segunda-feira, 30 de abril de 2018

UM REGALO AZUL

De uma outra conversa foi do que se tratou no jogo do Restelo da segunda meia-final do play-off do Campeonato Nacional da 1ª divisão. Impecável e implicado o comportamento dos jogadores e espectadores que se mostraram apenas focados na construção do jogo numa demonstração do que deve ser a competição desportiva.
Para uma boa qualidade de jogo - para o que também contribuiu e em muito o voluntário árbitro, o neozelandês Kane Hancy (uma boa hipótese para apitar a ainda hipotética final) - com rápida vantagem para os azuis de João Mirra que mostraram uma enorme qualidade: sabem jogar rugby! 
O jogou terminou com a vitória azul por 37-10, conseguida com a marcação de 5 ensaios - o segundo ensaio valeu a ida num tratado de ataque à linha defensiva com fixação pela linha de corrida inicial e mudança súbita de ângulo de corrida para receber a bola, no tempo preciso, “na linha” e no meio de um intervalo sem possibilidade de recuperação defensiva. O ensaio - numa excelente demonstração de manobra evasiva - foi tão bom que merecia ecrãs no campo para garantir a repetição...
O mais impressionante desta equipa do Belenenses é a sua demonstração de cultura táctica individual e colectiva. Cada jogador, cada sector, sabe o que deve fazer, adaptando-se muito bem ao que tem na sua frente, permitindo assim a sintonia entre o individual e o colectivo que garante a coesão necessária ao sucesso da equipa. O ataque à Linha de Vantagem é sempre muito bem feito quer estejam em defesa quer em ataque, com subidas rápidas a dominar o espaço e a criar problemas ao adversário pela fixação que criam nos defensores e pela redução do tempo de acção - a que acrescem boas placagens - que impõem aos atacantes. Ou seja, a equipa belenense está ali para se impôr, para dominar os tempos, para ocupar o espaço e para usar ou recuperar a bola. Bonito de ver - há que tempos que não via uma equipa a jogar assim... - a que podemos ainda juntar a inteligência táctica do seu jogo-ao-pé: as bolas eram chutadas para o espaço vazio de forma a obrigarem os defensores a movimentarem-se, impedindo-os de receber a bola no conforto dos braços abertos. E as hipóteses de recuperação da bola ou da conquista de terreno a aumentarem... Excelente demonstração da qualidade de treino da equipa técnica comandada por João Mirra que conseguiu transmitir em acções de jogo a aplicação dos Princípios Fundamentais do Jogo: Avançar sempre! Apoio, Continuidade e Pressão. 
Um regalo para os olhos e para a cabeça.
O Cascais fez o que pôde, mostrando no entanto encontrar-se furos abaixo do adversário como é demonstrado pela diferença de 4-1 em ensaios. No entanto e apesar de já se encontrar a perder por 21 pontos de diferença, a equipa, numa bela atitude competitiva, mostrou-se com outra disposição depois do intervalo, ocupando a área de 22 adversária durante os dez primeiros minutos da 2ª parte e mostrando vontade de virar as coisas. Mas a sua incapacidade finalizadora nascida de erros na tomada de decisão não lhe acrescentou quaisquer pontos... e num ápice, o Belenenses marcava de novo, mostrando a sua excelente capacidade reorganizativa para jogar sobre bolas recuperadas. Domínio, mais uma vez, dos parâmetros da cultura táctica.
Com esta demonstração o Belenenses encontra-se na Final pelo mérito da sua capacidade de saber jogar e de traduzir em pontos esse conhecimento. Como deve ser, aliás, na competição desportiva.
E agora? Vai haver Final? Saltando barreiras - a cada novo vídeo que surge mais vergonhosa é a situação - sobre a vergonha de ontem?
Qual vai ser a posição federativa? A de anular o jogo, castigando jogadores e repetindo-o em campo neutro ou a de considerar que o jogo ultrapassou os limites do irrazoável, sendo retirado do mapa com atribuição do título ao Belenenses?
Ou tudo, num costume muito próprio, se esconde debaixo do tapete, tapando-se os olhos como se nada tivesse acontecido, buscando desculpas esfarrapadas e realizando-se a Final como se nada fosse?... 
...mas marcando o rugby português definitivamente com o ferrete da indecência. 
A situação é tão grave que urge uma decisão...
... porque estando os males feitos e o rugby português desacreditado, só uma intervenção firme que coloque os pontos nos is da ética desportiva servirá para restabelecer o padrão da imagem da decência. 
Facto, facto é este: o Belenenses, o seu rugby, a sua capacidade de construir jogo e mostrar como deve ser jogado, merecia outro processo. A sua postura competitiva exigia uma final com a dignidade de acesso dos dois adversários. E não o pecado desta.

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