quarta-feira, 6 de julho de 2022

NÃO BENEFICIAR O INFRACTOR, GARANTIR A BOA APLICAÇÃO DAS LEIS

Vídeo apresentado na conferência proferida na reunião do Conselho de Arbitragem
 

É uma evidência que as Seleções Nacionais fazem faltas a mais, quer no Sevens, quer no XV. E como se isto não bastasse há ainda o mau hábito de refilar com o árbitro ou assistentes, desfocando da bola e do movimento dos adversários para deixar intervalos que eles, de imediato, exploram. E estes defeitos resultam do facto da arbitragem nos campos portugueses não ser idêntica à arbitragem internacional — de que resultam óbvios, como se tem visto — não há “penaltis-maul” se não houver penalidades que transportam o jogo para os 5 metros da linha-de-ensaio — prejuízos para os nossos resultados internacionais

É portanto necessário reorganizar a nossa arbitragem e garantir que na Divisão de Honra, nos Sub-19 ou nas equivalentes femininas, não existem formas ou entendimentos diferentes daqueles utilizados no patamar internacional.

A convite da Conselho de Arbitragem, fui fazer, aos árbitros portugueses que entenderam estar presentes no Jamor, uma conferência sobre este tema a que dei o nome de “Arbitrar no Rugby de Rendimento”.

Comecei por lembrar a inserção do Rugby e seus Agentes no Sistema Desportivo, o que representa o Desporto e quais os seus valores e exigências como Compromisso, Responsabilidade, Mérito e Coopetição (mistura dos domínios de Competição e Cooperação que existem no mesmo campo embora não em simultâneo, ex: um jogador compete com os seus companheiros para ter lugar na equipa mas coopera com eles em nome da equipa). 

A Competição exige Equilíbrio — por isso o Desporto se hierarquiza por divisões — e a importância do Árbitro é tal que, sem ele, não há jogo. Sendo a sua importância elevada, deve estar enquadrada numa Ética de Arbitragem que tem os seus domínios, como lembra Michel Lamoulie, formador e treinador internacional de árbitros, na Justiça, Lealdade e Imparcialidade. O que exige que aos árbitros se saibam dar ao Respeito para o que devem responder às Necessidades do Jogo, com Conhecimento do Jogo, Conhecimento das Leis do Jogo, Condição Física e Condição Técnica.

Sendo o “Rugby um desporto colectivo de combate organizado para a conquista do terreno com o propósito de marcar ensaios”, os árbitros devem conhecer as consequências tácticas das suas acções e evitar a todo o custo, as prejudiciais ao desenvolvimento do jogo. Assim devem reconhecer que o jogo — como aliás as próprias Leis do Jogo indicam — tem como objectivo a conquista do terreno, o que tacticamente significa ultrapassar a Linha de Vantagem, para o que precisam de conhecer os Princípios Fundamentais do Jogo — reconhecendo e antecipando os movimentos dos jogadores — quer em Ataque quer em Defesa, saber que, para avançar e utilizar a posse da bola, os potenciais receptores têm que cumprir a trilogia de Correr-Receber-Passar, que a bola tem que ser disponibilzada muito rapidamente (tem-se como limite 3 segundos) e, portanto, que não podem haver atrasos propositadamente ilegais na libertação da bola como não devem ser admitidas quaisquer formas de fora-de-jogo que de imediato limitam opções. E que a acção do árbitro deve, nestes momentos limitar-se a indicar a vantagem para a equipa não infractora e nunca utilizar vozes de comando do tipo “tire as mãos!”, “chegue para trás!” e outras similares que irão beneficiar o infractor, levando-o pelo baixo custo que tem a ilegalidade — sobre este assunto ver o texto que traduzi de Michel Lamoulie aqui — a repetir a falta e, aqui sim, estragar o jogo. No entanto a fala deve ser mantida para, imediatamente após a interrupção do jogo por marcação de falta, explicar e tornar claro o tipo de falta e faltoso assinalados.

Assente e percebidas as necessidades de manter tempo e espaço a arbitragem deve reconhecer — falámos da área de rendimento ou seja, da Divisão de Honra e dos Sub-19 e equivalentes femininas — que nestas áreas competitivas do rendimento não é papel do árbitro nenhuma atitude pedagógica — o facto de haver muitas paragens no jogo é da responsabilidade dos jogadores e dos treinadores. E que, para que diminuam, deveriam realizar-se encontros entre árbitros e treinadores, como aconteceu na Inglaterra de que resultou importante melhoria do jogo interno, obtendo uma linguagem comum para acerto das interpretações das Leis.

Portanto, aos árbitros cabe gerir o jogo que não deve ser mais do que “garantir que ambas as equipas estão protegidas de abusos que as Leis do Jogo não permitem.”, tendo em especial atenção as Situações Críticas como: segurança dos jogadores; placagem — avisando, verbalmente e apenas quando necessário, o seu início para que a segurança e disponibilização da bola sejam realizadas de acordo com as Leis do Jogo; tempo de disponibilização da bola no jogo no chão — causas e consequências desta questão central do rugby moderno; formações ordenadas - 1ª linha; foras-de-jogo; vantagem — que não utrapassse a definição de só ser utilizada quando há benefício real e evidente que surja após infracção da equipa adversária e que deve ser clara e inequívoca e não durar demasiado tempo a ver se “pega” para depois voltar ao local inicial da falta.

De facto a Arbitragem deve ser simples, perceptível e que garanta a equidade às duas equipas em confronto — porque são os jogadores que fazem o jogo e têm o direito de o jogar de acordo com as Leis do Jogo e sem interpretações exteriores à acção-jogo em que estão colectivamente inseridos e empenhados.  Os árbitros não são pedagogos, nem treinadores — são garantes da boa aplicação das Leis do Jogo.


NOTA: LINGUAGEM INCLUSIVA

Todas as referências feitas neste artigo relativas a jogadores, treinadores, árbitros, árbitros assistentes, implicitamente, tanto mulheres homens, não estando explicitado em todos os casos unicamente por simplificação prática.

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