terça-feira, 22 de dezembro de 2009

ULTRAPASSAR A LINHA DE VANTAGEM

Fui ver o CDUL-Belenenses. Jogo fraquinho com excepção do momento “rugby” do ensaio do CDUL e a excelente atitude, também do CDUL, que garantiu,na vantagem do combate defensivo, a vitória nos últimos minutos. Quanto ao resto, fraco. Jogo pouco dinâmico, defesas a garantir confortavelmente e apenas a sua obrigação, muita bola pelo ar num nexo demonstrativo de incapacidade colectiva de soluções. Enfim, nada entusiasmante.
A editora do Rugby World, Sarah Mockford, escrevia no último número da revista que “a qualidade do rugby actual é baixa e os adeptos começam a afastar-se” e o nosso rugby também não foge a esta regra – com um problema pior: não tendo muitos adeptos, assim não conquista mais; sujeito a enorme concorrência de outros desportos, perdendo os que tem, perder-se-á também enquanto desporto de alto rendimento.
E o mais preocupante de tudo foi, de novo, a demonstração da incompreensão da importância da relação do jogo com a Linha de Vantagem. O que representa uma falha grave na cultura táctica exigível a jogadores da elite interna do rugby português.

Começando pelo princípio. O que é a Linha de Vantagem (LV)? É a linha imaginária paralela às linhas de ensaio e que passa pelo ponto onde a bola está colocada para reinício do jogo ou onde se encontra nos ponto de quebra do movimento. Para que serve a LV? Para definir, como uma espécie de linha de fronteira, os dois territórios pertencentes às equipas em confronto. E que importância tem isso de reconhecer a dimensão dos dois territórios? Sendo o rugby um desporto colectivo de combate organizado para a conquista de terreno, a entrada no território adversário, medida pela ultrapassagem da LV, traduz vantagem e significa a conquista procurada. E que importância tem isso de conseguir vantagem pela conquista de território? Primeiro, coloca-nos territorialmente mais próximo de um importante objectivo do jogo, o ensaio; depois permite-nos desequilibrar a defesa que se vê colocada em inferioridade numérica e a perder qualidade posicional – a sua organização defensiva vê-se confrontada com a totalidade da equipa atacante porque há membros da equipa defensora ultrapassados pelo movimento da bola, encontrando-se assim em posição de difícil intervenção. Mantendo a continuidade do movimento – porque o apoio é mais fácil e a pressão superior – o ataque garante a sua vantagem, explorando a desorganização defensiva.
Portanto, o ataque à LV é uma questão estratégica do jogo de rugby – não é possível marcar ensaios sem conquistar terreno.

Assim sendo, é preciso que a cada conquista de bola corresponda um propósito de ultrapassagem da LV. Que deve ser feito de acordo com a movimentação da defesa e em adaptações sucessivas e pertinentes, começando logo no primeiro momento – é preciso jogar próximo da LV para atacar a defesa, não a deixando adaptar-se ou desdobrar-se.


Jogar como o fizeram as linhas atrasadas do CDUL e Belenenses, longe da LV, passando a bola para o lado sem avançar no terreno, deixando a defesa desmultiplicar-se confortavelmente, pode parecer “muito jogo” mas não difere da regra burocrática clássica: muito movimento para nenhuma produtividade. E a solução para o problema encontra-se logo na colocação do abertura e no seu arranque e na direcção do passe do formação – não é muito inteligente, excepto para jogar ao pé, ter conseguido uma posição no terreno e depois passar a bolas metros para trás para tentar de novo chegar ao ponto de onde já se partiu…E existe uma norma que os campeões reconhecem: há sempre mais espaço do que aquele que parece.

De tudo isto resulta também que a defesa e a sua organização dependem do posicionamento dos adversários – não se sobe da mesma maneira para um ataque em linha ou para um ataque em profundidade. Tão pouco para a cobertura do terreno ou o corte de ligações dos grupos atacantes. Mas no jogo que vi era indiferente para as defesas a forma como os ataques se desenvolviam – por isso as recuperações (turnovers), conseguidos na zona neutra dos equilíbrios defesa/ataque, pouco perigo representaram.


O jogo de rugby é fácil: exige conquista da bola, conquista de terreno para desorganizar a defesa, apoio para continuar o movimento, exercendo a pressão permanente - numérica ou espacial - da vantagem até tão próximo quanto possível da linha de ensaio. Numa também permanente construção activa - da superioridade numérica ou espacial - e não à espera do erro de palmatória do adversário.

O problema do ataque à LV não se reduz, infelizmente, a este jogo. É uma constante negativa do rugby português que obriga a compreender e treinar a noção da relação directa entre o uso da bola e Linha de Vantagem. De outro modo não haverá progresso eficaz.

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