segunda-feira, 4 de junho de 2018

DO MAL AO PIOR


“El rugby no es violento... es agressivo!!! 
¿Porqué no?... 
Porque el rugby tiene reglas y la violencia no...” 
Angel Guastella, entrenador de Los Pumas del 65
Regulamentos federativos

A direcção da Federação Portuguesa de Rugby decidiu aceitar a recomendação do Conselho de Disciplina e considerar como “falta de comparência não justificada” atribuível às duas equipas — Agronomia e Direito — a consequência do jogo das meias-finais do CN1, impondo assim a aplicação do ponto 2 do Artº 41.º (Desclassificações) do Regulamento Geral de Competições 2017/2018 que determina:
  • Será desclassificada qualquer equipa da Divisão de Honra responsável por uma Falta de Comparência não justificada.
e a sua sequência estabelecida no Artigo 30.º (Desclassificações) do Regulamento do Primeiro Escalão Competitivo Sénior de 2017/2018:
  • A desclassificação duma Equipa do CN1 implica a imediata exclusão de todas as competições seniores em que a Equipa participe, bem como a despromoção ao último escalão competitivo sénior, e ainda a impossibilidade de ser promovida ao CN1 nos 5 (cinco) anos seguintes à Época Desportiva em que se verificou a desclassificação.
Portanto e de acordo com este regulamento Agronomia e Direito serão despromovidos para a III divisão federativa, não podendo atingir a divisão principal antes de passados 5 épocas da data da punição.
E assim está lançada a bernarda no rugby português que, não estando já de grande saúde, vê o caminho do fundo mais próximo.
Esclareça-se que o que se passou, por duas vezes, a 28 de Abril p.p. no campo da Tapada e que envolveu jogadores de Agronomia e Direito constitui uma inadmissível manifestação colectiva de agressões consubstanciando uma acção de violência e que é exterior ao domínio Desporto. Porque o Desporto, como lembra aquele que foi um excelente treinador dos Pumas argentinos, rege-se por regras enquanto a violência não as conhece. Assim sendo, os acontecimentos da Tapada só podiam ser exemplarmente punidos a bem do bom nome do Rugby e do Desporto. Da ética desportiva. Da decência.
É bom lembrar que foi por causa das mútuas agressões, que o árbitro teve que dar o jogo por terminado quando faltava ainda jogar, pelo menos, um pontapé de penalidade que, sendo aos postes, poderia garantir o empate e obrigar a prolongamento ou, por outro lado, poderia permitir uma penalti-touche que podia traduzir-se em vitória imediata. O que demonstra ser de toda a justiça considerar a perda dos efeitos desportivos do jogo sem benefício para qualquer das equipas.
Mas com o resultado da decisão tomada, encontrámo-nos perante a situação de partida de um bom e justo princípio - punir a violência que não pertence ao domínio Desporto onde predomina a regra - para ter um final desgraçado, desajustado e deslocado e que prejudica — na sua capacidade competitiva — a generalidade do rugby português. Como aliás a própria direcção percebeu ao tentar limitar os danos numa decisão — que dizem ter sido tomada a 2 de Maio — que procura reduzir as consequências do já referido Art.º 30º ao, como é fácil de perceber pela redacção das referidas actas, aprovar “alterações ao Regulamento do Primeiro Escalão Competitivo em vigor, as quais incluem, nomeadamente, alterações ao formato de acesso ao, e despromoção do, CN1. Entre as normas alteradas, promoveu a Direção uma alteração da redação do Artigo 30.º, introduzindo uma distinção relevante para as faltas de comparência.” Curiosamente, com este remendo tardio e a más horas, continuamos no campo das faltas de comparência — que são o que são e não outra coisa — e nada parece pretender alterar-se de acordo com a necessária adaptação ás condições reais.
E disso se desconfia quando se lê no já referido comunicado federativo que a Lei n.º 39/2009 de 30 de Julho é “matéria da competência dos tribunais”. Como?! Então deve ser por isso que existe um regulamento federativo que é a sua cópia...e que não vemos, porque existe a independência do movimento associativo desportivo, um tribunal aplicar  sanções que dizem respeito ao domínio desportivo como perda dos efeitos desportivos ou a perda total ou parcial de pontos. É um facto que, em qualquer espaço de espectáculo desportivo, existem duas áreas que têm responsáveis diferentes: o recinto de jogo de responsabilidade do árbitro; o espaço exterior a este que é da responsabilidade da entidade organizadora (clube ou federação de acordo com as circunstâncias). Mas ambos, na sua organização e controlo, sob alçada desportiva. O que significa que cabe às autoridades desportivas a responsabilidade de garantir a segurança de espectadores e atletas. Para o que e se assim o entender como necessário, podem pedir a presença e cooperação das forças de segurança.
Para acabar de vez com a analogia ridícula de faltas de comparência com o campo cheio de jogadores, talvez não fosse pior juntar a sócios, adeptos, ou simpatizantes referidos no ponto 1 do Art.º 24.º (Interdição de Recintos Desportivos) do Regulamento federativo de  Prevenção e Punição das Manifestações de Violência, Racismo, Xenofobia e Intolerância nos Espectáculos Desportivos o conceito de agentes desportivos. Passaria então — sem necessidade de recurso a uma qualquer extensão englobadora que o caso em apreço requereria — a haver capacidade federativa para intervir sobre casos de violência sem recurso a analogias sem nexo. Mas o melhor, melhor é reformular e adaptar, alinhando, os diversos regulamentos de uma forma sistémica para criar um corpo regulamentar sólido e capaz de servir eficazmente as necessidades reais do rugby de acordo com os seus tão propalados princípios e valores.
E como se chega então ao actual estado de coisas?
A primeira resposta só pode ser esta: por desleixo, ignorância e irresponsabilidade. Quer federativa quer dos clubes que, nestas matérias, só mostram preocupações quando são directamente afectados. Eis alguns dos indícios demonstrativos.
Dizia-se no Comunicado federativo de 30 de Abril p.p. que “os acontecimentos de Sábado, dia 28 de Abril, são os mais graves numa série de incidentes verificados desde a primeira jornada da presente época desportiva [...], isto é, os avisos existiam mas — como se percebe pela acta das reuniões da direcção publicada no sítio federativo — os dirigentes preferiram ficar com a comodidade de se encontrarem “reféns de regulamentos extremamente rígidos, que não permitem qualquer margem ou amplitude de decisão quanto à sanção” — do que perderem tempo com o seu estudo e sua transformação adaptada às necessidades reais. E assim, demonstrando claramente o seu desconhecimento dos teores regulamentares e deitando para trás das costas a responsabilidade exclusiva da sua aprovação, optaram pela facilidade da ligeira alteração para disfarçar os evidentes prejuízos provocados.
Por outro lado não deixa de ser estranho que os clubes — sócios federativos efectivos —mostrem também todos os indícios de nada saberem do teor dos regulamentos uma vez que, como se fosse alguma novidade a mera e linear aplicação do regulamentado — são claramente desajustados e exagerados mas são assim há anos — se mostrem surpreendidos e acusadores só agora que o telhado lhes caiu em cima. E as coisas vão saltar do espaço desportivo para o espaço jurídico que se vai movimentar num maltratado conjunto de regras e, temo, num tempo desajustado ao normal desenrolar desportivo.

Mas o pior do que tudo é se, por razões de aligeiramento do desastre e numa demonstração da inoperância dos regulamentos, acabaremos na superior facilidade do branqueamento dos acontecimentos...

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