sexta-feira, 27 de novembro de 2009

DO PORTUGAL- ARGENTINA A

Oito dias depois das notáveis demonstrações da importância de uma boa e eficaz formação ordenada - França-África do Sul e Itália-Nova Zelândia - a selecção portuguesa mostrou as suas debilidades neste domínio - impossibilidades genéticas como alguns pretendem fazer crer ou apenas resultado de anos da redutora proibição de empurrar nas camadas jovens de formação?
No final do jogo Daniel Hourcade apontava-me o exemplo de um pilar argentino que passava: É um Puma! Tem já 10 anos de treino de primeira-linha, tem muito trabalho em cima. Ou seja: o tempo como factor crítico decisivo - tinha já os 10 anos que Istvan Balyi, no Long Term Athlete (Player) Development, considera como tempo mínimo necessário para se desenvolver capacidades e atingir o nível máximo; tinha já o tempo que Malcom Gladwell (in Outliers) considera ser necessário para garantir o sucesso especializado.
A questão que se coloca ao nosso cinco-da-frente passa por muito treino específico - já que a inexistente competição interna pouco ajuda. Analisando as duas formações em confronto - a argentina e a portuguesa - detectam-se imediatamente diferenças que vão desde a posição do corpo - mais baixos sempre os jaguares - dos pés e do seu movimento - existem avanços a considerar - da direcção do olhar e da projecção do corpo para o contacto - questão de colocação do centro de gravidade - num conjunto de aspectos que tornam o sistema mais ou menos capaz. Tratando-se de uma das melhores escolas do mundo - inventores da terrível bajadita - ver e rever o vídeo do jogo nas formações ordenadas é - e não apenas para quem participou - uma lição que deve ser analisada e aproveitada.
Sem cinco-da-frente não é possível obter resultados de bom nível. Da sua eficácia nas formações ordenadas resultará, noutras fases do jogo, a capacidade de concentrar adversários para conseguir criar o tempo e o espaço que permitirão que a equipa possa correr e circular a bola. Com estes ou outros jogadores – aqueles que se mostrem capazes - os portugueses, tendo pouco tempo para atingir o nível necessário ao confronto internacional, precisam de descobrir soluções adequadas. Porque sem isso é ilusória a possibilidade de qualificação…

Houve melhorias no posicionamento dos três-quartos. Abandonada que foi a profundidade excessiva e aproximando-se da linha de vantagem, as linhas atrasadas - nas raras vezes em que puderam sair no pé da frente - deixaram indicações que, com maior adaptação ao cara-a-cara e maior rapidez na adequação das linhas de corrida para apoio do portador, compreenderam como podem atacar eficazmente as defesas adversárias. Esta questão da adaptação das linhas de corrida tem uma importância fundamental para ultrapassar as organizações defensivas actuais: é necessária uma percepção colectiva do momento decisivo da oportunidade. O que exige uma leitura atempada da linguagem corporal do portador da bola e a adequada resposta de geometria variável. Ou seja: o apoio, fechando o cone, tem que se aproximar das costas do companheiro, deixando-se aspirar no mesmo corredor e preparando-se para receber a bola em situações de enorme dificuldade técnica – compete aliás ao apoio, garantir a eficácia do passe. E assim a bola, em vez de morrer no chão, manter-se-á viva, prolongando o movimento de desequilíbrio da defesa. Estes momentos, se percebidos e ajustados colectivamente, transformam-se em progressões a que a defesa, desequilibrada, tem enormes dificuldades de resposta. A disponibilidade, organizada colectivamente, de cada um permitirá soluções de acordo com as situações que o movimento da bola suscita possibilitando então um comportamento da equipa objectivo e onde o todo valerá mais do que a soma das suas partes.

