segunda-feira, 2 de agosto de 2021

UM JOGO DIFERENTE?

O trabalho da tradução das Leis do Rugby de 2018 que tenho feito com o Jorge Mendes Silva (Jójó), o Nuno Miranda e o Ferdinando Sousa tem-me lembrado o Bill Beaumont e a frase que me disse no Estádio Universitário quando lhe mostrei a Lei em inglês que, na escrita, contrariava a sua certeza: "Isso não interessa nada, nós jogámos assim!" e o "assim" correspondia à interpretação que faziam e não ao que estava escrito no livro das Leis do Jogo. A diferença entre o valor do costume e o conceito que nos rege transferida para uma visão imperial que o sir pretendeu impôr a um mero comendador republicano...

Uma das maiores dificuldades da tradução das Leis do Jogo esteve no facto de que a sua escrita nem sempre corresponder ao que está definido ser o que se passa em campo. Daí e porque o Rugby não é património bife e ser jogado por mais de uma centena de países — são 110 os países que compõem a lista do ranking da World Rugby — termos feito uma série de recomendações de melhoria da compreensão das redacções com maior aproximação à realidade do jogo que enviamos, com conhecimento e autorização da Direcção da FPR,  aos serviços competentes da World Rugby. Imperialmente ainda não recebemos qualquer resposta... 

E é claro que a tradução googliana para português do Brasil não nos serve.

A questão essencial das Leis do Jogo é esta: ninguém consegue, ao contrário do futebol por exemplo, aprender o jogo lendo o livro de Leis. E para quem diz que pretende a sua ampliação global, estamos conversados... E a redacção das Leis Experimentais realizada pelos experts da World Rugby, não vem ajudar nada na compreensão do jogo.

Como sabem aqueles que estão mais próximos do jogo, houve alterações experimentais às Leis do Jogo que entraram em vigor a 1 de Agosto e que dizem respeito aos seguintes conceitos: a) 50:22 - um pontapé dado dentro do meio-campo do chutador e que faça a bola sair indirectamente (bola bater no chão ou num adversário) pelas linhas laterais da área-de-22 adversária dará o direito à sua equipa ao lançamento da bola no alinhamento consequente — ou seja modifica-se o conceito estratégico de conquista territorial; b) ao recomeço do jogo por um pontapé de ressalto sobre ou atrás da linha-de-ensaio sempre que a bola fôr colocada dentro da área-de-ensaio por jogo ao pé ou por transporte e que haja um toque-no-chão da equipa defensora ou ainda por adiantado do atacante — mas nada se dizendo sobre outras resoluções para saídas de bola pelas linhas finais das área-de-ensaio; c) acabar definitivamente com a já proibida carga-de-cavalaria que víamos fazer com a formação de grupos de jogadores que recebiam a bola praticamente já lançados e que se agarravam ao novo portador da bola para romper as linhas defensivas normalmente na sequência de um reagrupamento; d) Limitando a apenas um jogador a ligação ao portador da bola, nomeadamente nas situações de pick-and-go, para evitar colocar o defensor numa perigosa insegurança física.

Estas Leis experimentais vão provocar alterações estratégicas ao jogo — pense-se na nova possível exploração do jogo ao pé com a 50:22 e como se poderá evitar a exploração do recomeço sobre a linha-de-ensaio — que poderemos perceber já no próximo Nova Zelândia - Austrália.

Se a adaptação, não sendo bem preparada, poderá criar problemas, a falta de clareza das leis pode criar maiores problemas à arbitragem e à compreensão táctica do jogo. E a nossa próxima época internacional será decisiva para garantir o caminho para o Mundial 2023…

Acresce a estas complicações que, por falta de clareza de definição na introdução das Leis Experimentais, haverá uma forte hipótese — se não houver o acrescento necessário que determine a não aplicação da 50:22 aos Sevens — que o último jogo da variante como a conhecemos tenha sido, num jogo de grande qualidade táctica, a final feminina Olímpica de Tóquio 2020 Para aqueles que gostam de ver a variante como um jogo de velocidade, de demonstração de habilidades técnicas e boa leitura espacial e das debilidades posicionais defensivas, a possibilidade de utilização da 50:22, transformando o Sevens num mero jogo de pontapés de conquista fácil de território, é real. 

Que esta imagem que se publica não se transforme — para o que é necessário que os legisladores acordem a tempo —na saudade do Sevens que gostámos.

As novas Leis Experimentais serão o adeus aos Sevens clássicos?


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