sábado, 24 de setembro de 2011

O USO É CONTINUIDADE

Este Nova Zelândia-França colocou de novo a questão posse da bola versus uso da bola na ordem do dia. Quando os All-Blacks marcaram, aos 9 minutos, o primeiro ensaio, o domínio da França era total: 70% de posse de bola; 85% de domínio territorial. No final do jogo, numa diferença de 5 para três ensaios, os All-Blacks tinham 51% de posse de bola e dividiam equitativamente o domínio territorial. E ganharam com ponto de bónus e por uma diferença bem superior àquela que as pontuações do ranking admitem como normais.

O jogo de rugby não é um jogo apenas de medição de forças e quem tem a bola tem que a saber utilizar e tirar partido da vantagem que a situação lhe dá. E neste domínio os neozelandeses foram muito superiores aos franceses.

Depois há ainda outro domínio do jogo que marca a diferença: a capacidade colectiva de organizar o caos – assim como pegar fogo à casa e saber retirar os pertences mais importantes. No fundo é disto que se trata, desiquilibrada a defesa por concentrações atacantes, há que saber continuar o movimento, explorando a desorganização...organizando-se primeiro. Que se aprende pelo treino aplicado, claro.

Os franceses mostraram as dificuldades que os mais avisados comentadores vêem notando com a sua organização competitiva interna: jogo de poucos riscos, baseado em provas de força, mais território que uso de bola e com domínio do receio de perder sobre a vontade de ganhar. Para além de que, como refere o ex-internacional Alain Penaud, existe da parte dos treinadores franceses uma auto-suficiência prejudicial – olham para o Sul do alto da sua burra e não mostram compreender as transformações. No entanto, apesar de todas as debilidades que mostram – estão a jogar poucochinho e só os seus jornalistas parecem acreditar que o problema é do treinador… – têm a sorte do calendário e a oportunidade de aparecer num bom lugar final. Mas não servirão de grande exemplo para quem queira construir futuro.

Verdadeiramente, os franceses derem a mostra de absoluta incapacidade para uma equipa de pretensões – de que serve a super-máquina de treino de formações ordenadas, último grito da tecnologia? – e que se vê sempre como potencial vencedora. Para os adeptos servirá, para manterem a ilusão, a ideia que jogaram com uma equipa reserva, com um conjunto de médios de recurso, e que tacticamente a derrota era o melhor resultado – mas isto não retira as notórias deficiências de um jogo que raras vezes se mostra fluído nas ligações e acutilante na criação e exploração de desequilíbrios.

Do lado All-Black, mais uma lição da utilização do losango - esse ADN do rugby de movimento - que, começando no gesto técnico de contacto de dar as costas, é o instrumento de apoio e garante da continuidade do movimento que permite tornar eficaz o jogo de primeira fase e demonstrar – de novo – que o jogo de muitas fases é um mito de capacidade: muitas fases apenas demonstram incapacidade para criar desequilíbrios e resultam sempre de uma relação negativa de oposição ataque-defesa. Afinal não é o ataque que tem o domínio do tempo e do modo? O controlo do momento da decisão?

O Rugby é um jogo de ataque! e a maior parte das equipas que disputam este Mundial, pesem as maiores ou menores capacidades, têm mostrado gostar que assim seja.

(e por ser assim, com jogos interessantes que se querem ver, a difícil conjugação de horários neste lado de cá do mundo...)

Em Tempo: a vitória da Inglaterra sobre a Roménia por 67-3 (10 ensaios a zero) construiu-se com 52% de posse de bola e 50% de domínio territorial por parte dos ingleses. Saber jogar, saber utilizar a bola - e neste saber estão incluídas as componentes técnicas e tácticas que permitem criar desequilíbrios - faz a diferença

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