Um grande problema continua, no entanto, a ser o jogo-ao-pé. Sem precisão e sem propósito, não é arma ofensiva e torna-se apenas recurso. E assim é muito difícil controlar um jogo. Determinante no jogo contemporâneo, as diversas formas do jogo-ao-pé tem que ser estrategicamente adequadas ao correr do jogo e ao seu movimento. Não as utilizar eficazmente resulta num enorme e arriscado esforço de conquista de terreno.
A rever continua a utilização das bolas recebidas de pontapés adversários. O lançamento dos contra-ataques é defeituoso quer na leitura espacial, quer nos elementos que envolve ou que se disponibilizam. E também na forma previsível como pretendem avançar.

Gostei da passagem de Pedro Leal para defesa (é um típico jogador do três-de-trás onde encontra a liberdade de expressão necessária às suas características) e a entrada de Emmanuel Rebelo para formação - com passe mais rápido, de maior precisão e com hábitos de jogar sob pressão - parece ser a melhor solução actual. A equipa fica mais consistente quer na distribuição quer no jogo - por maior sentido colectivo - à volta das concentrações e aumenta as possibilidades de intercalação e lançamento do contra-ataque.

quinta-feira, 26 de novembro de 2009

JOGO DE PREPARAÇÃO?!

Não gosto daquela mania da SPORT TV de chamar aos jogos internacionais de rugby, Jogos de Preparação. Irrita-me. Porque o conceito nada tem a ver com o rugby e as suas tradições. No Rugby não há jogos de preparação, há jogos-teste. Porquê? Porque ao contrário do que sugere a etiqueta televisiva, o jogo de rugby entre equipas internacionais não serve para preparar o futuro sem consequências; no rugby, o jogo internacional - a ideia de "particular" é outro disparate - serve para avaliar - como exemplifica,aliás, qualquer teste escolar... - a situação de cada equipa num dado momento. Do que pode e não pode, das fraquezas e forças. Avaliação que serve para definir o rumo do trabalho a desenvolver e encontrar o melhor caminho a percorrer para atingir o limite das capacidades de cada equipa. Por isso, cada um destes jogos internacionais - oficializados pela IRB - conta para o ranking mundial. Um ranking escalonado de forma muito rigorosa e onde não é possível galgar posições por vitórias fáceis sobre os mais fracos. Mas que premeia a surpresa da vitória inesperada.
Um jogo de preparação não tem crítica eficaz possível: é para preparar. Num jogo-teste a crítica faz todo o sentido: ajuda a avaliar.
Cada jogo internacional de rugby é um caso sério de competitividade. Um teste às capacidades colectivas e individuais de cada equipa e onde se joga prestígio, colocando-se em jogo a posição adquirida.
Um jogo internacional de rugby não é para preparar coisa alguma, é para avaliar! E o resultado interessa.

terça-feira, 24 de novembro de 2009

ENSAIO DE PENALIDADE

No final do jogo perguntei, como tinha feito sobre o "caso" de oito dias antes, a Stuart Dickinson sobre a sua justificação para a marcação do ensaio de penalidade contra Portugal: quem empurra 2, 3 metros também empurra o resto ... se ninguém desformar, disse.
É óbvio. A formação portuguesa, empurrada, não resistiu e...desfez-se, fazendo a falta que impediu que um ensaio fosse provavelmente marcado. Ao contrário da formação italiana que nunca conseguiu mover - empurrar - a neozelandesa, a formação portuguesa só em falta conseguiu parar o comboio. Foi ensaio de penalidade marcado com todo o rigor - e não vale a pena, como li, fazer passar a ideia que o árbitro nos prejudicou, usando critérios distintos dos utilizados junto da poderosa Nova Zelândia... Perdemos, ponto! Justificá-lo pelo árbitro, são desculpas de mau pagador. E sem quaisquer vantagens.

JOGOS DOS MIÚDOS

Fui sábado participar na campanha da Escola de Jovens Árbitros. É muito divertido ver os miúdos a jogar - a mim calhou-me os sub-12 - e alguns deles já mostram qualidades interessantes. No entanto notei, para além da dificuldade que é arbitrar, erros - atenção Treinadores e Monitores! - que se não forem corrigidos desde já, travarão qualquer carreira de alto nível. Duas situações, por demais repetidas, chamaram-me particularmente a atenção:
  • o transporte da bola com uma só mão;
  • a procura imediata do chão logo que sentem falta de espaço.

