Este quadragésimo-oitavo jogo do Mundial 2023 constitui a final entre os tri-campeões mundiais, África do Sul (1995,2007,2019) e Nova Zelândia (1987, 2011, 2015). E é, de acordo com as diversas estimativas, um jogo de tripla.
Independentemente da perspectiva do resultado será um encontro entre dois modelos de rugby: do lado sul-africano o rugby de colisão que faz da capacidade de avançar em força no terreno a sua maior arma; do lado neozelandês o rugby de movimento que faz da iniciativa, da flexibilidade e da mobilidade, coordenados e focados pela mesma leitura da situação que enfrentam, a sua eficácia numa articulação de pequenas unidades que, para além de surpreenderem e desequilibrarem a defesa, constituem, pelo apoio organizado que criam próximo do portador da bola, um fortíssimo instrumento de ataque. Agora com uma dificuldade acrescida; as 14,3 placagens ofensivas feitas em média por jogo pelos defensores sul-africanos.
Por outro lado, os sul-africanos, embora sem a fluidez neozelandesa, colocam a pressão das suas poderosas colisões como a principal arma de desequilíbrio das defesas adversárias. E será curioso ver como estas equipas, muito próximas no valor das placagens bem sucedidas mas muito diferentes nas formas defensivas e atacantes, vão garantir a defesa das suas áreas-de-ensaio.
Com ligeira vantagem, a conquista é favorável aos neozelandeses, mesmo se os sul-africanos demonstraram a sua capacidade nas formações-ordenadas contra Inglaterra ao provocarem três penalidades e que acabaram por lhes dar a vitória.
Nos alinhamentos os neozelandeses voltam, com 97% contra 88% a mostrar superioridade, a que acrescentam um bom uso de combinações que permite que transformem esta fase estática numa sua excelente base de ataque. E como sabem muito bem lançar os ataques centrais com a organização dos seus pequenos grupos, conseguem encurtar a linha defensiva adversária, abrindo assim corredores laterais por onde, com a facilidade de passes tensos de 10 a 15 metros, lançam o seu temível trio-de-trás.
A prestação dos AllBlacks neste Mundial é superior aos Springboks em quase todos os domínios |
Mas o trio-de-trás dos sul-africanos não lhes fica atrás em perigosidade. E vai ser interessante ver como, na sua habitual estratégia de não correr riscos no seu meio-campo, os sul-africanos, utilizarão os seus habituais pontapés-na-caixa, para colocar um dos seus excelentes pontas em vantagem — que aliás muito pouco tocaram na bola (não fizeram nenhum passe(!)), contra a Inglaterra… Mas desta vez serão mais cuidadosos que o normal porque os neozelandeses são a equipa que mais gosta — numa enorme demonstração de confiança — de lançar ataques desde a sua área-de-22. E se conseguem ultrapassar a primeira-linha defensiva transformam o movimento num prazer para os espectadores.
O resultado final pode estar dependente da prestação do banco de suplentes de cada uma das equipas. Com o seu arriscado banco de 7-1 — a BombSquad — os sul-africanos, jogando sem formação suplente, mostram ao que vêem: tirar toda a vantagem do seu bloco de avançados, forçando penalidades — neste Mundial foram a equipa que, com 16, mais penalidades provocou nas formações-ordenadas. E entram de imediato com o pontapeador de excelência Handré Pollard e Faf De Klerk, procurando que o marcador lhes seja favorável desde cedo. Mas os suplentes neozelandeses — a Easy Company como são designados pelo seu terceira-linha Papali’i — conseguindo na última jogada do jogo contra a Irlanda defender 37 fases, mostraram que também sabem estar à altura. Nos AllBlacks não haverá surpresas, jogam os habituais e a confiança das ilhas dos antípodas é absoluta.
No final do próximo sábado, com o 10º título de Campeão do Mundo 2023 entregue, conheceremos também a equipa que obterá o seu 4º título, mantendo-se a vantagem do Hemisfério Sul que nos nove mundiais disputados conquistou oito.
Nota: texto publicado no Público