Com a vitória conseguida nas Caldas da Rainha sobre a Roménia por 22-11, Portugal atingiu o 20ª lugar no Ranking da World Rugby — lugar que não atingia desde Setembro 2009 — e mantém, apesar da vitória da Bélgica sobre a Rússia, todas as condições para garantir a manutenção nesta principal divisão da Rugby Europa. Com as óbvias vantagens, desportivas e financeiras, que daí podem advir para o desenvolvimento do rugby nacional.
Foi uma excelente vitória com 3 ensaios, 2 de Dany Antunes (de novo "Homem do Jogo" escolhido por um júri— também o irlandês CJ Stander foi nomeado as mesmas duas vezes consecutivas — constituído por Luis Canongia, António Aguilar e por mim) e outro, num "maul dinâmico" demolidor, por Tadjer Barbosa, a que se juntaram duas Transformações e uma Penalidade também de Dany Antunes num total de 17 pontos de jogo.
E a diferença podia ter sido superior — não atingimos o 4º ensaio e, assim, o ponto de bónus por alguns erros elementares dos nossos jogadores que não corresponderam a boas construções conseguidas pela equipa. Por duas vezes, após quebra da linha defensiva e numa excelente resolução de um 2x1 por Rodrigo Mata, o passe, apesar do caminho aberto para a área de ensaio, tornou-se impossível porque o seu companheiro (também do Belenenses), Duarte Azevedo, se posicionou, em ambas as vezes, à frente da linha da bola numa distração injustificável para um internacional. Um terceiro ensaio podia ter sido conseguido se o capitão Appleton, antes de chegar ao chão, tem utilizado um off-load para o exterior e servido Danny Antunes que tinha corredor aberto sem adversários próximos. Outro ainda podia ter acontecido se um pontapé do recém-entrado Pedro Lucas tem sido melhor controlado quer na execução quer na captação de Manuel Cardoso Pinto, isto é, se os dois têm sido mais colectivos e jogado na compreensão mútua.
A defesa portuguesa, sector onde se acentua a mais objectiva melhoria da equipa, mostrou-se muito capaz, conseguindo segurar a inviolabilidade da sua área de ensaio com corajosas e conjuntas intervenções que impediram, nos 8 minutos finais que o árbitro considerou corresponderam a paragens durante os 40 minutos dia segunda-parte, que os romenos chegassem ao ponto-de-bónus defensivo e assim se retirassem sem pontos de classificação. O que é sempre bom numa classificação que pode ter nos pontos-de-bónus uma importância decisiva.
Se na defesa a equipa portuguesa mostrou qualidade e os seus jogadores mostraram boa compreensão do sistema — é muito bom ver as linhas-de-corrida agressivas e a encurtar o espaço de acção adversário por parte da 3ª linha — nomeadamente com compensações muito bem interligadas. Já no ataque mostraram insuficiências e incompreensões que muito terão a ver com os hábitos internos e que urge trabalho alargado de correcção.
De um ponto de vista estratégico o rugby rege-se pelos Princípios Fundamentais de Avançar Sempre! Apoio, Continuidade e Pressão, a que gosto de juntar outros quatro que designo por sub-princípios: Adaptação, Variedade, Comunicação e Velocidade. Já de um ponto de vista táctico, mais livre e inventivo para garantir o cumprimento dos anteriores, a Adaptabilidade constitui o factor-chave necessário à eficácia. O que significa que, no domínio táctico, existem diversas soluções a adotar e a que os jogadores têm que saber adaptar-se. Não há portanto soluções únicas e os jogadores têm que aprender a encontrar a melhor resposta a cada momento que enfrentam. E é esta capacidade que falta à equipa portuguesa que se mostra muitas vezes incapaz de encontrar soluções colectivas - o apoio nem sempre é feito no tempo devido e a continuidade do movimento morre no chão. Ou seja, se tecnicamente já existe uma razoável capacidade, aos jogadores portugueses falta cultura táctica. Isto é: sabendo como fazer falta resposta eficaz ao que fazer? e quando fazer? É, portanto, na tomada de decisão que nem tudo vai bem. Decisão que tem que envolver algum risco controlado e não se limitar ao conforto de fazer a normalidade — as linhas-de-corrida não têm que ser sempre para fora e devem ser alternadas com corridas na direção dentro para fixar a defesa ou ampliar intervalos. O costume não é aqui bem vindo e a variedade é fundamental para colocar problemas ao adversário.
