem uma
decisão fácil a tomar: penetração se o defensor o não atacar;
passe se o defensor vier sobre ele.
3. Perdido entre defender o portador da bola ou o adversário que se apresenta
no seu corredor, o ponta defensor deixa aberto um corredor por onde entrará
Beauden Barrett que, face à defesa de cobertura que se desmultiplica, passa,
saltando o seu irmão Jordie, para Wesley Goosen (que, por junto à linha,
não se vê na imagem) marcar ensaio.

A simplicidade dos conceitos e dos princípios que Graham Henry coloca nas exigências da movimentação - muito longe e até em oposição da moda em voga do modelo de estruturas - dando aos atacantes o mote organizado das diversas opções possíveis e da sua decisão face ao movimento dos defensores permite que jogadores que ele nunca treinou, mas pela facilidade dos princípios apresentados, sejam capazes de interpretar eficazmente  a situação. Esta criação de diversas opções possíveis de oposição ao movimento dos defensores já foi também eficazmente utilizada por Bob Dwyer - utilizava 3 por jogada - na Austrália campeã mundial de 1991. No fundo, esta forma de jogar tem de surpreendente um "saber como começa mas não saber nunca como acaba".
Sendo a missão dos treinadores dos desportos colectivos a de preparar - fornecendo as devidas ferramentas - os jogadores para serem colectivamente eficazes, simplificar o processo da tomada de decisão é uma das suas obrigações. E quando os treinadores simplificam... os jogadores - e as equipas - são mais eficazes.
Como é que se defendem situações destas? Principalmente garantindo que os atacantes ficam no "pé de trás" em qualquer das fases ordenadas - formação ordenada ou alinhamento - perdendo assim o tempo ideal de acção numa demonstração evidente da importância decisiva destas fases e da necessidade do seu controlo. Depois, recorrendo a essa enorme dificuldade e exigência que é a defesa adaptativa, sendo capaz de ler os sinais adversários e reorganizar-se defensivamente em movimento.  
Créditos: as fotografias foram retiradas dos sites Rugby Site (1) e ROAR (artigo de Nicholas Bishop) (1,2,3)


terça-feira, 1 de agosto de 2017

NOVAS LEIS DO JOGO

A World Rugby juntou às Leis experimentais já em uso, novas alterações das Leis do Jogo que terão aplicação no Hemisfério Norte a partir de hoje, 1 de Agosto. Objectivamente estas alterações pretendem tornar o jogo mais fácil de entender por jogadores, árbitros e espectadores para além de aumentar a possibilidade de circulação da bola e velocidade do jogo. 
São estas as alterações recentes:
FORMAÇÃO ORDENADA
    1. Introdução (Lei 20.5 e 20.6 d)) - deixa de existir qualquer sinal do árbitro e quando após a sequência de vozes de construção a FO se encontrar estabilizada a bola pode ser introduzida - volta-se ao “antigamente” - de onde, aliás, nunca se deveria ter saído - com vantagem para a equipa que introduz que pode utilizar o “tempo” em seu favor e com prevalência da técnica sobre a força pura. O introdutor da bola, embora obrigado a lançar a bola numa linha paralela às linhas de ensaio, pode colocar o seu ombro exterior sobre a linha separadora da formação das duas equipas - ou seja, o seu corpo poderá ocupará a projecção do espaço correspondente ao tronco do seu pilar mais próximo, permitindo assim uma vantagem para a sua equipa de acordo, aliás, com o que estabelece o Código do Jogo ao escrever que “a equipa que introduz ou lança a bola deve sempre beneficiar de uma certa vantagem, embora, também aqui, seja importante que estas fases do jogo possam ser equilibradamente disputadas.”;
    2. Talonagem (Lei 20) - logo que a bola toque, dentro do túnel, no chão, qualquer jogador da 1ª linha a pode disputar com qualquer pé e um dos jogadores da 1ª linha da equipa introdutora deve procurar taloná-la. Ou seja, tendo a vantagem da introdução e da distância, a equipa introdutora não pode procurar a conquista da bola apenas pelo empurrão - um dos jogadores deve levantar um pé e procurar tocar na bola;
    3. Mãos na bola (Lei 20.9 b) - excepção) - o Nº 8 pode retirar, com as mãos, a bola dos pés dos seus Bases - segundas-linhas. Esta possibilidade que já se ia vendo na prática garante a continuidade do jogo, evitando a repetição de Formações Ordenadas;
    4. Formação Ordenada - número de jogadores - Numa forma de evitar abusos ou vantagens, as formações ordenadas sem contestação serão sempre jogadas em 8x8 mesmo que uma das equipas tenha menos de 15 jogadores; 
PLACAGEM (Lei 15.4 c)) 

    1. Placador - para jogar a bola o placador tem que estar de pé e só pode fazê-lo  do seu lado do campo e entrando pela “porta”. Esta alínea da Lei 15, ao tirar direitos ao placador, traduz uma alteração táctica importante e vai garantir uma maior continuidade de jogo ofensivo;

RUCK  (lei 16)
    1. Definição - passa a haver duas definições do ruck. Uma, como sempre - dois jogadores adversários em contacto com a bola, entre eles, e no chão. Outra, apenas para a situação de placagem, acabando assim com a possibilidade mostrada pela Itália contra a Inglaterra no último Seis Nações. No caso da placagem - placador e placado no chão - o ruck começa, com imediata definição de linhas de fora-de-jogo, logo que um jogador apoiado nos seus pés cobre a bola. Situação que vai permitir o início de um ruck com um jogador a cobrir a bola que pode já estar afastada, embora controlada, do corpo dos jogadores que se encontram no chão. A bola pode, desde que de imediato, ser jogada com as mãos até haver contacto com um adversário;
    2. Chutar a bola - num ruck um jogador não pode chutar a bola para a frente em direção não da área de ensaio adversária. O movimento de jogar com o pé fica assim restringido apenas á possibilidade de talonar;
ENSAIO DE PENALIDADE
    1. 7 pontos - os ensaios de penalidade passam a valer 7 pontos e deixam de ter tentativa de transformação;
LEI DA VANTAGEM
    1. Escolha - quando houver, numa situação de aplicação da lei da vantagem, uma sequência de faltas, o “capitão” pode escolher a que considera melhor vantagem para a sua equipa;
TEMPO DE JOGO
    1. Terminar o jogo - se houver uma penalidade com o tempo de jogo já terminado e a bola for chutada para fora, o alinhamento deve ser jogado. Significa que, com esta precisão e se o jogador pretender dar o jogo por terminado, terá que jogar a bola, dando-lhe um toque com o pé e chutando-a então para fora;
BOLA FORA
    1. Manter a bola em jogo - ao contrário de outras situações em que conta a posição da bola em relação ao plano da linha e não a posição dos pés do jogador - bola fora dos 22m ou área de ensaio e pés dentro dos 22m ou área de ensaio, tudo se passa como se a bola fosse transportada para dentro dos 22 ou da área de ensaio - nas bolas fora se um jogador saltar com os pés dentro do campo e tocar a bola - mesmo que ela tenha ultrapassado o plano da linha - para dentro do campo, mantém-se a continuidade do jogo. Esta decisão facilita o jogo em situações de pontapés cruzados em que, muitas vezes o jogador salta para fora do terreno e, no ar, joga, apenas com uma mão, a bola para dentro do terreno para ser apanhada por um companheiro.

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