Uma liga com a outra. Transportando a bola numa só mão, a proximidade do contacto torna o passe mais difícil (mesmo havendo apoio) e o portador, para manter a posse da bola, atira-se para o chão - parando o movimento e dando enormes vantagens à defesa (cf. Ir para o chão? Não obrigado!).

A bola é para ser mantida viva e controlada pelo jogo de passes de uns para os outros, avançando no terreno, para aproveitar o mínimo desequilíbrio conseguido sobre a defesa. Desequilibrar a defesa e atirar-se para o chão é um esforço inglório - prejudica o movimento dos companheiros e só leva à recuperação defensiva.

sábado, 21 de novembro de 2009

MIGUEL PORTELA

O Miguel Portela faz de novo parte da Selecção Nacional. O que é bom.

Quem o conhece já adivinhava que a ida à selecção europeia traria de novo à superfície o animal desportivamente competitivo que vive nele. E com ele, a selecção só ganha: porque garante atitude e impõe atitude aos companheiros; porque traz inteligência e saber ao jogo. Porque, lendo mais depressa, adivinhando tempos, criará espaços que surpreenderão adversários.

Portela corresponde à definição de Jorge Valdano para bom jogador: aquele que encontra soluções para os companheiros e cria problemas aos adversários. Mas, acima de tudo, a sua presença demonstra que os responsáveis querem perante a Argentina A, e bem!, uma selecção diferente daquela que jogou contra a Namíbia. Um quinze capaz de utilizar criativamente a posse da bola, que jogue colectivamente, que avance e que deixe a pele em campo na procura do melhor resultado possível. E para isso, o exemplo de Portela é uma certeza.

quinta-feira, 19 de novembro de 2009

FABIEN GALTHIÉ

Cito de Fabien Galthié, francês, médio-de-formação, internacional, capitão da selecção nacional e, agora, treinador: digo sempre aos meus terceira-linhas que o apoio que devem fazer não é mais do que uma corrida: cada um deve, simplesmente, chegar primeiro do que o seu adversário directo.

quarta-feira, 18 de novembro de 2009

Ainda STUART DICKINSON

Das opiniões de Stuart Dickinson ressaltam ainda os seguintes conceitos:
  • o jogo pertence aos jogadores;
  • o árbitro é a trigésima-primeira figura do jogo, não a primeira;
  • as Leis do Jogo são para aplicar mas há momentos em que a lei não se aplica – ou seja, pode haver falta não marcável desde que esta seja irrelevante para a sequência do jogo, atendendo sempre que o essencial do jogo está na criação de tempo e espaço;
  • sempre que há prejuízo de uma equipa, a falta deve e tem que ser marcada;
  • proposta de sequência de avisos: avisar o jogador; aviso chamando o jogador e o seu capitão; cartão amarelo;

A questão central para a qual o árbitro deve garantir – e não ignorar – a aplicação das Leis do Jogo está no conceito de que, havendo prejuízo para uma das equipas, a penalidade correspondente deve ser marcada sem esquecer, obviamente, a aplicação da Lei da Vantagem. A qual – e porque o jogo pertence aos jogadores – deve poder ser recusada pela equipa não infractora (e se o gesto usual é tido por pouco estético (?!) que se defina outro!).

Para que não haja dúvidas sobre os diversos papeis e para que tudo possa melhorar dentro do campo lembro a juíza americana do Supremo Tribunal, Sónia Sottomayor, e cito: a tarefa de um juiz não é fazer a Lei, é aplicar a Lei. A dos árbitros também.