E o jogo-ao-pé, certeiro e assertivo na colocação em espaços vazios, é decisivo. E, por mera falta de treino específico e conhecimento claro das capacidades de cada um, o jogo-ao-pé da equipa portuguesa, com a possível excepção de João Freudenthal, é mau e, em vez de arma atacante, torna-se, porque se joga no mero alívio, uma vantagem para o adversário. E uma equipa para se impor ao nível internacional tem que mostrar um jogo-ao-pé capaz. Outro ponto de melhoria necessária diz respeito à disciplina, principalmente no jogo no chão e que está a entregar, sem custos, bola e território demasiadas vezes ao adversário. Aprender a jogar sem faltas é também trabalho constante a fazer nos clubes...
Os romenos foram aquilo que se esperava, maus manobradores com a esperança que a colisão lhes resolva todos os problemas. E só são perigosos, como sempre, muito próximo da área-de-22 do adversário. O que significa que não se deve jogar contra eles da mesma forma que se joga contra outros, devendo a noção de conquista territorial estar mais vezes presente para garantir a presença da equipa no meio-campo adversário. Contra equipas como a romena, fracas de manobra e fortes no choque, chutar para fora, tão dentro da área-de-22 quanto possível, mesmo se entregando a bola ao adversário, pode ser a mais eficaz táctica. Porque os obriga a jogar de longe ou a chutar para permitirem contra-ataques sobre uma equipa desagregada pelo movimento de subida.
Variedade de ataque à linha com ataque aos ombros interiores — de que serve o grupo de avançados de ataque se os ângulos de corrida não vão em direcção à bola para prender ou ampliar? — com linhas-de-corrida convergentes, passes heterodoxos, velocidade de ataque à linha, dobras, verticalização do jogo para permitir envolvências eficazes, são as soluções exigíveis para a continuidade do movimento. De que serve, por desfoco, desleixo ou maus hábitos, não haver resposta imediata à criatividade de um companheiro? É, no fundo, a possibilidade de recorrer, em movimento adaptativo, a estas decisões suportadas na técnica que possibilitam — independentemente do peso e da altura (da compacticidade, diria) — atacar e ultrapassar a linha de vantagem, criando desequilíbrios e explorando o sucesso conseguido. E os jogadores portugueses que pretendem ter uma carreira internacional, têm que dominar estes aspectos estratégicos, tácticos e técnicos. Porque precisam de responder ao o quê? como? e quando? e assim contribuir para uma equipa mais coesa, afinada colectivamente em cada momento e mais eficaz, fazendo de cada bola (re)conquistada uma arma atacante capaz de criar problemas complexos ao adversário.
Foram duas importantes vitórias que colocam o rugby português no espaço desportivo europeu onde deve estar mas, para que o caminho seja qualificado e de contínuo progresso, não podemos sentar-nos à sombra dos feitos e precisamos atingir um patamar desportivo superior que permita ajustar o modelo colectivo de movimento à obtenção dos melhores resultados. Consistentemente.
O que exige, neste mundo do Alto Rendimento, uma permanente colaboração da comunidade rugbistíca num claro desenvolvimento competitivo da modalidade. Modalidade colectiva por excelência, o Rugby não se faz dos eus mas do nós: dos clubes, dos directores, dos agentes, dos treinadores e dos jogadores. De uma perspectiva comum de aposta nos bons resultados.
Nos restantes resultados do Grupo, a vitória da Bélgica sobre a Rússia foi surpreendente — ainda por cima quando, aos 30', os russos venciam por 12-0 com a marcação de 2 ensaios (acabaram a sofrer 5...). Com a vitória sobre a Espanha, a Geórgia elevou, ultrapassando a Itália no ranking da World Rugby, o nível da sua candidatura ao 6 Nações — podendo ter encontrado um aliado de peso na África do Sul que, como as suas equipas regionais, pretende jogar na Europa.
Quadro da Rugby Europe |