sexta-feira, 30 de outubro de 2015

MEIAS-FINAIS: DIÁRIO DE BORDO (II)


Twickenham foto iPhone JPB
No dia seguinte, domingo, o mesmo percurso com a vantagem do já conhecido: almoço de hamburgueres, metro e combóio - desta vez encontrei o também neozelandês Mannix (treinador do Pau) com quem falei do Samuel Marques - mais andarilhar rodeado pelo excitamento argentino e a confiança australiana com encontro obviamente marcado para a estátua do alinhamento à entrada do estádio. Por quem torce? perguntou um vizinho: pela Argentina do meu amigo Daniel. Mas não tinha uma fé por aí além. A experiência australiana era superior e as suas linhas atrasadas são muito boas. E os pés, direito e canhoto, de Foley e Giteau são capazes de manter a pressão territorial necessária. 

Como irão os argentinos, sob a vista do fabuloso Maradona, conquistar e ocupar terreno?

Aconteceu o que temia, apesar do muito maior domínio, os argentinos não conseguiram mais do que marcar penalidades. A usar o já referido sistema galês, o resultado final seria de 32-10 favorável aos australianos apesar de pertencer aos argentinos o domínio estatístico: 55% de posse da bola, 54% de território, 144 transportes de bola para 577 metros contra 100 transportes para 358 metros australianos, superioridade nas formações ordenadas. O que não deixa de ser estranho. Como é possível tal domínio e perder sem apelo? Razões do resultado? servirá a maior eficácia defensiva australiana com 83% contra 78% para explicar tudo? Creio que não.

O que terá tornado o jogo argentino ineficaz foi o seu conceito de jogo de ataque e, nomeadamente, o seu jogo ao largo. Mas a principal razão da derrota esteve na errada estratégia defensiva utilizada.

A Argentina saiu do balneário com uma ideia: marcar primeiro e pôr os australianos atrás do prejuízo. Situação onde serão, pensa-se, mais vulneráveis. Mas esta ideia, mista de confiança absoluta e risco, provocou o primeiro erro: a intercepção de Simmons para o primeiro ensaio. Jogar uma combinação nos primeiros minutos de jogo com passe interior à saída da área de 22 é muito risco para uma meia-final. É tentar o diabo, principalmente se o mundo inteiro já tinha percebido que esse movimento tinha criado dificuldades aos neozelandeses. E os australianos também o tinham percebido e fizeram o trabalho de casa: Simmons teve o prémio de ter cumprido o papel que o treinador lhe tinha destinado.

Meia dúzia de minutos depois uma defesa longe da lição das duas equipas do dia anterior que foram exemplares no cumprimento da regra defensiva de primeiro igualar e só depois subir, os argentinos preferiram uma defesa pressionante - blitz defence - que, pretendendo contrariar a circulação da bola à largura do campo, não conseguia igualar o número de atacantes nem ocupar todos os corredores e permitia assim que Foley, com um passe longo, abrisse caminho para um novo ensaio. Para, mais à frente e numa repetição simétrica, um passe longo de Giteau permitir novo ensaio. Resultado final: 4 ensaios sofridos contra nenhum marcado. 
Twickenham foto iPhone JPB

A ideia dos argentinos de ataque permanente pelas linhas atrasadas estava tão entranhada que pudemos assistir, após notável formação ordenada no limite da sua área de 22, que empurraram, dominaram e rodaram, afastando a 3ª linha australiana de qualquer possibilidade de intervenção e que fizeram? saída de nº8 sem sequência de 6 e 7 para atacar o canal livre e, em vez disso, passe para a linha de 3/4 que se viu, como seria natural, confrontada, sem qualquer vantagem, com o equilíbrio numérico. E assim se perdeu a última oportunidade para aproximar ou igualar o resultado.

A Austrália mostrou também ao que vinha em cada pontapé de recomeço: pontapé para a entrada dos 22 adversários com uma linha à largura do campo a subir rapidamente (quanto Foley pontapeia a bola passam por ele uma organizada linha de onze jogadores em alta velocidade) para pressionar - em superioridade numérica - os defensores argentinos, levando-os a chutar ou a cometer erros. Ou seja: colocar o jogo dentro do território argentino para tirar, como aconteceu, partido do risco.

Ao contrário dos neozelandeses que atacam intervalos em grande velocidade, procurando juntar defensores para abrir maiores intervalos, mas continuando a circular a bola sempre que a defesa fecha, os argentinos procuraram sempre a penetração em qualquer situação - mas sem capacidade de escalonar ou criar a profundidade necessária para garantir velocidade atacante e eficaz ultrapassagem da linha defensiva - a que faltou depois o apoio, a convergência, para garantir a continuidade para exploração do desequilíbrio. E assim as suas 56 ultrapassagens da linha de vantagem (contra 43 dos australianos) de nada serviram para chegar à área de ensaio.

A Argentina tinha enormes esperanças na vitória mas sobreviveu apenas através das faltas que conseguiu provocar e graças às excelentes qualidades de pontapeador do abertura Sanchez que lhe deu sequência pontual.

No final, as lágrimas de Daniel mostravam a enorme desilusão do campo argentino. Mas fica, pelo muito que se viu nos jogos efectuados, a certeza que, limadas arestas e com a maior experiência que o Super 18 lhes vai proporcionar, a equipa para 2019 será uma séria candidata. Como Daniel quer e apostou.

Retorno à cidade, desta vez de comboio. Jantar em restaurante italiano - óptima sopa - dormir e levantar às seis para, de novo, hora e meia de viagem para o aeroporto. No aeroporto de Stansted uma quase hora para ultrapassar as medidas de segurança aeroportuárias. Depois o habitual: ter que percorrer o prepositado caminho que passa por todas as montras da free-shop e deparar com um aviso: a porta para o voo para Lisboa está à distância de 12 minutos a pé. Sete horas depois da alvorada, chegamos a casa: Lisboa.  

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