As duas finais das categorias da Divisão de Honra e de Sub-23 - a primeira plena de internacionais, a segunda com bastantes futuros internacionais - fecharam bem a época 2013-2014 de rugby de XV. Foram dois jogos interessantes com resultados finais de acordo com o que se passou no campo.
Mas em ambos os jogos ressaltaram as actuais carências do jogo português. Começando logo por se verificar, na final maior e apesar de uma intensidade de jogo muito razoável com placagens capazes e duras e com difíceis tentativas de conquista de terreno, pouca continuidade das acções do jogo que tiveram intervalos de paragem que retiraram ritmo e permitiram demasiadas recuperações aos intervenientes. O que significa que a intensidade que se verificou foi separada por enormes intervalos de recuperação. Facilitando a vida aos jogadores e reduzindo o esforço necessário e colocando estas sequências em traço-ponto a uma enorme distância daquilo que é exigível no nível internacional e que, pelo hábito, acaba por se transformar numa incapacidade sempre que defrontamos adversários estrangeiros.
Pôde ver-se ainda e em qualquer destes jogos de finais a dificuldade que as linhas atrasadas têm para atacar a "linha de vantagem". Jogando parados à espera que a bola lhes chegue às mãos para arrancarem depois, os jogadores dão todas as vantagens à defesa. E se, no jogo mais importante, houve por parte dos cdulistas uma maior capacidade de ataque à defesa - apesar de muito afastado da "linha de vantagem", Pedro Cabral é ainda o único abertura português que procura interpretar eficazmente o conceito. E o problema maior é este: o angulo de passe formação/abertura é demasiado aberto para que o abertura possa receber a bola lançado e assim, para além de colocar dúvidas à defesa, poder fixar os homens da terceira-linha defensora que, desta maneira, terão maiores dificuldades em participar na defesa do meio-campo, libertando assim espaços no terreno.
Se o passe do formação não for feito num ângulo reduzido em relação à sua posição inicial todas as combinações executadas serão feitas longe da "linha de vantagem", quer a uma distância que permite o deslizamento dos defensores para tapar os espaços, quer dando a possibilidade da defesa invadir o campo atacante, diminuindo as hipóteses do apoio atacante ao cortar linhas de passe. Ou seja, a forma como se desenrola táctica e geralmente o jogo português favorece sempre, pela incapacidade de conquistar a "linha de vantagem", a defesa. Nomeadamente porque as combinações em que se utilizam ao lado do abertura um/dois jogadores como "chamarizes" para jogar com uma segunda linha atacante - espécie de moda internacional - não criam qualquer problema aos defensores por não fixarem ninguém: o segredo da eficácia destas combinações está no facto de a bola ser jogada por jogadores que, lançados e em movimento antes da recepção da bola, fixam defensores e, por isso, criam superioridades numéricas e/ou aumento de espaço livre. Esta incapacidade de ataque eficaz à "linha de vantagem" e de recepção da bola por atacantes lançados numa quase corrida de estafetas - isto é, o receptor recebe a bola praticamente na linha do passador - é, infelizmente, quase uma marca do jogo português. Passar na linha e receber lançado é o primeiro passo para poder atacar intervalos - pelo portador ou por um outro jogador em apoio. O que exigirá também capacidade de passe em tempo, trajectória e distância úteis. Particularidades exigentes mas que pagam dividendos, nomeadamente uma boa capacidade de passe longo, tenso e com a velocidade suficiente que ultrapasse a velocidade da corrida de adversários.
O apoio é decisivo na continuidade do movimento e raramente é bem executado no jogo português. Para o que se detecta uma razão principal: o não considerar o portador da bola como o líder temporário do movimento, marcando o sentido, a direcção e a distância dos apoios organizados em laterais e axiais - com esse losango a portar-se como um bando de estorninhos capazes de responder à mínima alteração de movimento ou direcção. O que exige que os jogadores em apoio estejam disponíveis para abrirem "linhas de passe" quer aproximando-se do portador, quer atrasando o seu posicionamento, isto é: que estejam disponíveis para facilitar a vida ao portador da bola - o único dos trinta jogadores que pode ser agarrado, placado ou derrubado e que, por isso, merece atenção especial. De uns e de outros, de adversários e de companheiros. Esta deficiência do posicionamento em apoio em tempo útil e que traduz dificuldades na compreensão colectiva do jogo, não permite eficácia ao jogo português e, nestas finais, não faltaram exemplos de situações desperdiçadas por estas mesmas razões.
Se a estas deficiências juntarmos a habitual dificuldade de fazer do jogo-ao-pé uma arma de conquista de terreno e de criação de problemas à defesa, atingindo espaços vazios e obrigando ao recuo de defensores, teremos uma boa panóplia de objectivos a alterar no treino e formação de jogadores. Treinando de acordo com as necessidades e definindo os objectivos e metas a atingir. Porque, como diz o titulo do recente livro de Jorge Araújo, "Tudo se treina". E a questão que se coloca ao jogo português é garantir o treino dos aspectos técnicos e tácticos que, transformando, o tornem eficaz de acordo com as características e capacidades dos jogadores portugueses.