As modas têm disto: chegam sorrateiras, alastram-se e, sem se dar por ela, ocupam o espaço, impõem-se e retiram-nos o espírito crítico.
Duas modas, que nada trazem de interessante ou de inventiva, estão a espalhar-se pelo rugby português nos alinhamentos e nas marcas que os árbitros estão a fazer no chão do terreno-de-jogo. E que não devem continuar.
Nos alinhamentos, a equipa que tem direito ao lançamento da bola reúne-se à distância de praticamente 10 metros da linha de lançamento e discute a decisão da jogada. A decisão da jogada?! Parece que já não há códigos - no meu tempo de jogador era o que tínhamos e assim continuámos enquanto treinador. A decidir da jogada? pergunto de novo. Qual quê! A jogada vem sabida e conhecida de casa... o resto é adaptação ao momento.
Comecemos pelo princípio. O Código do Jogo estabelece a Integridade como valor fundamental do jogo e que resulta da honestidade e fair-play. E nos seus Princípios de Jogo estabelece que o objectivo de marcar o máximo de pontos possíveis de jogo deve ser feito de acordo com o cumprimento das Leis do Jogo e do seu espírito desportivo. E diz ainda o Código que, para que os Princípios e Valores do Rugby sejam cumpríveis, a responsabilidade envolve treinadores, capitães de equipa, jogadores e árbitros. Ou seja: todos no mesmo barco a garantir o Respeito, Disciplina, Solidariedade e Integridade para que a Paixão valha a pena.
Então e este acto de reunir para combinar a táctica é assim uma violação tão grave? Neste caso é! E por diversos motivos: constitui uma violação voluntária da lei, pretende induzir indevidamente o adversário em erro para garantir uma conquista fácil e diminui objectivamente o tempo-útil de jogo.
Viola as regras porque viola claramente a Lei 18.12 que estabelece que “as equipas devem formar o alinhamento sem demora. Consequência: Pontapé Livre”. E a habilidade utilizada tem como objectivo impossibilitar a regra do espelho, provocando erros de posicionamento e diminuindo assim a capacidade de disputa da bola pelo adversário. Assim: o adversário, cumprindo a Lei, vai-se colocando na sua devida posição e de acordo com a análise que fez da equipa lançadora; esta, no entanto, só avança para os seus lugares quando já detectou o posicionamento dos saltadores adversários - os lutadores pela posse da bola - e posiciona-se de forma desfasada, tirando partido de uma ilegalidade; para poder disputar a bola o adversário tem que se reordenar na fila do alinhamento e a equipa lançadora, lançando a bola de imediato e num sincronismo que não demonstra nenhuma capacidade especial mas que apanha o adversário ainda em mudanças, conquista a bola com toda a facilidade. Ficando portanto ferido o princípio deste desporto colectivo de combate da conquista com disputa. E ferido fica também o espírito desportivo que define a modalidade.
Mas ao atrasar a sua colocação no alinhamento, a equipa que o executa contribui ainda para a diminuição do tempo da bola em jogo - o tempo-útil de jogo - e que se contabiliza em tempo perdido. Tempo que multiplicado pela média de 25 alinhamentos que aconteceram nos 6 primeiros jogos deste campeonato da Divisão de Honra pode atingir um tempo de não-jogo muito elevado e corresponder a uma paragem demasiado elevada da continuidade do jogo. Numa preocupação com o mesmo sentido e numa recente entrevista, o treinador da Inglaterra, Eddie Jones, recomenda que esta prática da “reunião” antes do alinhamento seja eliminada.
Mas se os adversários responderem tacticamente de forma adequada - atrasando também a sua entrada para garantir a regra do espelho (cada um se posiciona lado-a-lado do seu pré-determinado adversário directo) de número e de posição - o tempo perdido de jogo aumentará substancialmente. Contribuindo mais ainda para reduzir, num mesmo tempo de jogo, o tempo-útil do jogo para números preocupantes. Existe, no entanto, uma fácil maneira de o evitar: aplicar a lei.
Conclusão: @s senhor@s árbitr@s - a quem compete garantir a boa aplicação das Leis do Jogo - têm de pôr cobro a este abuso utilizando as Leis do Jogo que estão à sua disposição. As Leis existem com princípios e objectivos que devem ser respeitados para manter a identidade do jogo. E o jogo não pode viver de habilidades com a conivência de treinadores e jogadores. Tão pouco d@s árbitr@s!
A outra moda, obviamente também ela importada do estrangeiro, é a da preocupação dos árbitros em definir uma marca no chão raspando com a bota de pitões no relvado, seja ele natural ou artificial. Para que é que serve este estrago produzido na relva? Para localizar o sítio da formação-ordenada, dirão. Ora, ora...
A formação-ordenada não precisa de que seja colocada um raspão de relva, pretensamente precisa, para que seja realizada de acordo com as Leis de Jogo que apenas referem que “o árbitro deve assinalar com o pé, a marca que indica a linha-média-da formação ordenada que é paralela às linhas de ensaio”. E para a assinalar não é necessário deixar as feridas na relva do arrasto dos pitões. Para a marca necessária basta que se estique a perna e se aponte com o pé e todos os implicados perceberão a localização da linha-de-introdução.Vamos lá senhor@s árbitr@s, acabar com este estrago desnecessário... Deixando de nos preocupar - e para isso vale a autonomia federativa que temos - com instruções sem senso que alguém sentado a uma secretária* de poder administrativo resolveu entender impôr. Vá lá saber-se com que utilidade...
* “Uma secretária é um sítio muito perigoso para analisar o mundo.”, John Le Carré, escritor