STUART DICKINSON, árbitro internacional

Tive oportunidade, juntamente com diversos árbitros portugueses, de assistir à sessão realizada com o árbitro australiano internacional, Stuart Dickinson. Vindo de arbitrar o Itália-Nova Zelândia e indo arbitrar o Portugal-Argentina A no próximo sábado, Dickinson veio falar-nos sobre a sua experiência de árbitro internacional, da aplicação das Leis do Jogo, da gestão do jogo – firm but fair - e da gestão dos jogadores – tratá-los como gostaria de ser tratado – da compreensão do jogo – o jogo trata da criação de tempo e espaço - do equilíbrio e consistência necessários – erros de julgamento mas não erros de leis - das vantagens de treinar nas sessões de treino dos clubes, da Lei da Vantagem – táctica ou territorial mas não, necessariamente, em simultâneo a que se junta a inteligência necessária para o seu limite temporal. Enfim, um manancial de conceitos, dicas e princípios, num diálogo muito interessante de seguir e com uma certeza: arbitrar um jogo de rugby não é fácil!

Estava curioso por conhecer a sua análise dos últimos dez minutos do Itália/All Blacks onde, pelas minhas notas e nas proximidades da área de ensaio neozelandesa, existiram:


E a pergunta – a mesma do capitão italiano Sérgio Parisse – foi: porque não marcou ensaio de penalidade favorável à Itália? A resposta foi directa: porque não os moveram!

A Itália rugbística inteira queria aquele ensaio, S. Siro queria aquele ensaio. Os jogadores também e bateram-se até ao limite do possível com a frustração final de se sentirem injustiçados. Mas tiveram sempre uma notável compostura - o desportivismo da aceitação, da boa-educação. O árbitro apitou de acordo com a informação que possuía naquele instante, não a das câmaras de televisão, não a do telespectador, não mesmo a de alguns espectadores. Tão pouco a das impressões dos jogadores. Decidiu, ponto!

O árbitro no rugby, como gosto de acentuar, tem sempre razão… mesmo quando erra! E nem sequer tenho a certeza que Stuart Dickinson tenha errado no seu julgamento. Mas sei que a Lei 10.3(b) foi cumprida.

sexta-feira, 13 de novembro de 2009

FIM-DE-SEMANA SOBERBO


Dos doze primeiros classificados do Ranking da IRB, dez jogam este fim-de-semana na Europa. Serão com certeza jogos de grande qualidade entre equipas muito próximas e cujos resultados poderão mexer com o ranking, posicionando as equipas de forma diferente da actual.
De acordo com a distribuição de pontos possíveis o quadro mostra as diferentes hipóteses de posicionamento das equipas conforme os resultados de derrota por menos ou mais de quinze pontos, empate ou vitória também por menos ou mais de quinze pontos.
No primeiro jogo do fim-de-semana a favorita África do Sul (1º-91,96), caso perca com a França (5º-81,48), trocará de lugar com a Nova Zelândia (2º-90,52) que não terá grandes problemas em vencer a Itália (12º-71,23).
A Irlanda (4º-83,27), recebendo a Austrália (3º-85,56) num jogo para qualquer resultado, só troca de posição vencendo por mais de 15 pontos – mas perdendo, pode descer dois lugares. A Inglaterra (8º-80,27) recebe a Argentina (6º-81,29) noutro jogo de difícil prognóstico mas que dará troca de posição com vitória inglesa. Gales (7º-80,38) defronta Samoa (11º-73,48) mas com a diferença pontual existente está obrigado a vencer só ganhando posição no ranking com derrota dos seus adversários pontuais, nomeadamente da Inglaterra. Suficiente para horas de conversa do terceiro-tempo dos aderentes. E no meio de todo este rugby, o Luis Pissarra e o Miguel Portela vão jogar numa selecção europeia comandada pelo Tomaz Morais contra os Barbarians franceses. Bonito.

quinta-feira, 12 de novembro de 2009

IR PARA O CHÃO? NÃO OBRIGADO!

Qual é a primeira preocupação de um defensor em relação ao portador da bola que o desafia? Derrubá-lo!
Porquê? Porque assim, para além de lhe impedir o avanço, abre uma possibilidade de recuperação da bola para a sua equipa.

