Porque o "ensaio" - principal objectivo do jogo de rugby - é marcado lá ao fundo, na "área de ensaio", atrás da equipa adversária que pode agarrar e derrubar - sempre com os braços e nunca acima da linha dos ombros - o portador da bola que a transporta ou a passa - sempre para trás - para que a sua equipa possa marcar pontos, o rugby caracteriza-se assim por ser um jogo colectivo de combate organizado para a conquista de terreno. E sendo um combate colectivo mas também e apenas um jogo deve possuir um conjunto de regras que o limitam e um corpo de valores que lhe déem dimensão ética.
Porque "quinze" é o número do nosso jogo - pesem os sevens ou os tens - também quinze são os valores que nos enquadram. E que podem vestir as camisolas do 1 ao 15 como se se posicionassem no terreno como avançados, médios e três-quartos. Como se fossem uma equipa. Assim alinhada:
1. Criatividade porque o rugby nasceu de um gesto de rebelde criatividade de William Webb Ellis quando, no colégio de Rugby e a meio de um jogo de futebol, pegou na bola com as mãos e correu com ela em direcção à baliza adversária;
2. Lealdade porque não há qualquer hipótese de participar num jogo colectivo de combate sem a garantia de que há uma permanente lealdade de atitudes e gestos entre os contentores;
3. Abnegação porque não é possível participar num combate colectivo sem que haja um apagamento do "eu" em favor do "nós";
4. Solidariedade porque sendo um desporto colectivamente exigente como mais nenhum outro, o rugby exige que os membros de cada uma das equipas sejam capazes de ajudar a resolver qualquer problema com que um seu companheiro se confronte;
5. Desportivismo porque se trata de um jogo, como gostamos de fazer constar, de "cavalheiros", exige-se a existência de um código que se traduza pelas boas práticas desportivas;
6. Disciplina porque como jogo colectivo de combate, cada atitude, cada gesto, deve manter-se no quadro de referência das Leis do Jogo;
7. Autodomínio porque complexo como é, com os movimentos que exige, com a luta a que obriga, com a mudança constante para diferentes papéis que impõe, exige uma enorme capacidade de concentração, mantendo-se sempre focado nos princípios fundamentais no jogo;
8. Respeito porque sendo um jogo de combate exige que saibamos considerar o adversário como um parceiro sem o qual não há hipóteses de jogo;
9. Espírito de Equipa porque não é possível intervir num jogo colectivo de combate sem uma forte união determinada pelos objectivos comuns que marcam o carácter da equipa a que pertencemos;
10. Coragem porque a luta que se trava neste combate colectivo exige, quantas vezes, acções só possíveis em nome de valores mais elevados do que a nossa própria e imediata segurança;
11. Partilha porque se trata de um jogo colectivo onde cada momento, cada conquista, cada avanço é expressão do todo mesmo quando aparenta ser obra de um só;
12. Combate porque é disso que o jogo trata: combate pela conquista da bola, pela recuperação da bola, pela conquista de terreno, pela conquista do espaço livre, pela conquista da superioridade numérica. Pela conquista de pontos.
13. Sacrifício porque sendo colectivo e de combate o rugby impõe, muitas vezes, que o jogo tenha primazia sobre o que sente o corpo, impondo a resiliência e a assertividade ao comodismo da desistência. Apaixonadamente, claro!
14. Divertimento porque se trata, afinal de contas, de um jogo e como tal deve deixar satisfeitos os seus intervenientes que devem dar o seu tempo por bem empregue de uma forma alegre e responsável;
15. Boa-educação porque sendo o rugby um jogo colectivo e de combate exige que exista entre os participantes uma relação, embora de elevado grau competitivo, de cordialidade para que a sua expressão não ultrapasse os limites da cidadania.
Quinze de cada lado irmanados dos mesmos quinze valores. O jogo de rugby só é rugby no combate colectivo organizado pela conquista de terreno quando é assim.
(Publicado no p3.publico.pt/raguebi a 7/02/2014)