domingo, 14 de fevereiro de 2010

OPORTUNIDADE DEITADA FORA

Foto de Miguel Rodrigues
O adágio popular “água mole em pedra dura, tanto dá até que fura” não se aplica ao jogo de rugby. No rugby, conforme mandam os Princípios Fundamentais, é preciso COMUNICAR e VARIAR. Ou seja: ter sempre presente que a inteligência, em vez da força bruta, dá melhores resultados.
E foi isso que Portugal não soube utilizar nos minutos finais do jogo de ontem contra a Geórgia. Procurou a entrada em força, numa série de pick and go de canal 1 e esqueceu-se – por leitura negligente – de verificar o que se passava na envolvente. E, por duas vezes do lado esquerdo e, pelo menos uma do lado direito, esteve criada a superioridade numérica ou o espaço necessário para explorar procurando aí o ensaio da vitória. Falhou a leitura. Falhou a inteligência da situação cara a Pierre Villepreux. A França, num superior patamar de cultura táctica, mostrou, minutos antes em Paris e no segundo ensaio contra a Irlanda, como se resolve uma situação idêntica – mesmo se com pack superior.

Falta de experiência que a carência de hábitos constantes de pressão competitiva traduz na dificuldade da capacidade de decisão. Daí ao erro, ao desperdício, de um momento demonstrativo de enorme capacidade de construção, foi um passo. E é aqui, no domínio destes momentos e não na sorte disto ou daquilo, que se ganham ou perdem jogos internacionais ou caminhadas nas qualificações.

Já se sabe: sob pressão, o resultado da Lei de Murphy tende a constante. Excepto se houver o treino suficiente que o possa evitar.
A falha – ou mesmo a inexistência – de decisão na enorme fase dos últimos minutos do jogo, os quatro pontapés desperdiçados – note-se Gardener: “Estes jogos são complicados, é uma pressão maior e infelizmente acabei por não ser tão eficaz.” – são, ambos, resultado da falta de hábitos de jogar sob pressão. E o actual campeonato, com metade dos jogos a brincar, não dará nunca a experiência necessária para enfrentar estes jogos sem tremores, não havendo talento de jogadores ou qualidade de treinadores que consigam ultrapassar este estágio. Porque a transformação de oportunidades em pontos exige, para além da capacidade técnica, o domínio da cultura táctica só possível - como já se percebeu por esse mundo rugbístico fora - com a constante habituação ao nível competitivo mais elevado.

E o irritante é isto: deita-se fora, por não se tomarem decisões que se fundamentem nos princípios da competição desportiva, uma oportunidade soberana e perde-se assim a possibilidade do acesso directo ao Mundial. Ficando a desculpa do azar como justificação para as inércias e incompetências…

O ensaio português mostrou como se ataca uma defesa como a georgiana e quando se joga atrás de um pack a recuar – deixar subir a defesa sem grande encurtamento de espaço dos dois primeiros da linha e aparecimento em velocidade dos restantes três-quartos na zona da fronteira do canal 2/3. Porque não se repetiu mais? Porque não se jogou mais por este forte sobre aquele fraco georgiano. Porque eles não deixaram? Duvido…

Parece idiota dizer-se que os avançados fizeram um grande jogo – pese embora o erro da gulodice final - quando a equipa perdeu contra outra do mesmo campeonato. Mas fizeram… até onde lhes foi possível numa diferença que é notória e que tem consequências técnicas e de experiência – Fernandes, jogando na III divisão francesa, tinha como adversário directo um pilar da I divisão também francesa; a nossa 1ª linha tinha na frente uma 1ª linha do campeonato principal de França. E não se entregaram.

A velha máxima do rugby de que “a superioridade nas formações ordenadas traduz-se em vantagens no resto do jogo” mostrou-se verdadeira e os avançados portugueses tiveram uma tarde de tremenda luta e de notável atitude combativa em todas as fases do jogo. Recuaram vezes sem conta e voltaram sempre à carga. Generosos. Exemplares. Foi por isso que, enquanto membro do júri do Super Lobo – prémio para o melhor jogador da selecção portuguesa – votei a favor do bloco de avançados. Sem individualidades. Assim: Bloco de Avançados!

Não existe justiça nos resultados desportivos. Se assim não fosse a Geórgia teria perdido e bem. Porquê? Porque uma equipa que não sabe traduzir em pontos a enorme superioridade conseguida nos avançados, não merece ganhar.

Ao ver jogar equipas dos nossos principais adversários – Geórgia, Rússia e Roménia – ficamos sempre com a sensação que somos melhores a interpretar o jogo do Rugby. O que tem algum fundo de verdade. Mas com um enorme débito: falta-nos CONSISTÊNCIA para traduzir em vitórias as eventuais vantagens. O que só é possível com outra competição interna.

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