Portanto: levar o adversário ao chão é um interesse da defesa. Com consequentes vantagens. Assim, deixar-se ir para o chão é um presente oferecido à defesa.

Se é assim, porque é que o portador da bola se deixa ir para o chão sem necessidade, nada fazendo para o contrariar e não recorre às técnicas que o poderiam ajudar a manter a bola viva?

Hábitos da formação ou insuficiente cultura táctica?












Em resumo pode dizer-se:
  1. Ir para o chão na posse da bola é um erro que só favorece a defesa. É uma benesse aos deuses defensivos – permite a reorganização, pára o movimento, cria superioridade numérica - e deve ser um último recurso a utilizar para manter a posse da bola;

  2. A bola deve ser mantida em jogo de passes tanto quanto possível – a melhor forma de desorganizar uma defesa, variando ângulos de corrida e sentidos de passe - e para isso existe uma panóplia de gestos técnicos que permitem, em situação de contacto ou pré-contacto, entregar a bola a um companheiro com espaço: passe-em-carga (off-load); meia-volta contacto (ou o contrário mas já dependente da relação directa de forças); passe-ecrã (screen pass)
  3. A continuidade do movimento do jogo de passes depende da inteligência da leitura do jogo e da capacidade da equipa de construir e organizar o apoio, adaptando-o a cada situação específica – por isso o rugby é o mais colectivo dos jogos de equipa e tem no losango o seu ADN.

  4. A regra de ouro para as equipas com pretensões de jogar rugby expansivo, divertido e eficaz deve então escrever-se assim: manter a bola viva até ao limite do ensaio.

segunda-feira, 9 de novembro de 2009

POSSE DA BOLA E TERRENO



A única qualidade que se reconhece à posse da bola por si só é a de impedir que o adversário marque pontos. Mais nada. Ter a bola e não conquistar terreno – ultrapassando a linha de vantagem – não cria dificuldades à defesa, não a desequilibra uma vez que esta – porque os defensores podem agarrar e derrubar, vulgo placar – passa a ter vantagem. Uma equipa para jogar, para correr os riscos inerentes ao ataque, precisa de ter terreno nas suas costas. O que só se consegue, conquistando no terreno. Tão pouco a posse, por si só, aproxima da área de ensaio adversária.

O objectivo de uma sequência é conquistar terreno, a posse da bola é uma consequência. Há jogos todos os dias em que o quinze com maior tempo de posse de bola acaba derrotado. O último foi no sábado: a Inglaterra, cheia de posse de bola, perdeu

domingo, 8 de novembro de 2009

UM SINAL DE ALARME

Portugal, contra a Namíbia, perdeu um jogo que lhe competia ganhar.
A selecção portuguesa apresentou no campo grandes lacunas e nunca foi capaz de mostrar a atitude necessária para vencer. E este terá sido talvez – dado que a Namíbia não é mais do que uma equipa capaz de cumprir aceitavelmente os princípios básicos – o maior problema demonstrado – porque é base de outros - e sobre o qual os jogadores terão que reflectir: o que querem ser? Uns auto-convencidos de grandes jogadores que morrem no campo em usos individualistas ou humildes e competitivos jogadores com a atitude colectiva que pode fazer deles uma equipa ganhadora? Foi com a segunda atitude que chegaram ao Mundial de 2007, não será com a primeira que chegarão ao Mundial de 2011…

Portugal, não saindo da sua “zona confortável”, não correndo quaisquer riscos aceitáveis, deixou que a Namíbia defendesse bem: incapaz de jogar em cima da sua defesa, nunca lhe colocou problemas que a testassem e deixou que os defensores lessem as intenções e se desmultiplicassem, garantindo a superioridade numérica no final da linha. Por isso a linha de vantagem, salvo raríssimas excepções, não foi ultrapassada.

