sexta-feira, 23 de agosto de 2013

TRÊS QUE SÃO QUATRO

Nos jogos que vimos no passado sábado, ouvimos os árbitros transformar a Lei dos Três Tempos – crounch, bind, set – em quatro tempos. Com os árbitros – Craig Joubert no Austrália-Nova Zelândia e Chris Pollock no África do Sul-Argentina – a darem a ordem de introdução da bola: Yes, now!.

Estão fora de causa as óbvias vantagens destes três tempos: as formações-ordenadas (FO) mostraram-se mais seguras, com menos colapsos, menos repetições – incluindo, ao que se sabe, os jogos do campeonato francês – e portanto com o primeiro e essencial objectivo – a segurança – a ser atingido. A porca torce o rabo é na sequência.

Haverá verdadeiramente uma possibilidade de disputa de bola de acordo com os princípios que resultam do Código do Jogo (ver aqui)?

É ridículo ouvir-se o árbitro dar ordens que influenciam decisões tácticas a jogadores de grande experiência e que estão no campo a procurar conseguir o melhor resultado de cada momento do jogo. O momento zen atingiu o máximo expoente com Craig Joubert, qual mestre-escola de jardim infantil, a encher o estádio e os ouvidos de milhares de telespectadores com um “Perfect!” a mostrar o seu contentamento pela dita, a seu ver, boa realização dos jogadores envolvidos; melhor não foi ver-se o médio-de-formação sul-africano, com a bola nas mãos, a olhar, durante uma eternidade, para o árbitro, esperando a sua ordem/autorização.

E pior de tudo foi perceber-se que nem todos – como se viu no África do Sul – Argentina por diversas vezes – vão recorrer sempre à voz de quarto tempo.

A confusão prepara-se… A quarta ordem cria problemas de ordem táctica que viciam o jogo e os seus princípios e que podem ter consequências de deslealdade ou violação do espírito do jogo. Explico-me:

Desaparecendo a força do encaixe que deixa de ser influente na conquista, voltámos, na FO, ao comando da técnica. Como aconteceu – e como deveria ter continuado a acontecer - durante um largo período temporal da história do jogo. A esta situação junta-se a preocupação - em acordo, nunca alterado aliás, com as Leis de Jogo – de que a bola seja introduzida na FO no meio do corredor formado pelas primeiras-linhas em oposição. Esta “nova” situação implica o retorno de um especialista esquecido, o talonador – cujo nome deriva da sua capacidade técnica de desviar a bola na formação-ordenada com o calcanhar (talon em francês). Ou seja: a equipa que beneficia da introdução da bola e em inferioridade de peso vai ter – como já teve – de encontrar técnicas, tácticas ou tempos que lhe permitam confrontar-se contra a força desenvolvida pelo conjunto adversário de oito homens. Porque é assim que vai ser: aquele que beneficia da introdução da bola terá sete jogadores disponíveis para empurrar – o talonador terá um pé no ar e em movimento – enquanto que o seu adversário terá oito jogadores de pés assentes no chão e prontos para empurrar. O que lhe dará óbvia vantagem na força de mais cerca de 100 quilos!

Mas a FO não serve para reiniciar o jogo após falta “leve”, pergunto?! Então como é que o infractor se torna, como parece, beneficiado?

Para o evitar – para que não exista benefício do infractor – só vejo duas soluções: uma – se continuar a haver o quarto tempo da “licença” do árbitro - com a introdução da bola torta (o que aliás bem se viu em qualquer dos jogos da Rugby Championship) como garantia de conquista em tempo útil; outra, deixando ao formação da equipa não infractora a decisão do tempo de introdução da bola, ganhando assim a sincronização necessária que permita à sua equipa uma vantagem – de acordo com o Código do Jogo, repete-se – sobre o empurrão colectivo adversário. Obviamente que a resposta que se procura está na segunda hipótese.

Não é por acaso que se volta a falar do Canal Um. A relação de forças entre os dois blocos de avançados exige – desde que o movimento da talonagem esteja sincronizado – um tempo muito curto de percurso da bola porque a resposta ao empurrão de oito obriga ao bloquear dos joelhos da segunda-linha da equipa introdutora e nem sempre esse bloqueamento é conseguido em tempo útil. No fundo, sabe-se: existem respostas técnicas e tácticas para a proposta dos três tempos. O que não parece haver é o bom senso de não exagerar com intervenções que, montadas em salas, nada beneficiam o jogo. Com consequências nefastas…

…que se traduzirão no apagar da letra da regra e que se jogarão como sempre se jogaram – da forma que o jogo pede e que o resultado exige. Mas, no caso, com prejuízo de alguém. Dos mais fracos, como sempre.

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