E este é um dos muitos erros que Portugal mostrou ontem que necessita de imediata alteração táctica:

  • é errado pensar-se que para jogar no canal 3 se deve formar em profundidade. Para garantir espaço “à ponta” é necessário “fixar” o meio-campo adversário, obrigando-o a virar a linha de ancas para os seus próprios avançados – “para dentro”, como habitualmente se diz. De outra forma, a defesa consegue ler o movimento com cada um dos seus defensores a controlar visualmente e sem problemas o seu companheiro interior e a poder desmultiplicar-se construindo as sucessivas cortinas defensivas que vão impedindo o avanço eficaz dos atacantes. A regra táctica é simples: para atacar ao largo, as linhas atrasadas têm que jogar mais próximas da linha de vantagem, posicionando-se mais “em linha” – com pouca profundidade – e recebendo a bola já lançados, competindo nomeadamente ao abertura, é mesmo uma exigência de eficácia, lançar a sua linha atacando o passe do formação e recebendo-o tão próximo quanto possível da linha de vantagem. Então sim, a defesa estará fixada e a construção do losango – um apoio de cada lado e outro em profundidade - será decisiva para ultrapassar a defesa contrária.
Aos médios compete gerir o jogo. Ao formação exige-se constância e consistência na procura do espaço livre, ao abertura exige-se a capacidade de ler e jogar de forma a garantir a manutenção desse espaço para a melhor utilização dos seus companheiros – com ainda a obrigação de inventar espaço se ele, aparentemente, não existir. O que exige, ao contrário do que vimos ontem:
  • capacidade de realizar passes rápidos – tirar a bola depressa - dos pontos de quebra do movimento - e cuja primeira responsabilidade diz respeito à técnica de contacto do portador da bola;
  • capacidade de jogar na cara dos defensores para impedir o seu deslizamento – resultado de bolas rápidas nos reagrupamentos ou da preocupação de conquista do intervalo entre linhas;
  • ter um jogo ao pé objectivo – joga-se ao pé para conquistar terreno, chutando para o espaço vazio e criando problemas aos adversários (ontem foi confrangedor o número de pontapés entregues nos braços dos adversários…)
A selecção nacional, julgava, tinha adquirido uma capacidade de utilização da bola nas recuperações que constituía uma eficaz imagem de marca. Por incapacidade do jogo no chão essa capacidade perdeu-se… e urge garanti-la. Com disciplina, concentração e atitude. Tão pouco é admissível que jogadores internacionais com a experiência que os portugueses já têm, cometam erros tácticos elementares como falhar o jogo de passes em situações de superioridade ou ignorar manobras de in/out no final da linha. A sua resolução passa, obviamente, por exigências de concentração competitiva e responsabilidade colectiva.

A solução para estes momentos em que as equipas parecem descrer e decrescer – e a derrota com a Namíbia representa um sinal de alarme – estão, como ensina Jorge Valdano, em procurar a caixa negra e ir às fontes, ou, como lembra Clive Woodward na mnemónica T-Cup do seu Thinking Correctly Under Pressure, imitar os campeões quando as coisas correm mal e voltar às bases para recomeçar.

O colectivo é sempre o mais importante. A equipa não se faz com uma parte à espera da outra parte – a divisão entre forçados e bailarinos não passa de um mito e apenas caracteriza equipas fracas e vulgares. A equipa é um todo que deve valer mais do que a soma das suas partes. Se existem problemas no cinco-da-frente para se impor ou para não se deixar dominar, compete ao resto da equipa encontrar as soluções necessárias para inverter as situações. Físicas, psicológicas, tácticas… Não desistindo! Nunca!

sábado, 7 de novembro de 2009

FINAL DA CURRIE CUP

O jogo da final da Currie Cup entre os Blue Bulls e os Cheetahs foi muito bom. Com uma dinâmica excelente, grandes momentos de combate colectivo e demonstrações de elevada técnica e táctica individuais. Mas principalmente porque aquilo que faziam os jogadores em campo traduziu sempre uma correcta aplicação de princípios básicos do jogo. Assim:

  • preocupação de só passar a bola para companheiros lançados;
  • preocupação de manter a bola viva em situações de contacto, procurando, antes de chegar ao chão, passá-la a um companheiro. E se no chão, libertando a bola de imediato e em condições de manter a sequência do movimento;
  • jogo no chão de acordo com as Leis do Jogo, fazendo muito poucas faltas;
  • o jogo ao pé nunca foi utilizado para “despachar” a bola mas sim para colocar problemas ao adversário e para conquistar terreno. Cada pontapé tinha um propósito claro e ofensivo;
  • a preocupação defensiva foi sempre a de levar o adversário ao chão – ou seja a de o placar;
  • a preocupação permanente de, ao ocupar o território adversário, só admitir a retirada com pontos na bagagem - como aliás recomendava Sun Tzu quando preconizava que um bom exército se alimenta no território inimigo.

Boa vitória do Blue Bulls que soube aproveitar todas as oportunidades que teve sem esquecer que quem tem na sua equipa um jogador do gabarito do Fourie du Preez corre sempre o risco – como diria Mário Wilson – de ganhar qualquer campeonato.

sexta-feira, 6 de novembro de 2009

PORTUGAL-NAMÍBIA

A metodologia do Ranking da International Rugby Board, equilibrada, tendo em atenção a capacidade demonstrada por cada uma das equipas ao longo do tempo e não permitindo vantagens abusivas entre equipas de níveis distintos, define para o jogo Portugal-Namíbia um risco maior para os portugueses – sendo, aliás, o único jogo de risco classificativo desta janela internacional de Novembro.

Colocado no 20º lugar com 62,16 pontos de ranking, Portugal encontra-se melhor colocado que a Namíbia – 25º lugar com 56,60 pontos de ranking. Significa isto que Portugal é favorito. Jogando em casa, o intervalo de avaliação – diferença entre pontuações – sobe de 5,56 para 8,56 pontos de ranking e, consequentemente, faz subir as obrigações desportivas. Nesta situação pode dizer-se que no estrito plano teórico e para que o jogo traduza a realidade classificativa, Portugal deveria vencer por uma diferença de cerca de 17 pontos de jogo (equivalente a uma superioridade sobre o adversário de mais 2 ensaios transformados e um pontapé de penalidade ou de ressalto convertidos).

Ora, este entendimento – que constrói para cada nível de resultado uma quantidade de pontos a trocar entre vencedores e vencidos – leva a que na formulação dos pontos para a classificação do Ranking da IRB, Portugal tenha, do intervalo dos pontos de troca em disputa, uma menor parte no caso da sua provável vitória, recebendo a Namíbia, no caso da sua improvável vitória, cerca de 13 vezes o valor destinado aos portugueses. É o aceno da cenoura para estimular a façanha.



Embora só seja possível uma troca de posição entre os dois países se a Namíbia vencer por mais de quinze pontos de diferença, o resultado do jogo irá ter repercussões na classificação geral e na relação com outros países.

Assim, a vitória da Namíbia dar-lhe-á desde logo a possibilidade de subir 2 lugares e atingir a 23ª posição, ultrapassando Coreia e Chile. Caso a vitória seja por mais de 15 pontos de diferença, a Namíbia subiria para o 21º lugar, ultrapassando ainda Espanha e Portugal.

Vencendo, Portugal manterá a mesma 20ª posição mas, perdendo ou empatando, cederá o lugar ao Uruguai (21º com 61,97 pts.) e, como se viu, perdendo por mais de 15 pontos de diferença, descerá dois lugares passando a ocupar o 22º lugar atrás do Uruguai (20º) e da Namíbia (21º).

Ou seja, num jogo deste tipo, com adversário com posição inferior e menos pontos de ranking e jogando em casa, o risco é todo do melhor classificado. Que fica com a obrigação de ganhar.

quinta-feira, 5 de novembro de 2009

PARAR A DEFESA E GANHAR ESPAÇO

Num jogo de fraco nível, Agronomia-Direito, poucas foram as vezes que a Linha de Vantagem foi ultrapassada.
Um dos pouquíssimos momentos interessantes, ainda na primeira parte, foi protagonizado por Miguel Portela que, perfurando a defesa adversária conseguiu criar uma situação em que o ensaio parecia praticamente feito. Depois de ter ultrapassado a primeira cortina defensiva num belo zigue-zague, Portela, tendo um companheiro do lado de fora e muito próximo da linha lateral, teve que manobrar contra uma segunda cortina defensiva e em corrida lateral. No momento que entendeu por adequado, passou a bola e viu o companheiro ser blocado e depois placado por dois adversários. O ensaio foi-se. Porquê?

Ao passar a bola, Portela deu a certeza aos defensores do papel defensivo que teriam de desempenhar e que competiria a cada um: com um deles a cobrir o interior, lançaram-se, sem grandes dúvidas, para cima do receptor do passe. Poderia Portela ter feito outra coisa? Duvidoso: se não desse a bola, morreria com ela ás mãos de uma cada vez mais próxima defesa deslizante.

Portanto a solução eficaz da situação exigia que fosse colocado um problema aos defensores. Impunha-se fazê-los duvidar. Como?

O companheiro de equipa do Portela que se tinha, e bem!, mantido à distância e próximo da linha lateral para “abrir” a defesa deveria ter alterado o ângulo da sua linha de corrida e aproximar-se (IN) do portador da bola, obrigando os defensores em corrida lateral a abrandar pela necessidade de impedir a penetração interior. Recebida a bola e tendo abrandado a defesa, o receptor do passe – batendo o pé - sairia para fora (OUT) para explorar, em velocidade, o espaço então criado. Os defensores, tendo perdido velocidade, pouca possibilidade teriam de o apanhar e o ensaio estaria garantido.

REGRA PRÁTICA: Ataca-se a cortina defensiva lateral correndo na sua direcção. Com dois objectivos em simultâneo:
- Abrandar a corrida dos defensores pela dúvida que se lhes coloca;
- Arranjar espaço no exterior que possa ser explorado, pelo próprio ou por um companheiro, utilizando, se necessário, um cruzamento.
É o velho IN-OUT em funcionamento, domínio táctico de qualquer jogador evoluído.

terça-feira, 3 de novembro de 2009

FORA-DO-JOGO

Leio na decisão do Conselho Jurisdicional acerca do jogo da final do Campeonato Nacional 2008/2009: “O jogador arguido, que é de grande estatura, atinge o jogador da AEIS Agronomia, que é de estatura substancialmente menor, com agressividade, mas de forma legal, dentro das regras que regem o jogo de rugby.”
Pode esta formatação da decisão ser considerada muito “politicamente correcta” pela aparente preocupação de tentar mostrar argumentos que a sustentem (?!). Mas, mais do que tudo, demonstrando ignorância sobre o jogo e seu enquadramento, está fora-do-jogo.
Nada na estrutura que define e enquadra o jogo de rugby autoriza o recurso às particularidades de cada jogador para estabelecer juízos de legalidade sobre as acções do jogo.
Veja-se:
O Código do Rugby (Playing Charter) que pretende ser um modelo da referência a respeitar por todos aqueles que se relacionam de alguma maneira com o jogo de rugby estabelece no seu capítulo “Os Princípios das Leis do Jogo”, no pontoUm jogo para todos” que: “As Leis do Jogo dão a oportunidade a que jogadores de qualquer estrutura física, […] possam participar no jogo de acordo com as suas capacidades e num ambiente controlado, competitivo e agradável.”
As faltas existem ou não de acordo com o corpo regulamentar constituído pelas Leis do Jogo e pareceres técnicos da IRB enquadradas globalmente pelo Código do Rugby. Chamar à colação outro tipo de argumentação é, para além de pretensioso, mais um passo na retórica da confusão…
… E se os árbitros levassem isto a sério… como apitariam?

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